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Sem estímulo à docência


Por Flávio Lauria

24/05/2024 9h32 — em
Espaço Crítico



Fui convidado para fazer parte de uma banca dentro de uma Universidade para avaliar trabalhos de formandos em Administração. Já tive nome de turma, já fui paraninfo de turma, já tive meu nome como nome de turma de formandos, já dei aula da saudade, mas, a cada vez fico preocupado e perplexo, com a diminuição da capacidade de profissionais, saindo das Universidades, e fico a perguntar, será pela qualificação dos professores? 

Em geral, as nações procuram tratar bem dos seus professores universitários. Tendo uma grande responsabilidade na formação das suas lideranças e na qualificação avançada dos profissionais que lhe são essenciais, os professores universitários são em regra respeitados pelo que fazem e têm reconhecidas as suas qualificações diferenciadas. No Brasil, nos anos 70, este entendimento se expressou pelo esforço de profissionalização do professor universitário nas universidades públicas, com a instituição do “regime de tempo integral e dedicação exclusiva”, que, com uma remuneração condizente, estimulou docentes diletantes e qualificados a fazerem da vida universitária a sua vida profissional.

Esta medida, simultânea a um vigoroso programa governamental de formação avançada de jovens brasileiros nos programas de pós-graduação das melhores universidades do mundo, levou à construção de uma invejável rede de universidades públicas de boa qualidade, espalhadas por quase todo o país. Muitas destas são hoje reconhecidas mundialmente como universidades de alto nível, e entre elas, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a UFRGS, que hoje vive um flagelo em suas dependências por causa das inundações. 

Tragicamente para o país, o entendimento de que o professor universitário brasileiro deveria ser um profissional com remuneração condizente ao seu papel social e à sua qualificação subsistiu apenas uma década. Desde então, por mais de 30 anos, os docentes das universidades públicas têm sido forçados a escapar da penúria e da evasão através da via há muito conhecida dos demais trabalhadores, a via do confronto com o patrão. Não restou ao docente universitário brasileiro profissionalizado outro caminho para a sobrevivência, senão buscar a organização de sindicatos laborais e empregar os seus métodos. 

A história dos resultados alcançados pode ser lida no contracheque de cada professor, a cujo salário, que com o tempo ficou risível, foram acrescidas, sucessivamente, remunerações também jocosamente denominadas de “gratificações”, cada um resultado de um confronto grevista. Esta é a origem da GAE, gratificação por atividade executiva, e da GED, gratificação de estímulo à docência. No orçamento da União, o professor da universidade pública se transformou em um executivo administrativo eventual, que recebe um dinheiro extra para dar aulas. 

Causa perplexidade e constrangimento ter de se admitir, mas a sustentação da remuneração dos professores por greves que fazem sofrer a todos tem salvado a universidade pública brasileira do seu fim, como universidade pautada por padrões de excelência educacional e científica, capazes de qualificar o diálogo do país com o mundo. As atuais crises da previdência e da universidade pública revelam que a nação brasileira ainda persiste na sua incapacidade de reconhecer o passado e de preparar o futuro.

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