OAB-AM cria filtro para o 5° constitucional e empobrece disputa
- A medida adotada pela OAB pode contribuir para um efeito contrário ao pretendido: ao estabelecer 10 anos de exercício ininterrupto da advocacia para concorrer a vaga de desembargador, gera exclusão e privilegia uma elite encastelada por décadas em torno do comando da instituição. O lema é: primeiro os meus. Sempre os meus...
- O resultado prático pode ser o enfraquecimento do quinto constitucional como instrumento de abertura e pluralização dos tribunais, convertendo-o em mais um filtro burocrático.
- A medida, embora tomada pela OAB nacional, tem um propósito definido: excluir da disputa um postulante do Amazonas, que aparece em pesquisa como amplamente favorito entre os advogados.
A alteração do Provimento 102/2004 da OAB, definida nesta terça-feira, fixou como requisito para as listas sêxtuplas dez anos ininterruptos de exercício da advocacia, com pelo menos cinco atos privativos por ano, contados a partir da publicação do edital. Embora apresentada como medida de uniformização, a regra pode gerar efeitos que merecem reflexão.
Em primeiro lugar, a exigência deixa de fora profissionais que, ao longo da carreira, alternaram períodos de advocacia com outras funções relevantes ao mundo jurídico. Quem se afastou para exercer cargos públicos, atuar no magistério, dedicar-se à pesquisa ou até mesmo ocupar posições de liderança institucional, agora se vê automaticamente excluído, ainda que disponha de capacidade técnica reconhecida.
Outro aspecto é a burocratização do processo: a exigência de cinco atos formais por ano pode transformar a análise em mera contagem cartorial, reduzindo a avaliação da advocacia a números, em detrimento da qualidade efetiva da atuação.
Advogados que atuam em consultoria, sem tantos registros formais em juízo, podem não atingir a métrica agora exigida, apesar de sua contribuição ser substancial.
Além disso, a fixação na atividade “contínua e ininterrupta” cria uma visão estreita do que significa experiência profissional.
O acúmulo de diferentes vivências jurídicas — inclusive fora do foro — sempre foi um dos elementos que enriqueciam o quinto constitucional, trazendo para os tribunais olhares complementares aos da magistratura e do Ministério Público.
A nova regra, ao contrário, tende a homogeneizar perfis e reduzir a diversidade.
Por fim, a medida pode contribuir para um efeito contrário ao pretendido: ao buscar clareza e objetividade, gera uma exclusão rígida que empobrece o leque de candidatos. O resultado prático pode ser o enfraquecimento do quinto constitucional como instrumento de abertura e pluralização dos tribunais, convertendo-o em mais um filtro burocrático.
ASSUNTOS: OAB, QUINTO CONSTITUCIONAL
Raimundo de Holanda é jornalista de Manaus. Passou pelo "O Jornal", "Jornal do Commercio", "A Notícia", "O Estado do Amazonas" e outros veículos de comunicação do Amazonas. Foi correspondente substituto do "Jornal do Brasil" em meados dos anos 80. Tem formação superior em Gestão Pública. Atualmente escreve a coluna Bastidores no Portal que leva seu nome.