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Três anos após tragédia, adoecimento mental preocupa Brumadinho (MG)

Por Folha de São Paulo

25/01/2022 16h05 — em
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CONSELHEIRO LAFAIETE, MG (FOLHAPRESS) - Três anos após o rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, da mineradora Vale, a população de Brumadinho, em Minas Gerais, ainda lida com os transtornos psicológicos deixados pela tragédia.

Segundo levantamento da prefeitura da cidade, o consumo de medicamentos ansiolíticos e antidepressivos cresceu na cidade desde a tragédia. Em 2021, o uso desse tipo de remédio foi 31,4% maior que em 2018, ano anterior ao rompimento da barragem.

Em 2018, antes da tragédia, foram distribuídos, em média, 68.918 comprimidos desse tipo de medicamento por mês. Em 2019, quando aconteceu o rompimento da barragem, foram 82.282 unidades por mês. No ano de 2020 esse número subiu para 90.790. Em 2021, foram distribuídos 90.598 comprimidos ao mês na cidade.

Para alguns medicamentos, como a sertralina, utilizada no tratamento de depressão, a distribuição teve um aumento de 103% em 2021, em relação a 2018. O número de comprimidos distribuídos por mês passou de 10.807 unidades em 2018 para 22.043 em 2021.

Os dados foram levantados pela Secretaria de Saúde de Brumadinho com base na distribuição de medicamentos por meio da rede pública municipal de saúde.

Maria Regina da Silva perdeu a filha, Elen Silva, na tragédia. Para ela, o cuidado psicológico e o uso de medicamentos foram importantes para conseguir manter a saúde mental.

Ela acredita que enquanto não houver um julgamento dos responsáveis pela tragédia ainda será difícil superar o ocorrido. "Lidar com luto não é fácil. Para nós, é como se aquele crime se repetisse todos os dias", afirma ela.

Maria Regina faz parte da diretoria da Avabrum (Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos). O grupo criou um memorial para honrar as vidas perdidas e lembrar a sociedade do que aconteceu em Brumadinho em janeiro de 2019.

Outro elemento de atenção são os casos de tentativa de suicídio e automutilação. Em 2018, foram registrados 27 casos na cidade. Nos anos seguintes, houve um aumento nesse tipo de ocorrência, sendo registrados 50 casos em 2019, 47 casos em 2020 e 146 casos em 2021.

De acordo com Eduardo Callegari, secretário de saúde de Brumadinho, os casos de violência doméstica e familiar também aumentaram nos últimos anos. Além disso, o consumo de álcool e drogas é outro ponto de atenção para a administração da cidade.

"O impacto da tragédia é muito mais amplo e duradouro do que as pessoas imaginam", afirma Callegari.

De acordo com a psicóloga Aline Dutra de Lima, por ser algo inesperado para a população, esse tipo de tragédia pode fazer com que pessoas que lidam com problemas psicológicos tenham momentos de crise intensificados.

Aline coordenou a equipe de psicólogos da ONG NaAção em Brumadinho após o rompimento da barragem. Em sua atuação ela também percebeu o aumento das tentativas de suicídio e do índice de medicalização da população de Brumadinho.

Segundo ela, após um tempo, as pessoas começam a voltar a suas vidas normais, mas esse processo pode ser lento devido ao luto envolvido.

A ONG desenvolveu ações como fornecimento de terapia e grupos terapêuticos, oficinas e cursos profissionalizantes para a população. Segundo a psicóloga, um fator que ajuda na superação desse tipo de situação é a união da comunidade em um sentimento de retomada.

Além disso, outro elemento importante, e muitas vezes negligenciado pelo poder público e pelas pessoas, é a prevenção da saúde mental.

"Falta incentivo para a prevenção. Infelizmente, não tem em grande escala. Ainda existe um preconceito muito grande em relação à saúde mental e à busca por ajuda de psicólogos e psiquiatras", afirma Aline.

Desde o rompimento da barragem, em janeiro de 2019, a prefeitura também ampliou os atendimentos psicológicos e psiquiátricos na cidade. Os serviços são disponibilizados em todas as unidades de saúde da família, bem como nos centros de atenção psicossocial. "Ampliamos o número de profissionais na rede, para conseguir atender a demanda do município. A gente não tem uma previsão de quando vai conseguir controlar essa situação no município porque as pessoas ainda sentem isso até hoje. E não apenas as pessoas que perderam familiares, de certa forma, atingiu a cidade como um todo", afirma o secretário de saúde.

O levantamento sobre o uso de medicamentos controlados é utilizado como uma forma de monitoramento da situação. Segundo a prefeitura, não há pretensão de redução desses serviços. De acordo com o secretário, apesar do aumento na demanda, a prefeitura tem conseguido manter o fornecimento das medicações com recursos próprios.

Segundo ele, um exemplo para as ações de atenção à saúde mental é a cidade de Mariana, que mais de seis anos após o rompimento da barragem ainda demanda cuidados com a assistência psicológica da população.


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