Compartilhe este texto

Documentário recupera Modigliani pelo olhar de sua última companheira

Por Folha de São Paulo

13/11/2025 12h28 — em
Arte e Cultura



FOLHAPRESS - Como filmar a história de grandes artistas e as imagens que produziram? Como colocar em movimento obras de arte originalmente estáticas? Ainda: é possível preservar o encanto de um objeto artístico quando ele passa a ser observado através de um filme? Cineastas importantes, de Maurice Pialat a Tim Burton, passando por Straub e Huillet e Michelangelo Antonioni, vêm esboçando, com seus filmes, respostas para essas questões.

O documentário "Maldito Modigliani", de Valeria Parisi, que chega agora aos cinemas, oferece uma visão original sobre essas questões. Instigante, o retrato do artista italiano Amedeo Modigliani é estruturado por relatos da pintora Jeanne Hébuterne, última companheira de Modigliani, e inclui cenas com atores e atrizes caracterizados como o artista e suas amantes —além de Hébuterne, a poeta russa Anna Akhmátova e a jornalista e poeta britânica Beatrice Hastings, abundantemente retratadas por ele.

A realizadora se apoia em pesquisas e entrevistas com especialistas para imaginar situações e sentimentos de Hébuterne diante de diferentes passagens da vida do artista, desde que deixou sua Itália natal, em 1906, para instalar-se em Paris, onde se conheceram.

A viagem de trem, de Livorno a Lyon, faz lembrar dos registros dos irmãos Lumière, que inauguraram o cinematógrafo na década anterior. Imagens do cinema dos primeiros tempos, aliás, acompanham todo o filme, que reconstitui a cena artística do início do século 20, quando a obra de Modigliani floresceu.

Autor de retratos inconfundíveis, com rostos ovais, longos pescoços e olhos vazados, Modigliani teve uma vida pobre —e curta— em Paris. O título do filme retoma o apelido, "Modi", que, em francês, soa como "maldito", "maudit".

O artista viveu na pobreza e fez raras vendas em vida. Os poucos francos que recebia contrastam com os valores que suas telas atingem em leilões recentes, mais de US$ 100 milhões.

Modi conviveu com Picasso, Brancusi, Soutine e outros artistas que reinventavam a arte do século passado. Na comparação com o cubista espanhol, mais impulsivo e instintivo, Modigliani é visto como um intelectual de gestos bem pensados. Sem material para pintar nos anos de guerra, Picasso teria usado uma tela de Modigliani como base para uma criação sua. Depois da morte do amigo, comprou de um marchand uma obra sua, como provável reparação.

Por meio de Modigliani, o filme descortina personagens saborosos do mundo das artes, que renderiam novos filmes. Um deles é o britânico John Myatt. Entrevistado por Parisi, ele conta como falsificou telas do italiano, vendidas com sucesso. "Eu precisava ser cuidadoso com os contornos e depois preencher tudo em poucas horas", diz ele, explicando que usava tintas da época do pintor, de modo a enganar os especialistas. Myatt foi preso pela Scotland Yard nos anos 1990 e hoje vive como artista.

Em determinado momento, Modigliani aproximou-se de Brancusi e começou a trabalhar a escultura. Uma coluna característica do escultor romeno aparece, inclusive, em uma tela emblemática do italiano. Mas o pó do mármore e do gesso logo enfraqueceu os pulmões de Modi, depois acometido pela tuberculose, que lhe faria sucumbir aos 35 anos.

Tantas vezes retratada pelo companheiro, com os olhos desprovidos de pupila, como se seu rosto fosse uma máscara, Hébuterne aparece, no fim do filme, como uma pintora por inteiro, autora de uma obra promissora.

Ela morreu aos 21 anos, ainda mais jovem que Modi. Na realização de Valeria Parisi, a história de Modigliani é também a da mulher que queria aprender a pintar junto com os homens —e que não sobreviveu à perda do amor de sua vida. "Maldito Modigliani" deixa o desejo de novos filmes dedicados a sua derradeira musa.

MALDITO MODIGLIANI

- Avaliação Muito bom

- Classificação 14 anos

- Produção Itália, 2020

- Direção Valeria Parisi

- Onde ver Em cartaz nos cinemas


Siga-nos no
O Portal do Holanda foi fundado em 14 de novembro de 2005. Primeiramente com uma coluna, que levou o nome de seu fundador, o jornalista Raimundo de Holanda. Depois passou para Blog do Holanda e por último Portal do Holanda. Foi um dos primeiros sítios de internet no Estado do Amazonas. É auditado pelo IVC e ComScore.

ASSUNTOS: Arte e Cultura

+ Arte e Cultura