Governo Macri aposta em lei de delação premiada para punir corruptos
BUENOS AIRES - Com vários ex-funcionários kirchneristas, entre eles a própria ex-presidente Cristina Kirchner (2007-2015), às voltas com denúncias de corrupção, a aprovação, quarta-feira, da chamada Lei do Arrependido foi considerada pela Casa Rosada, congressistas e juristas locais um passo essencial para que a Justiça possa avançar nos processos. A partir de agora, os tribunais argentinos poderão utilizar delações premiadas em casos de corrupção e associação ilícita — antes elas valiam apenas para narcotráfico, lavagem de dinheiro e terrorismo. A expectativa é de que os primeiros arrependidos sejam os kirchneristas já presos, como o ex-secretário de Transporte Ricardo Jaime e o empresário Lázaro Báez, sócio da antiga família presidencial argentina.
Entre 2003 e 2015, estima-se que foram apresentadas mais de 2.100 acusações judiciais contra funcionários kirchneristas. A ex-presidente no próximo dia 31 deverá prestar depoimento ao juiz Julián Ercolini, que investiga uma suposta associação ilícita entre o governo de Cristina e Báez, um dos empresários mais favorecidos em concessões de obras públicas durante os mandatos dela. Será a primeira vez que a ex-chefe de Estado comparecerá aos tribunais para contestar uma denúncia de corrupção. Em abril passado, Cristina foi convocada pelo juiz Claudio Bonadio, mas o processo em seu poder é sobre irregularidades em operações de venda de dólar futuro no Banco Central.
Consultada pelo GLOBO, a deputada Margarita Stolbizer, que fez as principais denúncias de corrupção contra a ex-presidente, afirmou que a “nova lei é uma ferramenta importante”.
— Agora temos de trabalhar para ter uma Justiça mais eficiente e, também, uma lei de proteção ao denunciante — defendeu Margarita.
A iniciativa, promessa de campanha do presidente Mauricio Macri, foi aprovada por 137 votos e sem a presença da bancada kirchnerista na Câmara.
— Presenciamos o maior papelão do kirchnerismo desde que deixaram o poder. Eles não assumem responsabilidade por nada — disse o deputado Waldo Wolff, da aliança governista Mudemos, para quem “o futuro dos processos judiciais dependerá da coragem dos juízes argentinos”. — Nós criamos uma ferramenta que pode ser muito útil, sempre e quando os magistrados tenham vontade e decisão para avançar.
Ele lembrou que juízes como Daniel Rafecas já confirmaram publicamente que “o dinheiro da corrupção kirchnerista vinha da política”. Wolff se referiu especificamente aos cerca de US$ 900 mil que o ex-secretário de Obras Públicas, José López, preso desde junho, tentou esconder num mosteiro da província de Buenos Aires.
— Se é assim, eles devem atuar com firmeza e apontar sua artilharia em direção às altas autoridades dos governos Kirchner — assegurou o deputado.
A nova lei estabeleceu que futuros arrependidos só poderão fazer delações premiadas em casos nos quais também estejam denunciados e antes de que o processo chegue à instância de julgamento. Foram excluídos da lei casos de lesa-Humanidade. O benefício a futuros delatores será uma eventual redução de sua condenação, de, no máximo, 15 anos. O delator não poderá ser eximido de prisão.
— O Brasil é um exemplo, mas não podemos fazer comparações. Aqui não temos uma polícia federal parecida, nem juízes como Sergio Moro. Temos expectativa, mas também cautela — apontou o jurista Ricardo Monner Sans.
Na opinião do professor de Direito Constitucional Andrés Gil Domínguez, “o importante da lei é que permitirá o surgimento de provas que venham do círculo íntimo da corrupção”.
— Acho que podemos ver kirchneristas arrependidos nos próximos tempos, começando pelos que já estão presos como Jaime (único kirchnerista já condenado) e Báez — disse Domínguez.
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