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Nome defendido por Lula para Senado no RJ tem trânsito com bolsonaristas

Por Folha de São Paulo

15/05/2022 16h02 — em
Política



RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - O presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), André Ceciliano (PT), recebia no ano passado em seu sítio em Mendes (RJ) o deputado federal bolsonarista Otoni de Paula (MDB-RJ) quando o convidado precisou usar a rede wi-fi da casa, localizada num ponto em que o sinal das companhias telefônicas não pega.

"Disse a ele a senha: Lulameupresidente", contou à Folha, rindo, Ceciliano.

"Preferi continuar sem internet", disse Otoni.

O episódio sintetiza as aparentes contradições do pré-candidato ao Senado do PT no estado: devoção a Lula e trânsito, considerado por alguns excessivo, com políticos bolsonaristas.

Filiado há 26 anos ao PT, único em sua trajetória política, ele também acumula punições da sigla por posicionamentos que destoam da orientação do partido.

O perfil pouco ideológico é o que provoca resistência na militância petista e, ao mesmo tempo, o aproxima de Lula.

"O que é a esquerda hoje? Defender a saúde, a educação, a cultura como uma forma de mudar a vida do sujeito. Essa coisa de esquerda e direita", afirmou Ceciliano, encerrando a reflexão com uma careta em sua sala na Alerj.

"Na Baixada Fluminense, o sujeito vota em você porque conhece a sua história, a história de sua família. Não é porque você é de esquerda ou direita que ele vai votar. Lá a realidade é diferente. Pé no chão, pé na lama. Gente passando necessidade, fome, falta de emprego."

Ceciliano foi prefeito por duas vezes de Paracambi, cidade de 50 mil habitantes na Baixada Fluminense em que cresceu. Foi lá que se aproximou da política e do PT.

O trânsito político no estado foi construído ao longo de seus quatro mandatos como deputado estadual no qual, em todos, fez parte da Mesa Diretora da Alerj.

A presidência da Assembleia caiu em seu colo em 2017, após a doença e posterior prisão do então chefe do Poder Legislativo fluminense Jorge Picciani, morto no ano passado. O substituto imediato, Wagner Montes, morto em 2019, estava licenciado em razão de problemas de saúde, deixando o posto para Ceciliano. Ele acabou eleito para a presidência mais duas vezes.

Ceciliano sofreu censura pública da sigla ao votar favorável à privatização da Cedae e foi suspenso por seis meses por ter pautado o projeto de lei da gestão Luiz Fernando Pezão (2015-2018) que aumentou a alíquota de contribuição previdenciária dos servidores de 11% para 14%.

"Tinha três, quatro meses de atraso dos servidores. Não tinha dinheiro. Imagina se a polícia para de sair dos batalhões? Eu ajudei naquelas votações difíceis e votei", afirma.

Em todos os casos alguns setores do PT pediram sua expulsão. Pesou em seu favor junto à direção da sigla sua fidelidade nos momentos de crise. Na mesma nota em que teve anunciou a suspensão do deputado, a Executiva estadual elogiou o compromisso de Ceciliano com o partido "nos piores momentos".

"Enquanto muitos fugiram com medo de defender o partido junto ao eleitorado e saíram por oportunismo eleitoral, André ficou e defendeu o PT", afirmou a Executiva estadual na ocasião.

A partir de 2018, o alvo deixou de ser o PT para se tornar o próprio Ceciliano. Assessores do gabinete do deputado lideravam em valor as movimentações consideradas atípicas pelo Coaf, cujo relatório gerou o escândalo das "rachadinhas".

Enquanto a movimentação suspeita do gabinete do senador Flávio Bolsonaro (PL) somava R$ 1,2 milhão, a de assessores de Ceciliano atingia R$ 49 milhões. A desproporção passou a ser argumento dos bolsonarista.

Dois anos depois, o Ministério Público do Rio considerou que não havia indícios contra Ceciliano. Flávio foi denunciado, mas as provas anuladas.

O presidente da Alerj também foi um dos alvos de buscas na Operação Tris In Idem, que levou ao afastamento de Wilson Witzel do governo. Ele é investigado sob suspeita de direcionamento de verbas da saúde em troca de apoio político, a partir de delação do ex-secretário de Saúde Edmar Santos.

"No âmbito da Justiça Federal, já foram apresentadas denúncias baseadas na referida delação e eu não fui acusado, por absoluta ausência de elementos minimamente probatórios. O ex-secretário tentou transformar em ato suspeito o que é, na verdade, uma virtude da nossa gestão à frente da Alerj", disse Ceciliano.

O presidente da Alerj e Lula se aproximaram em 2021, e o ex-presidente vem defendendo o nome do deputado para o Senado. Ele trava uma disputa nos bastidores com Alessandro Molon (PSB) sobre quem disputará a vaga na chapa que tem Marcelo Freixo (PSB) como candidato ao governo.

O petista vem se apoiando na pré-campanha numa articulação que envolve prefeitos do interior e deputados estaduais. Ele calcula ter atraído mais de 50 dos 92 chefes municipais do estado para o lançamento de sua pré-candidatura ao Senado, numa casa de shows na Baixada Fluminense.

Alguns de seus apoiadores defendem a reeleição de Jair Bolsonaro. Otoni de Paula, vice-líder de Bolsonaro na Câmara, esteve com o petista em templo da Assembleia de Deus.

"Apesar de estarmos em campos ideológicos opostos, tenho uma relação muito boa com o André", afirmou Otoni.

O petista não esconde a dificuldade em defender Freixo como candidato. Questionado sobre como o defenderia junto ao eleitor, ele disse: "Freixo está na nossa aliança, no nosso campo político, defende o que nós defendemos. Não estou dizendo que o Cláudio Castro não defenda. Vou fazer a defesa do meu candidato."


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