Equipe estuda suspeitos e desvenda crimes em SP
SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) - A série americana Criminal Minds, sucesso entre amantes de produções policiais, acompanha o trabalho de um departamento do FBI que analisa o comportamento de criminosos para descobrir os envolvidos em um crime. Na cidade de São Paulo, há profissionais que realizam um trabalho parecido. Eles fazem parte do primeiro laboratório do país de perfilamento criminal.
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Equipe se debruça sobre cenas de crimes violentos em busca de respostas sobre o que aconteceu. Christian Costa, psicólogo criminal e coordenador do setor criado há um ano, explica que o perfilamento consiste em voltar na cena e fazer um breve desenho de como pode ter sido a dinâmica dos fatos, revelando o comportamento e o processo de decisão do autor. ''É uma engenharia reversa, como rebobinar o filme'', fala.
Para isso, é preciso primeiro entender a mente de criminosos. Christian visitou presídios brasileiros durante 15 anos e realizou mais de 6.000 entrevistas para catalogar o comportamento de infratores: ''A gente aprende sobre o perfilamento criminal no presídio. É ouvindo o preso dizer por que ele fez, porque aquela vítima e por que daquele jeito''. Assim, ele desenvolveu um método de análise que guia suas atividades dentro do DHPP (Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa) onde o grupo está inserido.
O laboratório busca, em fotos e vídeos da cena, rastros comportamentais deixados pelo autor. Os investigadores costumam solicitar relatórios para o time de perfilamento durante ocorrências em que as pistas e as conclusões não estão claras. ''O grupo quer compreender a mente do criminoso, isso é o que eles fazem. A gente, que é policial e investigador, quer o criminoso'', disse Ivalda Aleixo, diretora do DHPP, ao UOL.
O tipo de ferimento na vítima, a posição do corpo, o local do crime e o método usado para matar são alguns dos elementos que o grupo observa. ''Com isso, você vai saber se o criminoso é um artista, se já faz isso há muito tempo, ou se é um iniciante. É o tipo de configuração dos ferimentos, a área que escolheu, como abordou a vítima'', diz Christian. Ele e Ivalda ainda explicam que a cena é uma ''testemunha'' e ''recorte'' do que ocorreu.
A técnica já existe nos EUA desde a década de 80, mas é novidade no Brasil. O coordenador fez até uma especialização com a pesquisadora americana Ann Burgess, que trabalhou com o FBI por mais de duas décadas para desenvolver a análise comportamental usada pela agência. Christian, no entanto, precisou adaptar muitas metodologias ao contexto brasileiro: ''Não dá nunca para transpor um modelo social, de uma população, de uma sociedade para outra. Todos os testes e estudos são validados na nossa realidade brasileira.''
"O perfilamento criminal é importantíssimo para dar respostas técnicas e científicas sobre o perfil comportamental de homicidas. A gente não tinha isso no Brasil até então", disse Christian Costa.
O grupo trabalha sem saber as linhas de investigação dos delegados. Ivalda esclarece que os policiais têm seus suspeitos, mas não compartilham com o grupo, para que eles possam fazer análises imparciais. Christian diz que a atividade não substitui a apuração dos investigadores, mas traz agilidade e facilidade em algumas situações, além de diminuir ou ampliar as linhas de investigação.
GRUPO AJUDOU EM CASOS DE REPERCUSSÃO
A equipe descartou a possibilidade de latrocínio no caso da professora Fernanda Reinecke Bonin. Em abril, ela foi encontrada morta com sinais de enforcamento após passar um dia desaparecida. A mulher sumiu após ser chamada pela ex-esposa Fernanda Loureiro Fazio para ajudá-la com o carro que supostamente havia quebrado na avenida Jaguaré.
O perfil criminal feito identificou que se tratava de um crime cometido a mando de alguém. A vítima foi estrangulada por um homem e por uma mulher, e seu corpo foi deixado em um terreno na zona oeste. Christian explicou que os autores precisavam conhecer bem a região, mas Fernanda era da zona sul e não tinha nenhum conhecido na área. ''A partir disso, identificamos que era um crime de encomenda.''
Executores também não poderiam ser profissionais, apontou o perfilamento. O psicólogo detalha que o corpo de Fernanda foi deixado com certa ''displicência'': ''Tinham outras possibilidades de esconder o corpo, mas deixaram exatamente no caminho onde passavam pessoas da comunidade e carros. Então ela foi rapidamente encontrada no dia seguinte e a polícia avisada.''
No caso da estudante da USP Bruna Oliveira da Silva, a equipe entregou um perfil detalhado de como seria o autor do crime. A jovem havia saído de um encontro com o namorado, no dia 13 de abril, e voltava para casa quando sumiu. O corpo foi encontrado em um estacionamento na Vila Carmosina quatro dias depois, e um vídeo mostrou que um homem a abordou assim que ela saiu da estação Corinthians-Itaquera.
As características dadas ajudaram as equipes a encontrar a casa do suspeito. O grupo identificou que o homem possivelmente era um predador sexual, pelos sinais violentos deixados no corpo de Bruna. Além disso, precisava morar nas proximidades, já que demonstrou habilidade em transitar por uma região isolada. Teorizaram ainda que seria uma pessoa que vivia de ''bicos'', que morava sozinha e que fosse conhecida por desrespeito às mulheres.
Equipe de buscas perguntou no bairro por alguém com esse perfil. Com essa descrição e com uma imagem reconstituída do rosto dele, capturada no vídeo, moradores disseram que seria o homem conhecido como ''Cachorrão'' e ''Mineiro''. Ele costumava chamar mulheres de ''cachorra'', assim se deu o apelido. Policiais, então, chegaram à residência dele, mas não o acharam. Esteliano José Madureira, 43, foi encontrado morto na sequência.
"A gente escreve tudo isso, faz um breve relatório, muito rápido, e passa para investigação. O resto é com eles, damos toda essa bússola e saímos de cena. Eles, então, continuam o trabalho", disse Christian Costa.
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