O sorriso sob censura
Esse país, tão pobre e tão infeliz, deveria ter ao menos o direito de sorrir de sua tragédia.
Sorrir é verbo. Fala por si mesmo. E é milagre. Mesmo nos momentos mais críticos há espaço para o riso, seja porque de repente surge a percepção de que nem tudo foi perdido ou de que é possível um recomeço. Por isso especialistas dizem que o sorriso é "uma poderosa ferramenta psicossocial".
Você tem uma experiência própria sobre o sorriso. Quantas vezes, mesmo sob constrangimento e vergonha, você riu muito quando um amigo querido, ao seu lado, levou um escorregão? E ele, olhando para você, machucado e surpreso, perguntou: "E você ainda acha graça?" É o inesperado, você e o processo mental desencadeado com o escorregão.
Assim é a piada. Ela precisa provocar em você essa reação, independentemente de como é contada.
Nos anos 80 a TV proporcionava programas de humor incríveis, com as piadas de Costinha e seu repertório gay - hoje, homofóbico. De Dercy Gonçalves, com sua "língua suja" ou de Chico Anísio, denunciando, de forma jocosa, corrupção dos políticos.
Hoje esses humoristas não teriam espaço para fazer o Brasil sorrir e terminariam presos.
O que está acontecendo com Brasil pós - ditadura, se a censura em muitos casos é maior, mais intensa, mais persecutória? Onde erramos ?
No excesso de leis que não garantem direitos, apenas mantêm um preconceito que continua escondido sob o capuz falso de um país que se reinventou mal, deu superpoderes a juízes que julgam por critérios próprios, muitas vezes ignorando a própria lei, mesmo leis mal redigidas, aprovadas para agradar grupos minoritários, que na prática continuam vítimas. A prática social continua a mesma.
Quando encarceram um humorista, quando calam o sorriso, juízes fazem justiça com as próprias mãos, ou com base em leis mal redigidas e que apenas estimulam mais injustiças, estão matando a esperança. Estão matando a alegria.
Esse país, tão pobre e tão infeliz, deveria ter ao menos o direito de sorrir de sua tragédia.
ASSUNTOS: Brasil, censura, humor

Raimundo de Holanda é jornalista de Manaus. Passou pelo "O Jornal", "Jornal do Commercio", "A Notícia", "O Estado do Amazonas" e outros veículos de comunicação do Amazonas. Foi correspondente substituto do "Jornal do Brasil" em meados dos anos 80. Tem formação superior em Gestão Pública. Atualmente escreve a coluna Bastidores no Portal que leva seu nome.