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Variante já ameaça desconfinamento na Inglaterra

Por Folha de São Paulo

14/05/2021 17h35 — em
Mundo



BRUXELAS, BÉLGICA (FOLHAPRESS) - A variante B.1.617.2, identificada na Índia, já preocupa governo, cientistas e população no Reino Unido e pode atrasar a volta da Inglaterra à vida normal. “É cedo demais para dizer como será este verão”, afirmou nesta sexta (14) o premiê britânico, Boris Johnson, em entrevista convocada para alertar o país sobre os novos riscos.

“Essa nova variante pode provocar sérias interrupções na reabertura”, disse o primeiro-ministro. Segundo ele, está mantida a passagem para a etapa 3 —que inclui reabertura de empresas e restaurantes, permissão para receber convidados e a volta de viagens— a partir desta segunda.

Mas, se a B.1.617.2 se mostrar significativamente mais transmissível que os atuais vírus que circulam no país, a passagem para a etapa 4 não será mais no dia 21 de junho, alertou Boris. Segundo ele, além do grau de contágio, também é preciso saber se a variante consegue escapar da proteção das vacinas.

Entre 5 e 12 de maio, quatro pessoas infectadas pela B.1.617.2 morreram na Inglaterra, segundo o governo, e ela foi encontrada em 1.565 doentes. Levantamento da OMS registra que, até 11 de maio, as três versões da variante foram detectadas em amostras de vírus de 44 países, entre eles grande parte dos europeus, a China e toda a América do Norte. Da América do Sul, apenas a Argentina aparece no relatório da entidade.

Os primeiros indícios são de que a B.1.617.2 pode ser até “50% mais transmissível” que a linhagem B.1.1.7, hoje predominante no Reino Unido, de acordo com relatório do Grupo de Aconselhamento Científico para Emergências (Sage). O diretor médico britânico, Chris Whitty, afirmou que ela pode se tornar dominante no país, ultrapassando a linhagem identificada na Inglaterra no ano passado.

Em relação às vacinas, há sinais de que elas sejam eficazes contra a variante indiana, “mas isso está longe de ser claro”, segundo Jonathan Ball, professor de virologia molecular da Universidade de Nottingham.

Segundo ele, "o aparecimento e a disseminação de linhagens que escapem da proteção dos imunizantes são as principais ameaças ao retorno à normalidade”. Ball aponta que uma grande proporção da população britânica ainda não recebeu a segunda dose, “e é provável que muitos desses possam se infectar e potencialmente transmitir o vírus”.

De acordo com o governo, 36% dos adultos já foram completamente imunizados e outros 32% receberam a primeira dose, até esta sexta. Além disso, 32% da população adulta ainda não recebeu nenhuma das injeções, de acordo com os números do governo. O cronograma prevê que todos os adultos estejam imunizados no final de julho.

“A corrida entre a vacinação e as variantes está ficando mais apertada”, disse Boris, ao anunciar que o intervalo entre a primeira e a segunda dose será reduzido de 12 para 8 semanas para os que têm 50 anos ou mais e os portadores de comorbidades. O objetivo é "acelerar a proteção adicional”.

A antecipação da segunda dose faz sentido, diz Ball, porque “há um risco potencial de o vírus adquirir mais mutações, especialmente se continuar a se espalhar em uma população parcialmente imune”.

Boris disse que o avanço da vacinação deixa o país agora em melhor situação que a do final do ano passado, quando a B.1.1.7 se alastrou pela Inglaterra, provocando o caos nos hospitais e precipitando um novo confinamento no começo deste ano.

De acordo com Jonathan Ball, “manter o controle sobre a propagação dessa variante não vai ser fácil”. O professor de virologia disse esperar que as vacinas minimizem o impacto da B.1.617.2. Ele diz que, caso a variante não seja contida, não haverá outra opção a não ser impor um novo confinamento na Inglaterra.

Em outra entrevista também na tarde desta sexta, a líder técnica para Covid-19 da OMS (Organização Mundial da Saúde), Maria van Kerkhove, afirmou que “a pandemia ainda não terminou e as variantes provocam muita incerteza”.

Assim como o governo britânico, a OMS classificou nesta semana a B.1.617 como “variante de preocupação”, o que indica que ela tem potencial para afetar testes, tratamentos ou vacinas, e por isso precisa ser acompanhada de perto.

Cálculos do Sage anteriores ao alerta causado pela variante indiana já previam que mais circulação durante o verão trouxesse nova onda em agosto, mas bem menor que a do final do ano passado. De acordo com os cientistas, porém, as curvas de crescimento da nova linhagem se parecem muito com as da variante inglesa quando começou a ser detectada, o que é preocupante.

Na semana passada, o Sage recomendou ao governo que considerasse prioridade conter a variante indiana, porque, se ela se mostrar muito mais transmissível, isso pode provocar “uma onda de infecções muito significativa, potencialmente maior do que a observada em janeiro de 2021”.

De acordo com cálculos feitos pela Universidade de Warwick, se a nova variante for 50% mais contagiosa, as hospitalizações diárias podem chegar a 10 mil sem um novo confinamento —para comparação, nesta sexta o governo registrava cerca de 1.000 doentes de Covid-19 internados.

Outra estimativa, feita pela Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, diz que, sem medidas de contenção, uma transmissibilidade 50% maior poderia provocar um novo pico de até 1.000 mortes diárias —a média atual é 10/dia.

O risco de caos hospitalar e mais mortes existe mesmo com o avanço da imunização, de acordo com os cientistas, porque, além de nem todos estarem vacinados, as vacinas não são 100% eficazes.

Boris, que na segunda (10) havia anunciado uma “nova fase, em que o governo não precisa mais determinar o que pode ou não ser feito”, disse nesta sexta esperar que as pessoas “tomem boas decisões, bem informadas sobre os riscos” e pediu "extrema cautela" antes de aproveitar a nova liberdade de viajar ou encontrar amigos e parentes: "O que fizermos agora terá sérias consequências no futuro”.

O premiê discordou de que tenha sido precipitada a passagem para a terceira fase num momento em que a variante indiana já era considerada de preocupação —esse é um dos quatro critérios estabelecidos pelo governo para avançar com o desconfinamento.

Segundo Boris, os baixos números da epidemia no total do país permitem esse passo. “Farei tudo para segurar esse vírus. Mas, se o sistema de saúde ficar em risco, reagiremos a tempo”, afirmou. O governo vai reforçar o atual esquema de dois testes gratuitos por semana para tentar identificar novos focos rapidamente e bloqueá-los.

Os focos de B.1.617.2 estão no momento concentrados no noroeste inglês, em Bolton (Grande Manchester) e Blackburn (condado de Lancashire), onde o número de novos casos de Covid-19 “subiu rapidamente nos últimos 15 dias”, segundo Witty.

Os dados mostram que a transmissão está ocorrendo principalmente entre os com menos de 60 anos, e há duas hipóteses para isso, de acordo com o diretor médico. A primeira é que o contágio comece pelos mais jovens, que circulam mais, encontram mais pessoas e se expõem mais ao risco, e que ainda vá chegar aos mais idosos.

A segunda hipótese é que a vacinação completa esteja protegendo os mais velhos da variante. “É muito cedo para dizer. Teremos que observar o que acontece nas próximas duas ou três semanas”, afirmou ele. O governo vai colocar o Exército para distribuir testes nas regiões afetadas e reforçar a vacinação e as campanhas para aumentar a adesão da população.

Em pesquisa do YouGov divulgada nesta sexta, 69% da população inglesa disse estar preocupada com a variante indiana, incluindo 22% que estão “muito preocupados”. Disseram não se preocupar 27%.

Apesar da nova variante, 44% consideram que 21 de junho é o momento certo para encerrar as restrições contra a Covid-19. São 33% os que acham que pode ser cedo demais para isso.

A variante indiana também afetou os planos de abertura do governo escocês, que adiou em ao menos uma semana o relaxamento de restrições em Glasgow —uma das mais movimentadas do país, a cidade viu um crescimento recente no número de novos casos.


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