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A dor de dona Ana, mãe de Renato, o filho apontado como 'bandido'


Por Raimundo de Holanda

17/07/2022 19h44 — em
Bastidores da Política



A noite de sexta-feira estava quente. O pequeno ventilador no quarto de madeira empurrava o ar fazendo um barulho sinistro. Dona Ana olhou o relógio: 4 da manhã. Renato, o filho de 19 anos, não havia voltado para casa. Ela olhou o celular. Um vídeo apareceu em um grupo de WhatsApp. Uma cena de sangue - uma multidão em torno de um homem. Era Renato.  Dona Ana havia imaginado essas imagens, repetidas vezes, durante as ausências do filho nos finais de semana. Mas sempre ele voltava. Agora estava ali, na tela do seu celular, a consumação de seu maior pesadelo.

Mas não queria acreditar. O celular tocou. Era uma amiga confirmando o que ela ainda não queria admitir. Desesperada,  pegou a bolsa e saiu em busca do que ainda restava de Renato, o corpo. Saiu arrastando sua imensa dor, enquanto seus olhos molhavam o rosto marcado pelo tempo.

Onde procurar Renato?  O corpo certamente não estava mais no local indicado pela amiga que também vira o video. Pensou no IML e retornou para casa, contando moedas de um cofrinho para pagar o Uber. Chegou as 8:30 da manhã no Instituto Médico Legal e encontrou o filho na pedra. Era um último encontro, uma passagem tão inesperada  que ela explodiu em soluços.

O que dona Ana  não sabia e que doeu mais, é que a morte de Renato fora atribuída ao envolvimento com uma facção criminosa. Foi a versão dada pela Polícia.

A dor de dona Ana vai ser sempre essa imensa dor - de muitas mães -  de não poder comprovar  que a verdade foi escondida, total ou parcialmente.  Que a versão da polícia é precária e nunca será checada.   

Renato foi enterrado neste domingo pela manhã. Apenas dona Ana e os dois irmãos compareceram. No início da noite, dona Ana ainda estava no cemitério, sentada em torno da sepultura do filho, chorando…

 

OBS: Deu-se nomes diferentes para  mãe e  filho, por razões de segurança da mãe.

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Raimundo de Holanda é jornalista de Manaus. Passou pelo "O Jornal", "Jornal do Commercio", "A Notícia", "O Estado do Amazonas" e outros veículos de comunicação do Amazonas. Foi correspondente substituto do "Jornal do Brasil" em meados dos anos 80. Tem formação superior em Gestão Pública. Atualmente escreve a coluna Bastidores no Portal que leva seu nome.