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Documentário sobre Antonio Callado chega aos cinemas em tom de protesto

Por Folha de São Paulo

21/01/2021 17h35 — em
Arte e Cultura



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O lançamento do documentário sobre Antonio Callado nesta quinta-feira (21) foi um "ato de protesto contra a asfixia na área da cultura", disse a diretora, Emilia Silveira.

A obra chega às salas de cinema a contragosto da equipe, que acredita ainda ser um momento para ficar em casa em razão da pandemia. Como tem patrocínio da Ancine, porém, o filme precisa passar nos cinemas antes de ir para outras plataformas.

O documentário está pronto há três anos, e a maior expectativa dos produtores é o lançamento no streaming, que já tem data marcada: 24 de fevereiro, no Now.

Por asfixia na área cultural, Silveira se refere, entre outras coisas, ao enxugamento e à tentativa de aparelhamento da Ancine, além da relação fragmentada que a agência tem tido com as equipes dos filmes já aprovados para receber o fomento.

Os comentários foram feitos durante debate realizado pelo jornal Folha de S.Paulo nesta quarta-feira (20), que também contou com a participação da jornalista Ana Arruda, viúva de Callado, e do filósofo e crítico literário Eduardo Jardim. A mediação foi feita pelo repórter especial Naief Haddad.

O documentário é um mergulho na vida pessoal e profissional do escritor. Além de imagens e depoimentos de arquivo, o filme permite conhecê-lo por meio de uma costura de entrevistas atuais com amigos e parentes, como os jornalistas Carlos Heitor Cony (1926-2018) e Wilson Figueiredo.

O olhar crítico para a realidade brasileira combina com a própria postura que Callado (1917-1997) empregou ao longo de seus 60 anos de carreira. O escritor e jornalista foi um crítico constante de seu tempo, tanto em períodos violentos, como na ditadura militar (1964-1985), quanto no pós-redemocratização.

"Quarup" (1967), seu principal livro, que está sendo relançado, resume parte de suas aflições. A obra narra uma busca pelo ponto geográfico central do país, que acaba sendo encontrado em um formigueiro.

"Ao mesmo tempo em que ele se põe em busca de um centro do país, demonstra uma perspectiva crítica em relação à possibilidade de fazer um estrato do Brasil, porque esse centro está ocupado por saúvas assassinas [espécie de formiga-cortadeira]", diz o filósofo e crítico literário Eduardo Jardim durante o debate.

Estudioso da obra de Callado, ele lembra que o escritor foi, também, um autocrítico. "Ele se revê ao longo de sua obra. Em 'Bar Don Juan' (1972), faz uma avaliação da saída radicalizada que tinha sido proposta em 'Quarup', por exemplo."

Ana Arruda, jornalista, escritora e viúva de Callado, acredita que sua obra ainda é atual, e pode dar sentido aos anseios das novas gerações. A ironia, uma de suas características, ajuda a dar leveza aos temas difíceis.

Apesar dessa vivacidade, afirma que o escritor, se vivo em 2021, sentiria a mesma desilusão que demonstrou em sua última entrevista concedida, em janeiro de 1997. À época, Callado disse não ter esperança em uma mudança real no Brasil. "Acho que hoje ele diria exatamente isso", afirma Ana.

"Callado apontava essa tragédia anunciada brasileira", acrescenta a diretora Emilia Silveira. "As vanguardas do atraso estão conseguindo ser mais bem sucedidas no Brasil do que as vanguardas progressistas."

De 1992 a 1996, Callado foi colunista desta Folha. Suas colunas podem ser acessadas no arquivo digital do jornal, e versam sobre diversos temas. Em um dos últimos textos, publicado em novembro de 1996, disse achar que o século 21, em termos estéticos e de criação artística, seria um "bocejo gigantesco".

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