Liberdade de informação que não convém
Estado Democrático de Direito e Liberdade de informação são irmãos siameses, um não sobreviverá sem o outro. O espaço da imprensa, leia-se, veículos de informação, incluindo-se os portais de notícias por meio da rede de internet se constituem no sustentáculo da própria democracia.
A liberdade de informação faz chegar a todos o conhecimento de atos e fatos de relevante interesse público, conferindo à sociedade uma maior dinamicidade no poder que todos têm de fiscalizar, inclusive, atos da gestão pública, e que, envolve uma gama de direitos fundamentais que são assegurados pela Carta Política.
Ocorre que essa liberdade de informação que convém ao interesse público, sofre, ainda hoje, com o inconformismo daqueles que não compreendem ou não querem compreender que o direito à informação é um direito fundamental da sociedade.
Possamos enumerar, inclusive, autoridades que atacam a imprensa e insultam seus profissionais, aqui, temos como melhor exemplo o comportamento hostil do Presidente Jair Bolsonaro que não poupa impropérios em desfavor da classe dos jornalistas, como se esses profissionais fossem os responsáveis por seu desvario pessoal e sua incompetência no comando de combate a pandemia da covid 19.
Importa neste dia nacional da liberdade de informação relembrar que na Ação Declaratória de Preceito Fundamental de nº 130 o STF reconheceu que a liberdade de imprensa corresponde a uma categoria de direito proibitiva de qualquer censura prévia. Isso não entende o presidente Bolsonaro, que, nos seus arroubos chega a ser ”imorrível”,”imbrochável” e”incomível”, profere constantes ataques à imprensa, querendo e propalando sobre o fechamento de jornais, em ataques que correspondem ao inconformismo de um presidente que não admite ser criticado, que não respeita o direito fundamental de opinião nos seus arremedos de tirano.
Mas, não é somente o presidente da República que não tenha a cultura do respeito com o direito à opinião, à informação, à crítica, à manifestação do pensamento. No mesmo plano há outras autoridades, que têm esse comportamento avesso ao direito de informação, de crítica e opinião, inclusive uma categoria de funcionários públicos que deveriam zelar pelos direitos constitucionais, os juízes, que acolhem ações e condenam portais de notícias por agressão a imagem, a intimidade, a honra, encontrando danos de natureza cível e até penais, obrigando alguns veículos de comunicação à indenizações sem nenhum cuidado com a proporcionalidade e a razoabilidade entre o que consideram danoso e a punição, que tem a natureza de censura, constitucionalmente proibida. A situação fica ainda mais grave contra o regime democrática quando as decisões judiciais estão associadas à ordem de retirada de publicação das matérias, insistimos, em ato de censura ao direito de informar.
No julgamento da ADPF 130, o STF proibiu enfaticamente a censura de publicações jornalísticas, bem como tornou excepcional qualquer tipo de intervenção estatal na divulgação de notícias e opiniões, mas os juízes de categoria inferior não obedecem ao que o próprio Supremo Tribunal Federal determinou.
Recentemente, a Ministra Carmen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, declarou procedente Reclamação realizada pelo jornal o Estado de São Paulo, porque o jornal, vítima de abuso de poder pelo Judiciário, teve que retirar matéria jornalística publicada em seu portal de notícias referentes a fatos de notório interesse público, pois divulgou que houve uma nomeação irregular para a subprefeitura de Penha, município de São Paulo, com evidência de nepotismo. A Ministra entendeu que o jornalismo não pode ser inibido, mormente o jornalismo político e investigativo, e, a tentativa dessa inibição constitui ataque a democracia e “expõe a risco a garantia constitucional da liberdade de informar e de ser informado e que não se pode submeter a imprensa à censura de qualquer natureza.
Daí se possa concluir que as decisões judiciais que pecam pelo excesso contra o direito de liberdade de informação mereçam ser reconhecidas como reflexo de uso imoderado do poder pelos magistrados. A interpretação advinda das decisões do judiciário contra a imprensa agridem o direito de opinião, da crítica, da liberdade de informação, especialmente quando se determina a retirada de publicações jornalísticas, sem previsão legal, pois não há em nosso país legislação lateral que tipifique a retirada de publicações, exceto a legislação eleitoral, elaborada apenas para ser aplicada durante o processo eleitoral, dentro dos padrões de legalidade que são exigidos.
A inovação judicial, por meio de decisões que determinarem a retirada de matéria jornalística, implica não somente em julgamento contrário a lei e a ordem constitucional, mas em abuso que merece ser, no caso concreto, levado ao conhecimento do poder disciplinar dos magistrados.
A liberdade de informação não convém, pois, aos tiranos, aos que compactuam com o abuso do poder e aos que insistem em não entender que a Constituição Federal estruturou, pelo poder que emana do povo, o Estado Democrático de Direito, com o pluralismo político, democrático, e outros valores insculpidos em nossa carta política.
*Aline Alencar é advogada
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