Governo põe lei anti-Magnitsky em banho-maria em meio a negociações entre Lula e Trump
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A possível reunião entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Donald Trump levou o governo brasileiro adotar cautela na elaboração de um projeto de lei destinado a limitar os impactos econômicos de sanções americanas.
A gestão Lula discute com ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e a cúpula do Congresso a apresentação de uma proposta com o objetivo de proteger empresas e instituições financeiras que possam ser alvo de punições dos EUA --como a Lei Magnitsky-- ou que mantenham relações comerciais com entidades ou indivíduos atingidos por essas medidas.
As discussões preveem o impedimento da aplicação automática de punições estrangeiras a empresas brasileiras. A proposta busca conferir robustez institucional, por meio de uma lei aprovada pelo Congresso, ao entendimento defendido pelo ministro do STF Flávio Dino --que, em decisão de agosto, afirmou que ordens judiciais e executivas de governos estrangeiros não têm validade no Brasil sem homologação do Supremo.
Com o apoio de uma ala da Corte, a minuta do projeto prevê a criação de um conselho composto por representantes dos Três Poderes e da sociedade civil, responsável por deliberar sobre a aplicação de sanções estrangeiras em território nacional. Pela proposta em debate, o colegiado seria formado por integrantes da Procuradoria-Geral da República, da Advocacia-Geral da União, além de ministros, parlamentares e representantes da sociedade civil.
Segundo autoridades envolvidas nas discussões, o colegiado poderia autorizar em casos excepcionais o cumprimento no Brasil de exigências do governo americano, caso se comprove o risco de prejuízos financeiros significativos para a empresa brasileira que se recusar a adotar as sanções.
A minuta já foi apresentada a ministros do STF, lideranças do Congresso e representantes do setor financeiro. O objetivo é garantir que a iniciativa conte com o respaldo não apenas do Executivo, mas também do Legislativo e do Judiciário.
Para as instituições privadas brasileiras, seria uma forma de justificar ao governo americano o eventual descumprimento de sanções não autorizadas pelo conselho que seria criado.
Fontes próximas às tratativas afirmam que o texto em discussão se inspira em legislações existentes no Canadá e na União Europeia.
No caso europeu, um estatuto especial protege operadores econômicos contra leis extraterritoriais. Criada nos anos 1990, a norma foi pensada para empresas que mantinham negócios com Irã e Cuba, ambos sob sanções americanas.
Embora o estatuto proíba o cumprimento automático dessas medidas, ele também prevê a possibilidade de empresas solicitarem autorizações à Comissão Europeia para se adequar a eventuais exigências dos EUA.
Apesar de representar um arcabouço jurídico mais sólido do que a decisão judicial de Dino, fontes com conhecimento das discussões ponderam que é difícil garantir a efetividade de uma norma do tipo.
Isso porque o governo ou a Justiça americana podem, ainda assim, impor punições como bloqueio de acesso ao mercado dos EUA a empresas ou países que contornem sanções impostas por Washington.
Apesar das conversas em curso no STF, no Palácio do Planalto e no Congresso, a avaliação dentro do governo é que o momento não é propício para o avanço do projeto.
O envio de uma proposta dessa natureza ao Congresso poucos dias após Trump elogiar a "excelente química" com Lula poderia ser interpretado como um gesto hostil, reabrindo tensões diplomáticas entre os dois países.
Um ministro admite que a possibilidade de um encontro entre os dois líderes freou o andamento do projeto.
Mesmo assim, integrantes do governo Lula ainda nutrem a expectativa de que o petista possa negociar com Trump a revogação de sanções impostas pelos EUA. Entre elas, a Lei Magnitsky aplicada contra o ministro do STF Alexandre de Moraes.
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