Divisão sobre tempo de mandato de senador deve adiar PEC que acaba com reeleição
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Uma emenda incluída de última hora para reduzir o mandato de senadores provocou mal-estar no Senado e deve retardar a votação em plenário da PEC (proposta de emenda à Constituição) que acaba com a reeleição para presidente, governadores e prefeitos.
A PEC foi aprovada pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado na semana passada em um amplo acordo em torno do fim da reeleição, mas a mudança no mandato de senadores de dez anos para cinco provocou enorme reação nos bastidores.
O parecer apresentado pelo relator, Marcelo Castro (MDB-PI), aumentava o mandato dos senadores dos atuais oito anos para dez. A redução foi incluída pela oposição --que estava em maioria na hora-- por sugestão do líder do PL, Carlos Portinho (RJ), e do senador Eduardo Girão (Novo-CE).
A diminuição motivou um bate-boca descrito como tenso na última reunião de líderes, na quinta-feira (22), entre Portinho, Girão e o líder do MDB, Eduardo Braga (AM).
Pessoas que estavam no encontro afirmam que Braga criticou duramente os colegas pela forma com que a mudança foi patrocinada durante a CCJ, sem qualquer discussão prévia.
Segundo relatos, Braga disse que houve um ataque aos senadores, que tiveram seus direitos reduzidos, enquanto todos os outros cargos ganharam mandatos maiores --de quatro para cinco anos, após o período de transição.
Parlamentares que testemunharam o desentendimento dizem que Portinho cobrou respeito e disse que não houve pegadinha. Girão, de acordo com pessoas que estavam presentes, respondeu que o Senado está apequenado por outros motivos.
Senadores que criticam a mudança veem oportunismo da oposição em torno do tema. Reservadamente, cardeais do Senado afirmam que a emenda foi incluída na PEC de forma eleitoreira uma vez que congressistas serão forçados a se expor em defesa de algo que já existe, um mandato maior.
Na avaliação de um líder que preferiu não se identificar, a medida expõe o Senado porque a população pode entender como privilégio a existência de mandato de dez anos ou mesmo de oito anos, como hoje.
Durante a discussão, Portinho afirmou ser preferível um mandato de cinco anos em vez de dez, em prol da alternância de poder. O senador disse que terá um mandato de cerca de seis anos, até o final da legislatura, e que percebeu que cinco anos é o suficiente.
"Eu vou jogar com o argumento que muitos podem estar imaginando, olhando para o seu próprio umbigo: 'Ah, mas vai ser muito bom para mim, daqui... Nas próximas eleições, eu vou ter dez anos.' E se você perder? Então, olhe para o seu umbigo também", disse Portinho.
Ele assumiu uma das três vagas do Rio de Janeiro no Senado após a morte do senador Arolde de Oliveira (PSD-RJ), em outubro de 2020, em decorrência da Covid-19. Portinho era o primeiro titular de Arolde.
A discussão acabou se afunilando em torno de um mandato de cinco ou dez anos para o Senado porque, além de proibir a eleição para cargos do Executivo, a PEC unifica as eleições gerais e municipais. Hoje, há eleição a cada dois anos, ora para presidente, governadores, senadores, deputados federais e estaduais, ora para prefeitos e vereadores.
A medida propõe uma transição gradual e complexa até 2039, quando todos os mandatos passariam a ter duração de cinco anos. O caminho até essa padronização, no entanto, inclui uma série de mandatos com durações variáveis (de quatro, cinco, seis, oito e nove anos), conforme os cargos e os anos de eleição.
Antes da votação na CCJ, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), avisou a colegas que incluiria a PEC na pauta do plenário nesta semana. Com a divisão, parlamentares afirmam que o presidente deve esperar a discussão esfriar.
Nos bastidores, senadores dão como certa a volta do mandato de dez anos, como sugeriu Castro inicialmente. O mandato maior pode ser reinserido na PEC durante a votação no plenário inclusive por iniciativa de Alcolumbre, de acordo com parlamentares a par do assunto.
O texto aprovado na comissão precisa ser votado no plenário do Senado em dois turnos com ao menos 41 dos 81 votos. Se passar, a PEC precisa tramitar na Câmara pela CCJ, comissão especial e, depois, plenário. É preciso do voto de ao menos 308 dos 513 deputados.
A possibilidade de reeleição para ocupantes de cargos do Executivo foi aprovada pelo Congresso a partir de uma emenda à Constituição em 1997.
A legislação entrou em vigor imediatamente, aplicando-se já ao pleito subsequente. O principal beneficiário foi o presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), eleito anteriormente à inclusão dessa possibilidade na Constituição.
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