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Michelle Williams cuida de pombo de estimação em filme no Festival de Cannes

Por Folha de São Paulo

27/05/2022 15h06 — em
Arte e Cultura



CANNES, FRANÇA (FOLHAPRESS) - O Festival de Cannes deixou para as mulheres a tarefa de encerrar as sessões de candidatos à Palma de Ouro desta 75ª edição. Foi com Kelly Reichardt e Léonor Serraille que a programação chegou ao fim, em filmes que não terão muito tempo para gerar burburinho até a premiação deste sábado, mas que nem por isso devem ser esquecidos.

Depois da coleção de elogios conquistada em seu último trabalho, "First Cow: A Primeira Vaca da América", Reichardt apresenta "Showing Up", algo como aparecer. E o termo é chave para a trama que tem Michelle Williams à frente.

Ela encara uma artista plástica às vésperas de uma exposição. Enquanto tenta se concentrar na finalização de suas peças, tem de lidar com pequenas interrupções cotidianas que a deixam ansiosa e vão, de certa forma, modulando sua arte.

Ela esculpe meninas de argila, de face tão inexpressiva e vazia quanto a da protagonista. Não por culpa de Williams, que está ótima na nova parceria com Reichardt, mas porque a personagem é assim. Não se abala, não se emociona e não deixa transparecer nenhum grande sentimento.

O primeiro dos imprevistos a desordenar seu trabalho é a falta de água quente em casa, que se arrasta há semanas. Depois, um pombo é atacado por seu gato e a vizinha, uma grande sem noção, decide cuidar dele. E há também seu irmão, "um gênio", segundo a mãe, mas também um caso perdido.

As esculturas da protagonista vão ganhando vida ao longo do filme, conforme a própria artista vai se transformando. Tudo sob o olhar perdido do pombo de estimação, que passa mais tempo com ela do que com a vizinha.

Reichardt repete aqui os personagens solitários, que encontram em animais um pouco de conforto. Foi assim em "First Cow" e sua vaca leiteira, e também em "Wendy e Lucy", em que a própria Williams rodava os Estados Unidos com seu cachorro, até perder o bicho de vista.

Em "Showing Up", ela mais uma vez encarna uma mulher que vive na sombra -do irmão genial, da vizinha bem-sucedida ou dos amigos aproveitadores do pai.

É um filme pequeno, como os de Reichardt sempre são, em que pouca coisa acontece, ao menos numa leitura superficial.

Enquanto a americana acompanha sua protagonista por alguns poucos dias, a francesa Léonor Serraille filma seus personagens por 20 anos. "Un Petit Frère", ou um irmãozinho, mostra o momento em que dois irmãos chegam à França, vindos da Costa do Marfim, até alcançarem a vida adulta.

Ancorado por outra boa performance feminina, dessa vez de Annabelle Lengronne, o longa é uma crônica sobre essa pequena família, que em sua tímida ambição acaba alçando voos que seus pares franceses na competição pela Palma não conseguiram.

A imigrante de Lengronne é cheia de nuances, tem uma sexualidade aflorada e nunca é abordada pela lente do "coitadismo" que marca, por exemplo, "Tori et Lokita", que os irmãos Dardenne trouxeram ao festival ninguém sabe por quê.

Entre os anos 1980 e 2000, a mãe prepara seus dois filhos para a realidade dura que, ela sabe, encontrarão pela frente, mas sem que o roteiro recorra a grandes discursos ou violências. Tudo é muito sutil em "Un Petit Frère".

Um dos destaques é a trilha sonora, que com frequência opõe música erudita a ritmos africanos marcados pela percussão, ilustrando o caldeirão cultural no qual Serraille joga seus personagens.


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