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Copacabana virou um ponto de guerra, diz moradora do bairro

Por Folha de São Paulo

06/12/2023 19h00 — em
Variedades



RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Uma moradora que reside há 60 anos em Copacabana, zona sul do Rio de Janeiro, definiu a região como um ponto de guerra. Ela diz que cada vez mais é comum ver grupos de criminosos cercando as pessoas e cometendo roubos em plena luz do dia.

A reportagem andou no bairro na tarde desta quarta (6) e não viu reforço no policiamento, mesmo após as cenas de violência em que grupos saíram à caça de supostos assaltantes. Alguns utilizavam soqueiras de metal e tacos de beisebol.

Em nota, o governo Cláudio Castro (PL) afirmou que "ficou estabelecido que, além da melhor distribuição do policiamento, haverá intensificação das abordagens. A missão será cumprida por policiais militares dos batalhões de área e de unidades especializadas, assim como os que integram os programas Copacabana Presente, da Secretaria de Governo, e Rio Mais Seguro, da Prefeitura do Rio, além dos guardas municipais".

A ação dos moradores contra supostos criminosos foi articulada pelas redes sociais e desencadeada após um roubo no domingo (3), quando um empresário foi agredido após tentar socorrer uma mulher.

"Quem tenta fazer justiça com as próprias mãos é tão criminoso como quem rouba ou atenta contra a vida da população. A polícia está nas ruas e pronta para fazer o papel dela, e vamos usar a tecnologia como aliada. Já são mais de R$ 2 bilhões investidos na segurança pública pela gestão e continuaremos combatendo as ações de grupos criminosos", afirmou o secretário de segurança pública do RJ, Victor Cesar dos Santos.

Em 19 de novembro, um fã da cantora Taylor Swift foi morto a facadas nas areais da praia de Copacabana. Gabriel Mongenot Santana Milhomem Santos, 25, foi vítima de um latrocínio. Dois dos três suspeitos do crime haviam sido presos por furto e soltos em audiência de custódia horas antes.

O autônomo Thiago Rothstein, 34, mora desde que nasceu em Copacabana, mas não se sente seguro. "Aqui em casa a gente vive com medo, pensamos duas vezes antes de sair com relógio, cordão, celular. Está cada dia pior, nada se resolve e a gente que fica refém disso tudo", afirmou.

Por causa dos recentes episódios de violência na região, a produtora de eventos Thaís Castro, 32, disse que planeja se mudar do bairro.

"Copacabana está um caos. Eu sinto que está pior do que nunca. Não temos liberdade de ir e vir, não podemos pegar o celular na rua. Nessa época sempre acontece isso, mas esse ano eu acho que piorou. Preciso ir na rua e só sinto medo", afirmou.

Também com medo de ser roubada, a jornalista Tatiana Alcântara, 32, passou a adotar estratégias para conseguir usar o celular na rua. "Eu sempre presto atenção, evito usar o celular, mas agora não ouso nem pegar com medo de alguém roubar. Quando preciso falar, entro em alguma loja, uso o telefone, guardo e saio", disse.

Sobre a ação dos grupos chamados de justiceiros, Tatiana afirma que "moradores estão de saco cheio [dos roubos]". "Quando converso com meus vizinhos sobre isso, não vejo ninguém contra essas atitudes dos justiceiros", disse.

Segundo especialistas, a ação é ilegal. "O ato de fazer justiçamento com as próprias mãos é considerado como crime de exercício arbitrário das próprias razões, previsto no artigo 345 do Código Penal", disse o advogado criminalista Reinaldo dos Santos de Almeida.

Ainda de acordo com Almeida, "e detenção para o crime varia de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência utilizada, como ameaça, lesão corporal ou homicídio tentado ou consumado, por exemplo".

Para o advogado, a descrença da população com a capacidade do Estado de garantir a segurança, especialmente no Rio de Janeiro, é um dos fatores que contribuíram para a ação do grupo contra os supostos criminosos.

O também criminalista Carlos Fernando Maggiolo diz que quem participa dessas ações pode ser enquadrado em associação criminosa, com pena de até três anos de prisão. "Como os encontros dos justiceiros são marcados através das redes sociais, fica fácil para a acusação provar a associação. Além disso, podem responder por lesão corporal, constrangimento ilegal, ameaça e até homicídio, se houver morte decorrente dessas ações", disse.

ENCONTROS SÃO MARCADOS EM GRUPOS DE CONVERSA

Em áudios enviados em um grupo de moradores, um homem fala que é preciso saber identificar supostos ladrões que agem em Copacabana.

"O bagulho é usar a inteligência para saber em quem vai bater, porque às vezes o moleque é do Morro do Chapéu [na zona sul] e está aqui na praça do Lido [em Copacabana], de boa, saindo do futebol. Tem que fazer da forma certa para não dar ruim para ninguém".

"A parada é arrumar uns morteiros bons e jogar dentro do ônibus para virar saco de pipoca. Aí eles vão saindo. Essa que é a boa. É só eles descerem que a gente faz uma massagem bem dada. Tem que ser bonde mesmo, para eles verem que a gente está de bonde também. Nem na maioria eles vão ganhar de nós. É papo de 50 contra 20, e a gente amassar eles".

No mesmo grupo, outro homem responde: "Quem passar pelo nosso grupo vai entrar na porrada. Está na hora de todo mundo pegar esses 'cracudos' estão debaixo das nossas casas na Carvalho de Mendonça, na Inhangá, e meter a porrada para espantar todo mundo. Porque no final das contas esses caras se misturam com os outros para se aproveitar. O ladrão se junta com o cracudo que dá assistência para o ladrão. Está todo mundo envolvido e todo mundo tem que entrar na porrada".


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