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Falar sobre política na sala de aula é inevitável, dizem especialistas

Por Folha de São Paulo

02/07/2022 11h35 — em
Variedades



SÃO PAULO, SP, E SALVADOR, BA (FOLHAPRESS) - Enquanto mais da metade dos brasileiros diz que professores devem evitar falar de política, de acordo com pesquisa Datafolha, especialistas em educação apontam que discutir o tema é inerente ao processo educativo.

Para Ronai Rocha, doutor em filosofia e professor aposentado da UFSM (Universidade Federal de Santa Maria), o assunto não deve ser censurado. Ele diz que, tanto a política em seu sentido amplo, aquele ligado à interação cotidiana das pessoas, quanto a política partidária podem ser temas de discussão, mas os professores não devem impor suas opiniões pessoais.

O pensamento de Rocha vai na contramão dos 56% dos brasileiros que concordaram com o veto do tema na sala de aula. Ainda segundo a pesquisa Datafolha, a maioria das pessoas (54%) acredita que os pais devem ter o direito de proibir as escolas de ensinar temas que não aprovam.

Melquisedec Ferreira, professor, formado em ciências sociais, concorda que a política não deve ser censurada em sala. Para ele, todo ensino, mesmo o que busca ser apartidário e livre de doutrinações, assume viés ideológico.

"O professor, em qualquer aula que fale sobre um fenômeno político, tem de apresentar o maior número possível de abordagens, porque aí é o próprio aluno quem define o que é mais razoável."

A política em sala de aula é alvo recorrente de críticas por parte de movimentos de direita, que afirmam existir um projeto de doutrinação de esquerda dentro das escolas.

Na opinião de Ilona Becskeházy, doutora pela Faculdade de Educação da USP e ex-secretária de educação básica do MEC, de fato há uma dominância de temas que interessam à esquerda.

"Acho que [em razão disso] há uma forte reação das famílias que, durante a pandemia, tiveram a oportunidade de ver o que se passa em sala. Vamos ver se a escola é democrática quando várias visões puderem conviver nas instituições de ensino", diz ela.

Para Ronai Rocha, política e educação sempre se relacionaram na história do Brasil. Segundo ele, houve momentos em que o país apostou em um maior tecnicismo para garantir a expansão da rede de ensino, como na década de 1960, e momentos em que, ao contrário, investiu numa perspectiva politizada.

Para o doutor em filosofia, a partir do final dos anos 1970, houve uma excessiva politização na educação brasileira, que permanece até hoje.

"Eu acho que é por isso que há um movimento forte de compensação [contra a política na sala de aula]", diz. Ainda assim, o pesquisador defende que eventuais excessos de professores devem ser avaliados internamente pela diretoria das instituições.

Nora Krawczyk, pesquisadora na área de sociologia e política educacional e professora da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), lembra que a política perpassa a vida de todos, inclusive no contexto escolar.

"Aristóteles diz que somos todos animais políticos. O que ele quer dizer? Que somos capazes de pensar e realizar o bem comum", diz. "Todos têm direito de ir à escola e se expressar nela. Nesse sentido, podemos dizer que a escola é uma instituição política, porque possibilita a emancipação do sujeito."


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