Juiz, delegado, promotor, policial e a segurança pessoal vitalícia do STF
A decisão do Supremo Tribunal Federal, tomada neste ano de 2025, de conceder a seus ministros aposentados o direito à segurança pessoal vitalícia, trouxe à tona um debate necessário e inadiável: por que essa proteção permanente não é estendida, com igual prioridade, aos juízes, delegados, promotores e policiais que enfrentam diariamente o crime organizado no Brasil?
A resolução do STF parte de uma premissa correta (sei que os motivos não foram o crime organizado, mas a rejeição e revolta da população a uma corte aparelhada politicamente) no qual determinadas funções públicas produzem riscos que não se encerram com a aposentadoria. Ministros da Corte tomam decisões que afetam interesses poderosos e, por isso, permanecem expostos a ameaças por tempo indeterminado. A lógica é institucional, não personalista. Entretanto, ao reconhecer essa realidade apenas para si, o STF deixa evidente que faltou visão de sistema, faltou enxergar o Estado em sua totalidade, e principalmente, faltou olhar para aqueles que são a linha de frente no combate às facções criminosas é que olham o rosto do bandido faccionado diariamente.
Se a tese é verdadeira para ministros, ela é ainda mais verdadeira para quem está nas ruas, nas investigações, nas audiências criminais, na persecução penal cotidiana. Delegados e policiais desarticulam quadrilhas, apreendem arsenais e drogas, causam prejuízos milionários às organizações criminosas (e portanto lucro ao país). Promotores sustentam denúncias que atingem diretamente as estruturas internas das facções. Juízes criminais decretam prisões, bloqueiam bens, quebram sigilos, sentenciam líderes de grupos violentos. Todos acumulam inimigos que não se aposentam.
A pergunta inevitável é: quem combate o crime organizado vive em risco pelo resto da vida, então, por que o Estado não reconhece isso com igual urgência? Ao proteger apenas a cúpula, o STF reforça a percepção de que há cidadãos de primeira e de segunda classe dentro do próprio Estado.
A medida do STF deveria ter sido o primeiro passo, e não o ponto final. Um Supremo verdadeiramente comprometido com a integridade do sistema de Justiça teria acompanhado a própria decisão com uma recomendação institucional, uma provocação legislativa, ou ao menos um reconhecimento formal de que a segurança vitalícia deve ser política pública nacional para todos que enfrentam o crime organizado, mediante análise técnica de risco.
Trata-se de uma agenda republicana, não corporativa.
Não existe crescimento econômico sustentável onde o crime organizado se fortalece, intimida ou vinga-se de agentes públicos.
E não existe paz social onde o próprio Estado não protege aqueles que o protegem.
Uma política nacional de segurança vitalícia para servidores que atuam no front do combate a facções é, portanto, medida de fortalecimento do Estado de Direito, de estímulo à eficiência da persecução penal. Ambientes seguros atraem empresas, reduzem custos logísticos, ampliam geração de emprego e permitem que a economia floresça. O contrário também é verdadeiro: onde prevalece o medo, o empreendedor recua, o Estado encolhe e o crime avança.
Hissa Abrahão é economista, professor universitário, mestre, doutorando, ex-deputado federal e vice-prefeito de Manaus.
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