Defensoria revela que Justiça negou prisão domiciliar à indígena estuprada em delegacia no Amazonas
Manaus/AM - A Defensoria Pública do Amazonas (DPE-AM) revelou, nesta quarta-feira (23), que teve os pedidos de prisão domiciliar e redução de pena à indígena Kokama, de 29 anos, negados pela Justiça do Amazonas. A mulher denunciou que foi estuprada por 9 meses por policiais militares e um guarda municipal dentro da delegacia do município de Santo Antônio do Içá, no interior do Amazonas.
De acordo com a DPE, a instituição realizou 65 atendimentos à indígena, em Manaus e que o órgão tomou conhecimento do caso em 28 de agosto de 2023, um dia após a transferência da vítima para a Unidade Prisional Feminina de Manaus. Mas a mulher foi presa em 11 de novembro de 2022, por sentença condenatória a 16 anos e 7 meses de reclusão por crime hediondo, ao buscar a delegacia para fazer uma denúncia de violência doméstica. Na ocasião, não houve audiência de custódia, nem comunicação à Defensoria, em violação a garantias fundamentais.
Mesmo sem ter sido formalmente intimada da prisão, o defensor público Murilo Breda, coordenador do Polo do Alto Solimões, que atende o município de Santo Antônio do Içá, reforça que a instituição agiu. “A atuação da Defensoria sempre se pautou por acompanhamento constante e sistemático dos processos envolvendo pessoas custodiadas nas sete cidades da região. Assim que soubemos que havia uma mulher presa com um recém-nascido, protocolamos pedido de prisão domiciliar em dezembro de 2022 e reiteramos esse pedido várias vezes, sem resposta até hoje”.
A indígena inicialmente não denunciou os abusos em Santo Antônio do Içá por medo de represálias. Seus filhos e sua mãe ainda residiam no município, o que aumentava o temor por parte dos agentes denunciados.
Ainda conforme informações divulgadas pela Defensoria, já em Manaus, com a transferência da mulher realizada em agosto de 2023, o órgão continuou agindo. De acordo com o coordenador do Núcleo de Atendimento Prisional (NAP), Theo Costa, o atendimento jurídico inicial estava previsto para a semana seguinte, mas foi antecipado após outras internas acionarem a Defensoria diante do estado de extrema debilidade emocional da custodiada, que chorava frequentemente e se recusava a se alimentar. “Diante desse contexto de extrema vulnerabilidade, optamos por conduzir o caso com máxima cautela, zelando pela segurança da vítima e de seus familiares, sem deixar de adotar todas as medidas legais cabíveis”, destaca o defensor público.
Durante o atendimento emergencial, a mulher narrou os abusos que sofreu no interior da delegacia. A gravidade do relato motivou a atuação imediata da Defensoria, que solicitou o encaminhamento da vítima à Delegacia da Mulher. O exame de corpo de delito, realizado no mesmo dia, confirmou a conjunção carnal e a presença de sinais de violência.
Desde então, a Defensoria adotou uma série de medidas para proteger a vítima e garantir sua dignidade, como realização de escuta qualificada com apoio de equipe multidisciplinar e participação de defensor especializado em Direitos Humanos; aplicação de protocolo humanizado para a coleta de depoimento, com perguntas pré-elaboradas e gravação oficial para evitar reiterações traumáticas; encaminhamento a acompanhamento psicológico e médico contínuo e, mais uma vez, pedido à Vara de Execuções Penais para cumprimento de pena em regime domiciliar, bem como a redução do tempo de prisão, com a contagem em dobro do período de cumprimento de pena, como medida compensatória causada pela execução antijurídica da pena, nos termos da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Todos negados.
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