Compartilhe este texto

Setores chamam MP do aumento de impostos de insensatez e alertam para impacto em investimentos

Por Folha de São Paulo

12/06/2025 19h00 — em
Economia



SÃO PAULO, SP E CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) - O pacote de aumento de impostos do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, enfrenta fortes reações negativas de associações que representam o setor produtivo e financeiro do país. Entidades empresariais reclamam da ausência de corte de gastos públicos e alertam para impactos em investimentos e crédito.

As medidas, publicadas em MP (medida provisória) na noite de quarta-feira (11), entraram em vigor imediatamente, mas a maior parte de seus efeitos passará a valer em 2026 e dependem de referendo do Congresso Nacional. O governo prevê arrecadar R$ 10,5 bilhões em 2025 e R$ 20,9 bilhões em 2026 com o pacote.

Venilton Tadini, presidente Executivo da Abdib (Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base), classifica a MP como uma "total insensatez" e afirma que a entidade trabalhará para que a medida provisória "seja debelada" e "não seja aprovada". Ele destacou que o texto é um "verdadeiro contrassenso" em relação às prioridades de investimento do governo.

Segundo Tadini, o pacote do governo afeta toda a estrutura de financiamento para o setor de infraestrutura que venha do mercado de capitais. "Esse tipo de ajuste que está sendo feito é mais um penduricalho", afirma.

"Eu acho que [o governo] está usando o remédio errado. Não está afetando os gastos ruins. Tem penduricalhos no Judiciário, no Legislativo, está fazendo benesses num valor absurdo que são R$ 50 bilhões para as bases parlamentares."

O presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Ricardo Alban, afirma ser contra qualquer aumento de impostos para o setor produtivo, argumentando que isso prejudicaria a economia para compensar problemas de caixa do Estado. Alban defende o aumento da tributação sobre as bets, mas também a implementação de uma reforma administrativa e do que chama de gestão racional dos gastos públicos e modernização das leis trabalhistas.

O presidente da CNI afirma que o setor produtivo já está "sufocado por juros abusivos e spreads bancários distorcidos", e que o crédito ficará ainda mais caro, sendo o consumidor final quem arcará com essa carga. Para ele, é inadmissível continuar prorrogando essa situação.

Alban destaca também que o governo federal já arrecadou R$ 170 bilhões em dois anos por meio de medidas arrecadatórias extraordinárias.

A CNI é uma das signatárias de uma nota do setor produtivo, afirmando que considera a MP "mais um triste capítulo da postura recorrente de se optar por soluções imediatistas em vez de enfrentar o verdadeiro desafio estrutural do país: o controle dos gastos públicos".

"Importante destacar que o novo decreto do IOF continua, lamentavelmente, onerando e prejudicando as empresas. Ainda assim, o governo afirma que, para cumprir a meta deste ano, conta com dividendos extraordinários das estatais e com o PL do óleo do perímetro adjacente licitado —o que só reforça que o decreto era e continua sendo sem sentido. É mais do que urgente enfrentar o verdadeiro desafio fiscal do país, que está do lado da despesa pública", afirma o comunicado.

Assinam ainda a nota: CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), Abrasca (Associação Brasileira das Companhias Abertas), Cnseg (Confederação Nacional das Seguradoras), Cnsaúde (Confederação Nacional de Saúde), CNT (Confederação Nacional do Transporte - CNT), CNC (Conselho Nacional do Café), Abrainc e FIN.

A Abecip (Associação Brasileira de Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança) critica os impactos do fim da isenção de Imposto de Renda para LCI (Letras de Crédito Imobiliário), título que tem sido instrumento relevante para o financiamento habitacional, especialmente com a retração da caderneta de poupança.

A associação diz que a LCI não deve ser vista apenas como um investimento financeiro, pois alterações que aumentem seu custo, como o fim da isenção de IR, resultarão na elevação do custo da moradia e podem comprometer o acesso à casa própria.

Em nota, a entidade dizq ue um mercado imobiliário forte depende de uma estrutura de financiamento estável, previsível e atrativa -papel que, segundo a Abecip, a LCI tem cumprido eficazmente.

A Cbic (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) afirma que os empresários do setor reconhecem a importância de buscar o equilíbrio fiscal e reduzir a taxa básica de juros (Selic), mas que enfrentar esse desafio apenas pela via da arrecadação -sem discutir a eficiência do gasto público e alternativas para reduzir despesas improdutivas- penaliza duplamente o setor. "Taxa a produção e taxa o investimento."

Um dos anfitriões de evento do setor de construção realizado nesta quinta em Curitiba, o presidente da Cbic, Renato Correia, criticou a nova tributação e cobrou por reformas estruturantes. Segundo ele, houve avanços em 2025, com "a retomada consistente do programa Minha Casa, Minha Vida, e o aumento do investimento privado na infraestrutura", mas acrescentou que o setor segue com algumas preocupações, como a tributação de LCIs.

"Isso traz obstáculos ao investimento, em especial para o mercado imobiliário. Entendemos que o debate e a aprovação de reformas estruturantes são importantes e necessários. É urgente endereçar, de forma profunda, uma reforma administrativa, com a racionalização do Estado e a melhoria da eficiência da máquina pública", afirmou ele à plateia.

Ao final do evento, Correia pediu que três governadores presentes, Ratinho Junior (PSD-PR), Jorginho Mello (PL-SC) e Eduardo Leite (PSD-RS), ajudassem a "preservar o FGTS", indicando que há centenas de projetos de lei na Câmara dos Deputados dispostos a ampliar a função do fundo, para além do socorro ao trabalhador que ficou desempregado e do financiamento da habitação.

"Nós temos enfrentado muitas flechas contra o FGTS, que é a mola mestra do Brasil na habitação. Esta engrenagem, se um dia faltar, é muito difícil voltar. Temos que ter uma esteira constante", disse ele.

Um manifesto contra a taxação das LCIs -do qual a Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias) é uma das apoiadoras- destaca que a medida encarecerá a casa própria. O manifesto aponta que, desde 2021, as taxas de juros dos financiamentos já subiram 5 pontos percentuais, aumentando o valor das parcelas em 50% e excluindo 800 mil famílias do mercado de crédito habitacional.

Para as fintechs, o impacto foi com o reajuste da CSLL, que saiu de 9% para 15% nas instituições de pagamento e de 15% para 20% nas de crédito, financiamento e investimento.

Além disso, títulos de crédito e lastro, que eram historicamente isentos, passarão a ser tributados em 5% sobre suas receitas caso a MP passe no Congresso, incluindo LCI, LCA, CRI, CRA, CDCA, CPR financeira e debêntures incentivadas, com isenção mantida apenas para títulos integralizados até 31 de dezembro de 2025 sem postergação de vencimento.

Diego Perez, presidente da ABFintechs, avalia que o aumento da carga coloca em risco a atratividade do Brasil como ambiente de inovação, especialmente em um momento de consolidação do setor e crescente competição global. Ele critica a fragmentação do debate ao tratar de forma isolada pontos estruturais da reforma tributária, o que dificulta a construção de políticas públicas estáveis e eficazes.

Quanto aos ativos virtuais, a MP extingue a alíquota progressiva de 15% a 22,5% para ganhos de capital, substituindo-a por uma alíquota única de 17,5%. A isenção para alienações de até R$ 35 mil por mês foi revogada, afetando o pequeno investidor.

O presidente da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (FenaPrevi), Edson Franco, também demonstrou descontentamento com o pacote e afirmou que a tributação de contribuições de previdência privada pelo IOF deve levar o setor a perder R$ 500 bilhões em captação nos próximos dez anos.

Segundo Dyogo Oliveira, presidente da CNseg (Confederação Nacional das Seguradoras), apesar de contrariadas, as entidades não devem optar pela judicialização do IOF. "As conversas continuam com o Congresso e Governo", disse, em coletiva de imprensa na tarde desta quinta.

Edson classificou a medida como um erro estratégico para o país, que pode perder parte da arrecadação dos planos previdenciários que financiam 13% da dívida pública, segundo estimativas da Fenaprevi. Segundo ele, os limites atuais tiram flexibilidade do produto e capacidade de planejamento para pessoas que querem investir no longo prazo.

"[A medida] vai fazer com que a pessoa direcione excedentes para outros investimentos de curto prazo, como a LCA, ou pior, pode ir para consumo. Se a gente olhar desde a emissão do primeiro decreto, há um aumento de 20% nas aplicações diárias de LCA", disse.

O presidente da Fenaprevi também criticou aqueles que relacionam a taxação do VGBL com a dos super ricos. "R$ 1 milhão compra uma renda vitalícia mensal de R$ 5.600. R$ 5 milhões compra uma renda mensal vitalícia aos 65 anos de R$ 28 mil. Isso é super rico? Na minha opinião, não. Temos que entender qual é o preconceito também que está por trás dessas medidas que promovem uma assimetria entre outros produtos e o VGBL".

A Associação Comercial de São Paulo (ACSP) considera a MP um regresso e uma falta de visibilidade do mercado e repudia tal iniciativa. "Dentre o que foi anunciado pelo governo Lula, a única melhoria significativa e que pode reduzir o incentivo aos jogos de apostas on-line é a alíquota das bets que passa de 12% para 18%", afirma, em nota.

PRINCIPAIS MUDANÇAS PROPOSTAS PELO GOVERNO

Aumento da tributação sobre bets: a alíquota sobre a arrecadação passa de 12% para 18%, com 6% destinados à saúde e 12% para outras destinações.

Tributação de investimentos antes isentos: rendimentos de LCI (Letras de Crédito Imobiliário), LCA (Letras de Crédito do Agronegócio), CRI (Certificados de Recebíveis Imobiliários), CRA (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) e debêntures incentivadas, que eram isentos de Imposto de Renda, passam a ter IR retido na fonte com alíquota de 5% para títulos emitidos a partir de 1º de janeiro de 2026.

Fundos Imobiliários e Fiagros: rendimentos que eram isentos de Imposto de Renda passam a ser tributados em 5%.

Outros Investimentos: a alíquota do IR será de 17,5%, independentemente do prazo, diferentemente da variação anterior de 15% a 22,5%.

Criptomoedas: ganhos líquidos com moedas e ativos virtuais, incluindo criptomoedas, ficam sujeitos à alíquota de 17,5% no Imposto de Renda. Antes, movimentações mensais eram isentas até R$ 35 mil, com escalonamento de 15% a 22% acima disso.

CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido): instituições de pagamento e fintechs, que pagavam 9%, passam a pagar 15%. A alíquota para bancos permanece em 20%.

Medidas de contenção de despesa: foram incluídas a inclusão do Pé-de-Meia no piso da educação, novas regras de acesso ao seguro-defeso e mudanças no AtestMed.


Siga-nos no
O Portal do Holanda foi fundado em 14 de novembro de 2005. Primeiramente com uma coluna, que levou o nome de seu fundador, o jornalista Raimundo de Holanda. Depois passou para Blog do Holanda e por último Portal do Holanda. Foi um dos primeiros sítios de internet no Estado do Amazonas. É auditado pelo IVC e ComScore.

ASSUNTOS: Economia

+ Economia


18/07/2025

Correção