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Doria esvazia Complexo do Ibirapuera enquanto não pode privatizá-lo

Por Folha de São Paulo

22/09/2021 12h06 — em
Esportes



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Enquanto praticamente todas as atividades esportivas estão liberadas no estado de São Paulo e se discute a volta das torcidas aos estádios de futebol, no Complexo do Ibirapuera, tradicional berço do esporte olímpico brasileiro, a situação é diferente.

Impedido pela Justiça de abrir o edital para a concessão do local à iniciativa privada, o governo Doria trabalha para esvaziá-lo. A academia de musculação, por exemplo, não está autorizada a atender pessoas e os treinamentos esportivos não conseguiram o aval para retornar ao local ou foram realocados para outras praças.

Vale lembrar que as academias estão liberadas para funcionar, com restrições, desde abril. Funcionários do ginásio disseram à Folha de S.Paulo, em condição de anonimato, que as inscrições para os treinos funcionais (que atendem sobretudo a população do bairro) até chegaram a ser abertas.

Eles contam que, no fim de agosto, após iniciar os cadastros para quem quisesse utilizar o espaço, seus superiores avisaram por Whatsapp que as inscrições deveriam ser suspensas até nova ordem da direção do complexo.

Questionada, a Secretaria de Esportes do estado afirmou que os protocolos para retorno das atividades no local foram aprovados no último dia 14.

"Desde então, a pasta está organizando todos os procedimentos de distanciamento, sinalização, álcool gel e demais ações para promover um retorno seguro das atividades na academia e quadras cobertas do Ibirapuera", disse o órgão, em nota.

A reportagem visitou o local, que já abrigou o Centro de Excelência Esportiva (antigo Projeto Futuro) e foi casa de medalhistas olímpicos como Maurren Maggi (ouro no salto em distância) e os judocas Tiago Camilo (prata e bronze), Felipe Kitadai (bronze), Rafael Silva (dois bronzes) e Henrique Guimarães (bronze).

Durante a visita, a Folha de S.Paulo testemunhou a academia vazia e não viu treinos de alto rendimento. Também observou que os problemas de infraestrutura, que há anos são uma demanda dos atletas que utilizam o espaço, se agravaram.

Atualmente funciona no local um posto do laboratório privado Fleury para testes de Covid. O estádio de atletismo, que abrigou um hospital de campanha durante vários meses na pandemia, está em pior estado do que antes da chegada do coronavírus ao Brasil -com a pista em péssimas condições e o gramado também ruim.

A parede da piscina de saltos cedeu dentro do tanque. Relatos dão conta também de que o sistema de aquecimento de água quebrou.

Os funcionários reclamam ainda que a paralisação das atividades em razão da pandemia era o momento perfeito para que fosse feita a manutenção das instalações, que há anos se deterioram pela falta de cuidado. Não aconteceu.

O governo de João Doria (PSDB) realocou as equipes de treinamento do atletismo e do judô para o recém inaugurado Centro Excelência Esportiva em São Bernardo do Campo. Segundo os relatos, o local tem alojamento e estrutura de ponta e é excelente para a prática esportiva.

Já o vôlei não foi realocado para nenhum lugar. O projeto já recebeu autorização da Prefeitura de São Paulo para realizar treinos, mas há meses aguarda aval do governo do estado para retornar ao Ibirapuera. Enquanto não pode utilizar o lugar, gasta R$ 2.000 por mês para alugar horários em uma quadra particular e não consegue manter nem metade das 100 atletas que tinha antes da pandemia.

Questionada, a secretaria afirmou que "está investindo também R$ 30 milhões na modernização do Complexo Baby Barioni [na Barra Funda], que vai contar com academia completa e aulas em diversas modalidades".

Há na pasta a expectativa de que o complexo seja privatizado em breve e que uma empresa invista R$ 1 bilhão no local, por isso não faria sentido o investimento em obras e infraestrutura.

A privatização do Complexo do Ibirapuera é um desejo antigo das gestões tucanas em São Paulo, mas enfrenta forte resistência de atletas, ex-atletas, moradores e entidades culturais e vem sofrendo derrotas em diversos âmbitos.

Uma das batalhas é travada na área da preservação do patrimônio. Projetado pelo arquiteto brasileiro Ícaro de Castro Mello, há diversos pedidos para que o complexo seja tombado.

No início do ano, a Folha revelou que o local tornou-se novo palco das disputas entre Doria e Jair Bolsonaro (sem partido).

Crítico do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), o presidente quer que o órgão aprove o tombamento do complexo em nível federal.

Em tese, isso não proibiria a privatização, mas torna quase inviável os planos de, por exemplo, construir uma nova arena multiuso para 20 mil pessoas ou até a transformação do ginásio principal em um shopping.

Paralelamente, para tentar evitar que o espaço seja tombado, Doria chegou a mudar a composição do Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico de SP, entidade que cuida do assunto em nível estadual).

Após a intervenção do governador, o conselho decidiu não incluir o complexo em sua lista de patrimônios a serem preservados, o que na época foi uma vitória do tucano.

No Iphan, o tombamento já teve pareceres favoráveis. Caso seja concretizado, anulará a jogada de Doria.

O governador também foi derrotado na Justiça de São Paulo, que emitiu uma liminar para barrar o edital de concessão do complexo. O governo trabalha junto com a Prefeitura para reverter a decisão.


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