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Brasil argumenta na OMC que tarifaço é inconsistente com obrigações dos EUA

Por Folha de São Paulo

11/08/2025 16h30 — em
Economia



BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O governo Lula (PT) argumentou que o tarifaço imposto pelos EUA contra o Brasil é inconsistente com obrigações assumidas pelos americanos no âmbito da OMC (Organização Mundial do Comércio), entre eles o teto tarifário da entidade e um princípio de não discriminação entre países.

Em 6 de agosto, o Brasil acionou os EUA na OMC contra as tarifas recíprocas aplicadas em abril e contra a sobretaxa de 40% anunciada por Donald Trump em julho -o que deixou o país com um índice de 50%, um dos maiores do mundo.

A OMC publicou nesta segunda (11) a carta na qual o Brasil pede consultas à missão dos EUA na OMC, o primeiro passo da ação.

Na prática, o governo Lula argumenta que o tarifaço americano descumpre três regras do sistema internacional de solução de disputas comerciais.

Primeiro, viola a cláusula da nação mais favorecida, pela qual eventuais vantagens comerciais que um país confere a um sócio deveriam ser estendidas aos demais parceiros.

"[...] ao isentar certos parceiros comerciais dos EUA da aplicação de tarifas adicionais, enquanto impõem essas tarifas adicionais a determinados produtos brasileiros, os Estados Unidos deixam de estender imediata e incondicionalmente aos produtos do Brasil uma 'vantagem, favor, privilégio ou imunidade' concedida pelos Estados Unidos 'no que diz respeito a direitos aduaneiros e encargos de qualquer natureza impostos sobre ou em conexão com' a importação de produtos similares originários do território de outros membros da OMC", diz o governo Lula na carta.

Outro ponto questionado pelo governo Lula é que, ao aplicar uma sobretaxa de 50% sobre o Brasil, os EUA extrapolam o nível tarifário que eles mesmos tinham se comprometido a respeitar na OMC.

Por último, o Brasil aponta que os EUA não recorreram ao rito de solução de controvérsias da OMC para lidar com suas queixas comerciais com o Brasil.

"Os Estados Unidos agem de forma inconsistente com o Artigo 23.1 do ESD [Entendimento de Solução de Controvérsias], ao buscar reparação por supostas violações de obrigações ou por outra anulação ou prejuízo de benefícios previstos nos acordos abrangidos por meio de medidas tarifárias, em vez de recorrer às regras e procedimentos do ESD."

"O Brasil aguarda com expectativa a resposta dos Estados Unidos a este pedido e a definição de uma data mutuamente conveniente para a realização das consultas", diz a carta.

Apesar da alta probabilidade de não ter efeito prático, já que a consulta solicitada pelo Brasil precisa ser aceita pelos americanos e a última instância da OMC está paralisada, o movimento na OMC é visto no Palácio do Planalto como um gesto simbólico importante para marcar posição do Brasil em defesa do sistema multilateral de solução de disputas comerciais.

Por meio das consultas na OMC, quem reclama solicita a outro informações sobre as práticas alegadamente comerciais e requer modificações das medidas.

Os EUA, porém, precisam aceitar o pedido para o início das conversas. Se as consultas não resolverem a disputa em 60 dias após o recebimento do pedido, o demandante pode pedir a instauração de uma segunda etapa: um painel.

Os painéis são formados por três membros, escolhidos de comum acordo pelas partes. Os dois países apresentam petições escritas e participam de audiências. O painel emite um relatório sobre as medidas em contestação e sua compatibilidade com acordos da OMC.

O prazo teórico para a apresentação desse relatório é de até seis meses, prorrogáveis por mais três. Na prática, a fase de painel tem durado cerca de 12 meses -a não ser em casos de maior complexidade, que podem se arrastar por até cinco anos. Em um caso como o brasileiro, especialistas estimam cerca de 18 meses, fora o tempo de um eventual recurso americano.

O país derrotado no relatório do painel pode entrar com recurso, dando início a uma terceira e última etapa: uma contestação no Órgão de Apelação. O colegiado pode manter, modificar ou reverter as conclusões de um painel e a decisão é de implementação obrigatória pelos países-membros, devido a compromissos assumidos com a OMC por meio de suas respectivas legislações.

O problema é que essa última instância está paralisada desde 2019 graças aos EUA. Trump anunciou em agosto de 2017 (durante seu primeiro mandato) que não fecharia acordo para preencher as vagas do colegiado.

Com isso, até hoje mais de 20 decisões de painéis na OMC foram apeladas "no vácuo". Isso significa que a instituição não pode tomar decisões finais caso um país conteste resultados de instâncias anteriores.


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