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Familiares de vítimas da Kiss deixam júri durante depoimento de ex-prefeito

Por Folha de São Paulo

08/12/2021 20h07 — em
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PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) - Familiares de vítimas do incêndio da Kiss deixaram o salão do júri em protesto ao depoimento de Cezar Schirmer (MDB), que era o prefeito da cidade de Santa Maria (RS) na época da tragédia. A saída coletiva aconteceu nesta quarta (8), quando o político falava sobre multas aplicadas à boate em seus primeiros anos de funcionamento.

Ao responder às perguntas do juiz Orlando Faccini Neto, Schirmer criticou o inquérito policial sobre o incêndio que deixou 242 mortos na cidade gaúcha e defendeu que a prefeitura não teve responsabilidade no caso. A investigação apontou responsabilidade do poder publico na tragédia, mas o caso acabou arquivado.

"Não fiz nada, nada, absolutamente nada, que pudesse comprometer a mim, e nenhum servidor da prefeitura agiu de tal forma que tenha contribuído para o que aconteceu naquela noite, que foi incêndio, apenas isso, com vítimas fatais, e eu lastimo muito tudo que ocorreu, profundamente. Até hoje, isso me entristece muito", declarou ele, que atualmente ocupa o cargo de secretário de Planejamento e Assuntos Estratégicos de Porto Alegre.

Do lado de fora do salão do júri, o presidente da AVTSM (Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria), Flávio Silva, que perdeu uma filha na tragédia, defendeu o inquérito policial.

"O prefeito deveria ter agido na hora, porque ele era o gestor, e não o fez. Agora ele vem aqui, pura e simplesmente, para tentar se promover politicamente", declarou a jornalistas. "Nos causam náuseas as palavras que saem da boca daquele gestor [o ex-prefeito] e a gente não é obrigado a aturar coisas que nos fazem mal".

Quatro réus respondem pelas acusações de homicídio e tentativa de homicídio simples com dolo eventual pela tragédia da Kiss — Elissandro Spohr e Mauro Hoffmann, sócios-proprietários da boate, e os integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos (vocalista) e Luciano Bonilha Leão (assistente de palco).

O julgamento, o mais longo do Judiciário gaúcho, foi desaforado de Santa Maria a Porto Alegre a pedido de defesas que questionaram se a cidade onde ocorreu a tragédia poderia ter júri um imparcial, já que boa parte da população foi afetada.

Schirmer disse que sempre evitou falar publicamente sobre sua experiência pessoal com a tragédia. Ele contou que foi acordado com uma ligação do seu subchefe contando que havia ocorrido um incêndio e, por volta das 4h15, a chefe de gabinete o informou que havia vítimas no local.

"Eu era prefeito de uma cidade traumatizada", contou ele. "Com tantas vítimas e sobreviventes que precisavam de amparo, uma cidade abalada, e estava no 27º dia do meu segundo mandato. Me auto impus a tarefa de, no primeiro momento, amparar os sobreviventes, no ponto de vista da saúde, e as pessoas que precisavam de cuidado psicossocial".

Schirmer, que compareceu ao julgamento como testemunha convocada por Spohr, disse que ouviu muitas vezes nos últimos oito anos que também deveria estar no banco dos réus —ele atribuiu isso a uma estratégia montada pela defesa dos acusados para diminuir as responsabilidades individuais na tragédia.

O ex-prefeito afirmou ainda que divergências políticas em Santa Maria podem ter influenciado os delegados do caso a incluir a prefeitura entre os responsáveis pela tragédia.

"Tenho várias leis e decretos que dizem que a competência sobre incêndio, prevenção, proteção, é do Corpo de Bombeiros. Não estou acusando o Corpo de Bombeiros, estou apenas dizendo que a responsabilidade por essas questões não era da prefeitura".

Após o ex-prefeito, foi a vez do promotor Ricardo Lozza depor. Integrante do Ministério Público do Rio Grande do Sul, ele foi o responsável por negociar um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) por poluição sonora com os responsáveis pela Kiss.

A defesa dos réus afirma que no projeto aprovado nesse acordo estava prevista a instalação de espuma na boate para ajudar a resolver a questão do som. Lozza, porém, negou que isso tenha acontecido.

Neste projeto, não existe, quero deixar isso bem claro, a palavra espuma", declarou o promotor. "A espuma só serve para conforto acústico. Isolamento se faz com massa. Por isso, não dá para dizer que a espuma tem relação com o projeto que vem do TAC", completou.

A questão é importante porque a denúncia do Ministério Público pela tragédia diz que a espuma usada como revestimento na boate era altamente inflamável, tóxica, sem tratamento antichamas e que foi a geradora de gases que ensejaram asfixia. O documento cita entre as causas das mortes asfixia por inalação de gases tóxicos (monóxido de carbono e cianeto).


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