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David Cronenberg diz querer 'cometer mais crimes' em próximos filmes em Cannes

Por Folha de São Paulo

24/05/2022 9h36 — em
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CANNES, FRANÇA (FOLHAPRESS) - David Cronenberg serviu um banquete de tripas ao público do Festival de Cannes na noite desta segunda (23) e, na manhã seguinte, já estava de pé para fazer uma autópsia completa de seu novo filme, "Crimes of the Future", ou crimes do futuro.

Em conversa com jornalistas, o diretor de "A Mosca" e "Crash: Estranhos Prazeres", aos quais o novo longa vem sendo associado pela crítica, falou justamente sobre como "Crimes of the Future" mais se relaciona com "Videodrome: A Síndrome do Vídeo", de 1983. Não que um seja sequência para o outro, mas, "acidentalmente", há uma simbiose entre as duas histórias.

"Mas quando eu escrevi 'Crimes of the Future' eu não estava pensando em outros filmes, eu queria algo que funcionasse sozinho", disse sobre o novo trabalho e aquele em que um programador de televisão descobre uma espécie de seita que quer limpar o mundo daqueles que ligam a TV para assistir ao que acreditam ser pura perversidade.

"Esse novo filme questiona quem é dono de nossos corpos, fala sobre uma forma de controle opressivo sobre eles. Não é para ser um filme excessivamente político, mas é claro que toda arte é política, no sentido de expressar um contexto, um intelecto, uma linguagem."

Simpático e de bom humor, o cineasta relacionou seu roteiro às incessantes discussões sobre o uso de plástico e a degradação ambiental à nossa volta. "Há 20 anos ninguém falava sobre microplástico, e agora a cada cinco dias temos uma revelação sobre o assunto", disse sobre as partículas de polímeros que poluem os oceanos e já se infiltraram no corpo humano.

"O filme foi escrito antes dessa discussão toda, mas curiosamente ele apresenta uma solução irônica para o assunto. Não conseguimos limpar o planeta dos microplásticos, então vamos abraçá-los, aproveitá-los, comê-los e quem sabe resolver o problema da fome mundial. É uma sátira, mas ao mesmo tempo há um fundo de realidade nisso."

"Crimes of the Future" leva Cronenberg de volta às suas raízes de "body horror" e narra a história de uma sociedade futurista em que o corpo humano passa por transformações e absorve o sintético à sua volta. Novos órgãos crescem nas pessoas e Viggo Mortensen, o protagonista, é visto como um grande artista por transformar essa capacidade em performances grotescas e ovacionadas, com a parceira interpretada por Léa Seydoux.

Fazendo piadas -"devo avisá-los que eu sou mais velho que o Festival de Cannes", disse a certa altura- e interrompendo seus atores para fazer comentários engraçadinhos entre uma resposta e outra, Cronenberg também criticou a guerra que Putin trava na Ucrânia e disse que em seu país de origem, o Canadá, todos acham que os americanos "ficaram loucos", em alusão à eleição de Donald Trump.

Sobre "Top Gun", que teve sua sequência exibida no início do evento francês e que quase foi dirigido por Cronenberg nos anos 1980, o cineasta disse que é "ótimo gastar duas horas vendo o filme, mas não dois anos para fazê-lo".

Ao seu lado, os atores Viggo Mortensen, Léa Seydoux e Kristen Stewart elogiaram o diretor, com a francesa ressaltando que quis trabalhar com ele por ser "um ícone do cinema, alguém que inventou sua própria linguagem e estilo", enquanto a atriz da saga "Crepúsculo" lembrou que o primeiro longa do cineasta que viu foi o estranhamente erótico "Crash", "provavelmente quando ainda era nova demais para ver algo assim".

"Mas eu amei, amei o sentimento de pensar que ver aquilo me traria problemas. Os hematomas dos filmes dele nunca causam repulsa. Eles me deixam boquiaberta, com um tipo de desejo visceral", disse. "Todo dia no set de filmagem, após as gravações, nós, atores, nos reuníamos e questionávamos 'que merda nós estamos fazendo?'."

Aos 79 anos, Cronenberg, estrela de uma das conversas com a imprensa mais disputadas de Cannes, encerrou com a promessa de que vai continuar sendo um transgressor -"eu ainda pretendo cometer mais alguns crimes".

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