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Subprocuradores rebatem Aras e dizem que é atribuição da PGR investigar presidente da República

Por Folha de São Paulo

20/01/2021 20h05 — em
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BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Integrantes do Conselho Superior do MPF (Ministério Público Federal) rebateram nesta quarta-feira (20) a nota em que a PGR (Procuradoria-Geral da República) afirmou ser competência do Legislativo a responsabilização da cúpula dos Poderes por eventuais ilícitos no enfrentamento da Covid-19, o que inclui o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Criticaram também Bolsonaro pela recente declaração que fez sobre as Forças Armadas decidirem se o país terá ou não democracia. E classificaram a fala de “clara afronta à Constituição”.

Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) ouvidos sob reserva, por sua vez, disseram que o texto da PGR não se alinha ao que prega o texto constitucional.

Isso porque, ao se eximir de responsabilizar autoridades, a Procuradoria abre mão de um dos principais poderes da instituição, que é o de ser fiscal da lei.

O texto divulgado pela PGR nesta terça-feira (19) e que motivou críticas no meio jurídico e político afirmou ainda que o estado de calamidade pública que o país enfrenta atualmente em razão da pandemia do coronavírus é “a antessala do estado de defesa”.

Na avaliação de dois integrantes do STF, não há motivo para o procurador-geral da República, Augusto Aras, mencionar a possibilidade de decretação de estado de defesa.

Para eles, apesar da crise de saúde, o estado de calamidade pública tem sido suficiente para o país enfrentar os problemas no combate à Covid-19.

A análise de um dos ministros é que a nota de Aras foi mais uma sinalização em direção a Bolsonaro a fim de pavimentar o caminho para ser indicado ao Supremo.

Em nota divulgada nesta quarta, seis subprocuradores-gerais da República que compõem o Conselho Superior do MPF afirmaram que investigar autoridades é atribuição de quem exerce as funções de procurador-geral da República.

"Referida nota [da PGR] parece não considerar a atribuição para a persecução penal de crimes comuns e de responsabilidade da competência do Supremo Tribunal Federal”, afirmaram os subprocuradores.

“Tratando-se, portanto, de função constitucionalmente conferida ao procurador-geral da República, cujo cargo é dotado de independência funcional."

O conselho é a instância máxima de deliberação administrativa na estrutura do Ministério Público Federal.Foi nesse colegiado que Aras, no ano passado, foi cobrado pelas críticas que desferiu às forças-tarefas da Lava Jato, em especial ao grupo de Curitiba.

O repúdio à nota da PGR foi assinado por José Adonis Callou, José Bonifácio, José Elaeres, Luiza Frischeisen, Mário Bonsaglia e Nicolao Dino. Alguns deles tiveram os nomes incluídos, por votação interna, em listas tríplices para indicação ao posto de PGR.

Aras foi uma escolha do presidente Bolsonaro fora dessa seleção. O chefe do Executivo já declarou que o atual PGR é nome “forte” para assumir vaga no Supremo.

A nota da PGR desta terça foi uma resposta, segundo o texto, a “segmentos políticos” que “clamam por medidas criminais contra autoridades federais, estaduais e municipais”.

Com a crise de desabastecimento de oxigênio medicinal no Amazonas, intensificaram-se as cobranças para que Aras investigue Bolsonaro e outras autoridades, entre elas o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello.

Aras tem respondido a interlocutores que cabe a ele investigar o presidente em casos de crime comum, mas o crime de responsabilidade é atribuição do Legislativo.

“O Ministério Público Federal e, no particular, o procurador-geral da República precisa cumprir o seu papel de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e de titular da persecução penal, devendo adotar as necessárias medidas investigativas”, defenderam os seis subprocuradores.

“Sem excluir previamente, antes de qualquer apuração, as autoridades que respondem perante o Supremo Tribunal Federal, por eventuais crimes comuns ou de responsabilidade (CF, art. 102, I, b e c)", acrescenta a nota.

O texto do artigo mencionado diz que compete ao STF (Supremo Tribunal Federal) “processar e julgar, originariamente, nas infrações penais comuns, o presidente da República, o vice-presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios ministros e o procurador-geral da República”.

E, nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os ministros de Estado e os comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, além de integrantes dos tribunais superiores, do TCU (Tribunal de Contas da União) e chefes de missão diplomática.

Os subprocuradores afirmaram na nota de repúdio que, em cenário mundial em que se busca a adoção de medidas de prevenção e de emprego de recursos e estudos para produção de vacinas, o Brasil vive realidade diversa, como se verificou, por exemplo, no desabastecimento de oxigênio medicinal no Amazonas.

Além da debilidade da coordenação nacional de ações para enfrentamento da pandemia, disseram ainda os autores, o país assiste ao comportamento incomum de autoridades, revelado na divulgação de informações em descompasso com orientações científicas, na defesa de tratamentos preventivos sem comprovação médica.

A ANPR, entidade que representa a categoria de procuradores da República, também se manifestou em nota.

A associação afirmou que cabe ao MPF e a todos seus integrantes “a defesa contínua e intransigente da democracia e dos seus valores”.

“Qualquer alusão, no atual estágio da democracia brasileira, a estados de exceção, inclusive aqueles previstos na própria Constituição, como os estados de sítio e de defesa, se mostra absolutamente desarrazoada”, afirmou a associação.

A entidade disse que compete ao Ministério Público a prerrogativa “inafastável” de investigar a prática de crimes e processar os acusados, inclusive aqueles que são praticados, por conduta ativa ou omissiva, por autoridades públicas sujeitas a foro especial.

Em defesa de sua atuação, a PGR informou que vem adotando as providências cabíveis dentro de suas atribuições e de acordo com decisões do STF sobre as competências das esferas federal, estadual e municipal.

Entre as providências, criou o Giac (Gabinete Integrado de Acompanhamento da Epidemia Covid-19), que tem a missão de buscar o diálogo e integração entre segmentos da sociedade e autoridades para a solução de questões emergenciais, como a falta de oxigênio medicinal na rede de saúde do Amazonas.

A Procuradoria tem realizado também, segundo a assessoria de Aras, a fiscalização de verbas destinadas ao enfrentamento da pandemia.

Inquéritos criminais foram abertos contra oito governadores suspeitos de desvios, incluindo o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC). Um deles resultou no afastamento de outro governador, Wilson Witzel (PSC), do Rio de Janeiro.

As medidas intensificaram-se nos últimos dias, diante do grave quadro registrado em Manaus. A PGR abriu investigação criminal contra autoridades estaduais e municipais do Amazonas por suposta omissão no caso do oxigênio.

Em relação ao governo federal, as medidas foram de caráter administrativo: Aras pediu esclarecimentos sobre o caso ao ministro da Saúde e requisitou a instauração, pela pasta, de um inquérito epidemiológico e sanitário.

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