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Trina Robbins, 1ª mulher a ilustrar Mulher-Maravilha, defende HQs politizadas

Por Folha de São Paulo

04/12/2020 13h34 — em
Variedades



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - "Que bom", diz Trina Robbins ao saber que Marcelo Crivella, o prefeito que tentou censurar uma história em quadrinhos na Bienal do Livro do Rio de Janeiro, não foi reeleito.

"Isso é ridículo", diz sobre o episódio, que foi motivado por um título de HQ de super-heróis que retratava um beijo entre dois homens.

Aos 82 anos, Robbins é uma quadrinista veterana que faz jus à alcunha de precursora que costuma receber. A artista feminista foi a primeira mulher a ilustrar uma HQ da Mulher-Maravilha, em 1986.

Antes disso, em 1970, Robbins fez parte do primeiro gibi 100% feito por mulheres, o "It Ain't me Babe" -- a capa mostra personagens clássicas como a Mulher-Maravilha, Luluzinha e Olivia Palito com os punhos em riste e a cara fechada, revoltosas.

Também foi precursora ao criar uma personagem LGBT, em 1972, em "Sandy Comes Out", ou Sandy sai do armário, uma breve história sobre uma mulher feminista que se assume lésbica. A história fez parte da antologia feita por mulheres "Wimmen's Comix", da qual Robbins foi uma das fundadoras, e que durou de 1972 a 1992.

Fica claro que, em sua trajetória, política e HQs sempre conversaram bastante uma com a outra.

Nos últimos anos, a cultura pop tem tocado, cada vez mais, em temas como racismo, homofobia e machismo, ao passo que a demanda por diversidade na indústria do entretenimento começa a ser atendida pontualmente por peixes grandes como a premiação do Oscar, que criou exigências, dentro e fora dos sets de produção, quanto à presença mínima de pessoas negras, latinas e mulheres.

Como toda ação gera uma reação, não é raro observar nas redes sociais reclamações de pessoas que querem erguer um muro entre política e entretenimento, separando cada coisa de um lado.

"Se você tira o teor político do entretenimento, então sobra o quê? Animaizinhos engraçados?", pergunta Robbins. Segundo ela, a cultura pop, ainda que ficcional, diz respeito ao mundo em que vivemos. E, sendo assim, fica difícil não falar de política.

A quadrinista americana é uma das presenças da CCXP de 2020. Ela já veio ao Brasil, mas desta vez conversará com os brasileiros de sua sala de estar, em San Francisco, no estado americano da Califórnia. A participação dela será nesta sexta, às 17h.

Nas outras vezes em que veio ao país, ela conta que conheceu quadrinistas brasileiras e que se surpreendeu ao saber que, quando eram crianças, essas mulheres tinham lido suas HQs da Mulher-Maravilha, nos anos 1980 e 1990. A surpresa de Robbins veio por dois motivos. Primeiro, porque ela não sabia que os títulos tinham sido traduzidos para o português brasileiro. Segundo, ela diz que nunca ganhou royalties da DC Comics por essas versões traduzidas.

Nos últimos anos, Robbins tem se dedicado ao ofício de historiadora da presença feminina no mundo dos quadrinhos. Em janeiro, lança nos Estados Unidos o livro "Gladys Parker: A Life in Comics, A Passion for Fashion", sobre uma quadrinista americana que fez sucesso nos anos 1930 que era apaixonada por quadrinhos e por moda, assim como Robbins.

Se Robbins fazia barulho com o "Wimmen's Comix" nos anos 1970, foi só perto da virada do século que houve uma maior oferta de quadrinhos para mulheres e maior percepção do público feminino como leitorado. Ela aponta dois principais motivos.

O primeiro é a internet, que permitiu que mais pessoas conversassem entre si e que mais vozes fossem ouvidas, diz Robbins. A segunda é a onda dos mangás japoneses que chegou aos Estados Unidos, onde "Sailor Moon" foi um sucesso.

"A indústria dos quadrinhos sempre foi dominada por homens. Então as HQs miravam nos meninos, com histórias de heróis musculosos e queixudos trocando socos. De fato, foi só na virada do século que a indústria percebeu que meninas também gostam de quadrinhos", ela diz. "A questão é que, se não tem HQs para meninas lerem, então elas não vão ler HQs."

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