Câmara de Curitiba marca votação que pode cassar mandato de única vereadora eleita pelo Psol
CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) - A Câmara de Curitiba deve votar nesta terça-feira (18) o parecer da Comissão Processante que defende a cassação da Professora Angela, vereadora em primeiro mandato e única eleita pelo Psol na história da Casa. Ela é formada em história e é professora licenciada da rede pública estadual de ensino.
Os autores da representação contra ela, os vereadores Da Costa do Perdeu Piá (União Brasil) e Bruno Secco (PMB), viram apologia a uso de drogas em uma cartilha sobre redução de danos para pessoas em situação de dependência química que foi distribuída durante uma audiência pública organizada pela parlamentar no mês de agosto.
Ela classifica a representação como um ataque covarde articulado por forças conservadoras.
A vereadora tem repetido que a política de redução de danos é uma estratégia de saúde pública para que as pessoas não sejam expostas a riscos adicionais, além daqueles gerados pelo uso de drogas.
"É uma abordagem que trata o uso abusivo de substâncias como uma questão de saúde pública, e não um caso de polícia", diz sua defesa apresentada à Comissão Processante. Ela cita ainda a portaria 1.028, de 2005, do Ministério da Saúde, que é considerada um ponto de partida formal sobre a política.
Na cartilha, há orientações sobre uso de petrechos, como canudos próprios para cocaína e não cédulas de dinheiro, e "cachimbos de vidro ou materiais não-metálicos" se for usar crack, por exemplo. Também há recomendações como "não prenda a fumaça nos pulmões", no caso da maconha, e "evite usar se estiver com problemas emocionais ou psicológicos", no caso do cogumelo ou do LSD.
O título do material impresso era "Apologia Ético-Cuidadora de Redução de Danos" e ficou disponível durante uma audiência pública cuja tema era "Sistema de Segurança Pública, Saúde e Política de Drogas".
O relator do caso na comissão, Olimpio Araujo Junior (PL), afirmou que o debate sobre políticas de drogas é "legítimo em ambiente democrático e próprio do Parlamento", mas apontou problemas no conteúdo e na divulgação da cartilha.
Ele destaca, por exemplo, que a cartilha foi concebida e produzida pelo gabinete da vereadora, com a participação de servidores comissionados, sem validação técnica ou supervisão de órgãos que pudessem verificar se o conteúdo seguia adequadamente as diretrizes do SUS.
Ele também entende que houve impacto institucional, com repercussão pública negativa e a associação direta do material à Câmara.
Já a defesa da vereadora afirma que a intenção nunca foi divulgar o material amplamente e que isso só foi provocado pelos próprios autores da representação, que levaram o assunto para suas redes sociais.
"Se houve danos à imagem da Câmara, se deu pela descontextualização e massificação do ocorrido por personagens que agem como se a função pública fosse antes a posição de um influenciador do que de alguém compromissado com o debate público de qualidade", diz trecho da defesa da parlamentar.
"Foram impressas somente 3.000 cartilhas, das quais apenas 133 foram efetivamente distribuídas, em vista de um recolhimento por parte da denunciada para que a situação pudesse ser devidamente esclarecida. Dessas cartilhas distribuídas, 37 foram para os próprios vereadores, em tentativa de desmentir afirmações caluniosas feitas em plenário e esclarecer o real intento do material, que era informar e educar", continua a defesa.
Já os autores da representação contra a parlamentar alegam que "é inadmissível que um parlamentar se valha da estrutura desta Casa, sustentada pelo povo, para promover de forma tão escandalosa a apologia a drogas ilícitas, atentando contra a confiança que a população deposita na instituição".
Em seu parecer, o relator entende que houve quebra de decoro parlamentar por parte da vereadora, e seu voto foi endossado pelos demais membros da Comissão Processante, Renan Ceschin (Pode) e Zezinho Sabará (PSD). Agora, o assunto segue para o plenário da Câmara, onde a perda do mandato precisaria ter o aval de pelo menos dois terços dos membros da Câmara, ou seja, 26 votos, de um total de 38.
Na atual legislatura, 15 partidos têm representantes na Casa e a maioria das siglas são de direita ou centro-direita, formando a base de apoio ao prefeito Eduardo Pimentel (PSD) e ao vice Paulo Martins (PL). As legendas PT, PSB, PDT e Psol somam apenas sete vereadores no total.
Na legislatura anterior, partidos de esquerda e de centro-esquerda também eram minoria e não conseguiram impedir a cassação do então vereador Renato Freitas (PT), hoje deputado estadual.
Freitas foi cassado por quebra de decoro parlamentar após participar de uma manifestação que avançou para dentro da Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos de São Benedito, em fevereiro de 2022. Eles protestavam contra os assassinatos no Rio de Janeiro do congolês Moïse Mugenyi Kabagambe e de Durval Teófilo Filho, dois homens negros, de 24 e 38 anos.
Angela Alves Machado, conhecida como Professora Angela, foi eleita no ano passado com 6.294 votos. A defesa da vereadora afirma à Comissão Processante que seu mandato foi conquistado por movimentos sociais e grupos políticos que tradicionalmente não estão representados no Legislativo curitibano e que "seu posicionamento político não pode ser desqualificado por ser diferente".
"Gostem os seus colegas ou não, seu mandato é fruto de uma legítima expressão democrática popular e está calcado sob a mesma legitimidade dos demais", continua a defesa.
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