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As duas faces do ministro Moraes


Por Raimundo de Holanda

02/09/2025 18h01 — em
Bastidores da Política


  • Quando Alexandre de Moraes leva para dentro de um julgamento criminal — que decide sobre a liberdade de pessoas — um discurso marcadamente político, inocula na população a ideia de que já existe um compromisso prévio com determinado resultado.
  • O que deveria ser um julgamento baseado somente em provas e leis se revela parte de uma cruzada maior.
  • Esse tipo de retórica, em vez de reforçar, enfraquece a imagem de neutralidade que o STF tanto procura manter.

Na abertura do julgamento da Ação Penal 2668, o ministro Alexandre de Moraes disse o que todos esperavam ouvir: que o processo vai seguir as regras do devido processo legal, com direito de defesa garantido, e que só haverá condenação se houver prova suficiente. Até aí, nada além do que se espera de um juiz.

O problema foi o passo seguinte. O relator afirmou que o Supremo será “absolutamente inflexível na defesa da soberania nacional, da democracia e do Estado de Direito”. A frase soa bem, mas abre espaço para dúvidas: seria papel do STF colocar-se como guardião direto da soberania?

A Constituição distribui essa função entre várias instituições. O Executivo conduz a defesa do país, o Congresso aprova medidas e tratados, e as Forças Armadas têm a missão constitucional de proteger a Pátria (art. 142). Ao STF cabe outra função: ser guardião da Constituição (art. 102), julgando de forma técnica e imparcial.

Quando um ministro traz para dentro de um julgamento criminal — que decide sobre a liberdade de pessoas — esse discurso político, corre-se o risco de parecer que já existe um compromisso prévio com determinado resultado. O que deveria ser uma decisão baseada só em provas e leis pode soar como parte de uma cruzada maior.

Esse tipo de retórica, em vez de reforçar, enfraquece a imagem de neutralidade que o STF tanto procura manter. A Corte não precisa prometer “inflexibilidade” para ser forte. Sua autoridade vem da sobriedade ao julgar, da clareza nas decisões e do respeito às regras processuais.

No fim, a defesa da soberania é missão de muitos. Mas a defesa do processo justo — imparcial, transparente e equilibrado — é missão exclusiva do Supremo. É aí que está a sua verdadeira força.

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ASSUNTOS: Alexandre de Moraes, Bolsonaro, julgamento do golpe

Raimundo de Holanda é jornalista de Manaus. Passou pelo "O Jornal", "Jornal do Commercio", "A Notícia", "O Estado do Amazonas" e outros veículos de comunicação do Amazonas. Foi correspondente substituto do "Jornal do Brasil" em meados dos anos 80. Tem formação superior em Gestão Pública. Atualmente escreve a coluna Bastidores no Portal que leva seu nome.