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'É difícil relatar, é uma imagem muito forte', diz bombeiro sobre boate Kiss

Por Folha de São Paulo

07/12/2021 20h07 — em
Variedades



PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) - O coronel Gerson da Rosa Pereira, ex-chefe do Comando Regional dos Bombeiros de Santa Maria (RS), disse que nunca esqueceu as cenas que viu quando entrou na boate Kiss, em 27 de janeiro de 2013.

A declaração foi dada nesta segunda (7) durante o depoimento do militar no julgamento sobre os 242 mortos e as centenas de pessoas feridas daquele dia.

Pereira disse que encontrou muita gente perdida do lado de fora do local, depois do incêndio, como em devaneio, pessoas em busca de informações e outras querendo ajudar, em meio a viaturas de forças de segurança, disse em relato ao juiz Orlando Faccini Neto.

O magistrado perguntou se ele conseguiria descrever o que viu dentro da boate e se ainda havia possibilidade de encontrar pessoas com vida quando entrou no local.

"Não, não tinha mais. Eram só as vítimas", disse com a fala entrecortada pelo choro. "Não tem como relatar, doutor. É difícil relatar. É uma imagem muito forte. Até para um profissional de segurança é muito forte. Não tem condições, eu até preferia não descrever isso".

O coronel é a 23ª pessoa ouvida no júri que já dura sete dias, em Porto Alegre, e se tornou agora o mais longo do Judiciário gaúcho, passando o do caso do menino Bernardo Boldrini, em 2019. Atualmente, ele é diretor do departamento administrativo do Corpo de Bombeiros, na capital gaúcha.

Quatro réus são acusados por homicídio e tentativa de homicídio simples por dolo eventual —Elissandro Spohr e Mauro Hoffmann, sócios-proprietários da boate, e os integrantes da banda, Marcelo de Jesus dos Santos (vocalista) e Luciano Bonilha Leão (assistente de palco).

Pereira contou que foi responsável por organizar as operações logo após a tragédia. Ele disse que, quando recebeu a notícia do incêndio, achou que era algo que fugia da normalidade, mas, quando foi informado que haveria cerca de 30 mortos, a situação ficou mais tensa — no fim, ele disse que encontrou cenário ainda mais difícil do que imaginava.

Para o bombeiro, as pessoas morreram de maneira instantânea dentro da Kiss, apontando entre as principais causas asfixia mecânica (pela compressão contra outros corpos) e asfixia tóxica, especialmente pela inalação da fumaça.

"De uma coisa eu tenho certeza, não foram vítimas de incêndio, porque o incêndio carboniza", afirmou.

"Foi da inalação do gás emitido por aquela espuma que incendiou no dia, parece que composta de cianeto, um gás letal conhecido historicamente muito empregado nos campos de concentração, no período nazista", pontuou se referindo às asfixias tóxicas.

Ele disse não saber precisar qual foi exatamente a origem do incêndio e explicou que extintores podem falhar por problemas de recarga, mas também por desconhecimento do uso correto.

Durante o depoimento, o coronel chegou a afirmar que suas filhas poderiam estar na Kiss no dia do incêndio. Por isso, o advogado Jader Marques, da defesa de Elissandro Spohr, perguntou ao militar se ele considerava a boate um lugar seguro.

"Eu acreditava que a boate tinha segurança porque ela tinha um alvará, por mais que tivesse sido alterada a configuração, o que invalidaria ele. Eu não teria problema nenhum, mas a gente sempre fica com coração apertado, porque as tragédias acontecem", respondeu Pereira, que foi convocado para depor pelo próprio Marques.

Questionado sobre os processos movidos contra os bombeiros ligados ao caso, ele afirmou que muitos precisaram de tratamento, inclusive, psiquiátrico — o próprio coronel disse ter sofrido com estresse pós-traumático.

O coronel falou também sobre o processo a que ele mesmo respondeu, por fraude processual, envolvendo um documento que apontava a capacidade de boate de 691 pessoas. Ele foi condenado, mas a pena acabou prescrita e o processo foi extinto.

Outras duas pessoas foram ouvidas nesta terça até o momento, o sonorizador Venâncio da Silva Anschau e a arquiteta Nivia da Silva Braido.


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