Design japonês repensa o consumo em itens como telhado feito com arroz
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Capacetes feitos de conchas, vestidos de folha de bananeira e nylon de milho. Todos esses objetos foram desenvolvidos a partir da expressão japonesa "mottainai" uma reprimenda a quem desperdiça. Mas, além de não descartar materiais, as criações precisam obedecer a um princípio caro aos designers do país insular: devem ser esteticamente agradáveis.
Os objetos estão em "Princípios Japoneses: Design e Recursos", em cartaz na Japan House, em São Paulo. A mostra faz coro com "A Ecologia de Monet", no Masp, e outras exposições no Farol Santander, no Museu Brasileiro da Escultura e Ecologia (MuBE) e no Museu do Ipiranga, que abordam a relação entre o humano e a natureza por meio da arte, sem recorrer ao tópico que costuma ser mais óbvio nesses casos o da destruição do ambiente pela ação humana.
No caso de "Princípios Japoneses", o alarme relativo a um modo de vida sustentado pelo consumismo é traduzido em invenções que tentam resolver a equação entre avanço tecnológico e preservação dos recursos naturais. Para Natasha Berzaghi Geenen, curadora da mostra e diretora da Japan House, há ainda a obsessão por provar que as tradições podem se manter atuais.
Ikuya Sagara, artesão da cidade de Kobe, por exemplo, utiliza em seu trabalho o arroz, elemento mais básico da culinária japonesa. Por meio de uma técnica secular conhecida como "kayabuki", ele extrai a casca dos grãos para construir telhados.
Já o designer Kosuke Araki mistura o grão à serragem para fazer banquetas. Ele também cria pratos e potes a partir de restos de alimentos misturados ao "urushi", espécie de laca. E não são objetos rústicos, mas elaborados, sóbrios e minimalistas.
"A estética é considerada um elemento funcional. O que é desnecessário é eliminado, deixando só o fundamental", diz Geenen, sobre a característica que fez a fama do design japonês pelo mundo, que hoje ganha uma nova geração de admiradores no TikTok. No ramo da papelaria, por exemplo, há milhares de vídeos dedicados a divulgar produtos novos, de carimbos a papéis texturizados.
O sucesso está relacionado às preocupações ambientais das novas gerações, mais alarmadas em relação à crise climática. "Os produtos japoneses têm essa simplicidade aparente, o que faz com que sejam atraentes, e há qualidade, aliada à lógica de sustentabilidade. São materiais que duram mais e não precisam ser substituídos com tanta frequência", diz Geenen.
Na contramão do minimalismo estão cores exuberantes, traçadas em pinceladas fartas de tinta. São as telas da artista Heloisa Hariadne, no Farol Santander.
A artista parece dissolver seu entorno em camadas de cores, de onde surgem flores, plantas carnívoras, pétalas, raízes e corpos humanos, que surgem em meio a esse caos cromático. Nas obras de Hariadne, reunidas na exposição "A Cor do Ar", as tensões existentes na relação entre humanos e natureza são transmitidas por meio de sensações.
Apostar nas sensações que a arte pode proporcionar para impactar pessoas em relação à emergência climática tem sido a estratégia do Mube nas últimas três décadas. O museu, que comemora 30 anos e abre uma mostra individual da artista Laura Vinci, busca equilibrar o discurso político com o simbólico.
Em uma de suas mostras, por exemplo, incentivou uma canoa-triciclo, "Rio-Tupi", a passear pela avenida Europa, onde antes havia um rio e hoje se encontra a sede do museu, desenhada pelo arquiteto Paulo Mendes da Rocha.
"As pessoas, especialmente as mais velhas, olhavam e lembravam-se de quando era possível nadar nos rios de São Paulo", conta Flavia Velloso, diretora do Mube. A instituição também já inundou seu próprio pavilhão em "Mupotyra: Arqueologia Amazônica", para imergir o público na emergência ambiental.
O Mube é ainda um dos poucos museus paulistanos que mantêm um espaço verde ao ar livre, como o Museu do Ipiranga. Enquanto o jardim francês do Parque da Independência, projetado no início do século 20, funciona como um espaço de convívio público complementar à visitação museológica os canteiros geométricos e o terreno rebaixado parecem apontar para o edifício secular, o jardim modernista do Mube é usado para cativar o olhar também de quem passa desavisado pela sua fachada.
Uma pequena caatinga com galhos caídos da Serra da Capivara já foi recriada ali, onde também foi exibida uma obra monumental de Fernando Limberger, formada por troncos incendiados durante uma queimada no Parque do Juqueri. Velloso conta que, para algumas pessoas, parecia que o próprio museu tinha pegado fogo.
Por fim, o espaço do jardim também será explorado, no Sesc Vila Mariana, pelo Museu de Arte Moderna, cuja sede no parque Ibirapuera está fechada para reformas desde agosto do ano passado. Recriada no espaço na zona sul da cidade, a exposição, em cartaz até agosto, repensa o tradicional Jardim de Esculturas do MAM com peças de nomes como Alfredo Ceschiatti, Amilcar de Castro e Emanoel Araújo, bem como outros trabalhos que integram o acervo da instituição e que evocam temáticas como natureza e a relação com a cidade.
PRINCÍPIOS JAPONESES: DESIGN E RECURSOS
- Quando Até 8 de junho. Ter. a sex., das 10h às 18h; sáb., dom. e feriados, das 10h às 19h
- Onde Japan House - av. Paulista, 52, São Paulo
- Preço Grátis
HELOISA HARIADNE - A COR DO AR
- Quando Até 15 de junho. Ter. a dom., das 9h às 20h
- Onde Farol Santander - r. João Brícola, 24, São Paulo
- Preço R$ 45
JARDIM DO MAM NO SESC
- Quando Até 31 de agosto. Ter. a sex., das 10h às 21h30; sáb., das 10h às 20h30; dom. e feriado, das 10h às 18h
- Onde Sesc Vila Mariana - r. Pelotas, 141, São Paulo
- Preço Grátis

ASSUNTOS: Arte e Cultura