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Acusação vê tentativa da Backer de anular provas de intoxicação por cerveja

Por Folha de São Paulo

25/05/2022 14h07 — em
Variedades



BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) - A cervejaria Backer aposta na anulação de provas para buscar inocentar seus donos no julgamento por homicídio culposo (sem intenção) de dez pessoas intoxicadas depois de consumirem a bebida Belorizontina, que era produzida pela marca.

O julgamento dos três donos da Backer, Ana Paula Lebbos, Munir Lebbos e Halim Lebbos, começou na segunda-feira (23), cerca de dois anos após os relatos de contaminação. Nesta etapa, que deve terminar na quinta (26), estão sendo ouvidas vítimas e testemunhas convocadas pelo Ministério Público de Minas Gerais, autor de ação criminal contra os donos da cervejaria.

Até a manhã desta quarta (25), foram ouvidas seis testemunhas, entre parentes de mortos e peritos que trabalharam na produção dos laudos que comprovaram a existência de dietilenoglicol nos tanques e garrafas da Belorizontina. A Polícia Civil concluiu que a substância, utilizada para refrigeração das bebidas, entrou indevidamente em contato com o produto por buracos nos equipamentos.

Também foram ouvidas seis vítimas.

Para o advogado Ciro Chagas, assistente da acusação no julgamento, as algumas perguntas que foram feitas pela defesa à perícia indicam uma "estratégia para tentar desconstruir a cadeia de custódia" --termo jurídico que se refere aos procedimentos realizados ao longo de uma investigação para produção de provas.

Segundo ele, as evidências que viraram alvo da defesa dos empresários da Backer são principalmente perícias feitas nos tanques que armazenavam a Belorizontina, na fábrica da cervejaria em Belo Horizonte, e em garrafas da bebida que pertenciam ao mesmo lote das que foram consumidas por quem morreu ou passou mal depois de tomar a cerveja.

As perícias foram feitas pela Polícia Civil e pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Os nomes das testemunhas convocadas não são informados pela Justiça. A imprensa não foi autorizada a acompanhar as audiências na sala em que ocorrem. Sabe-se, no entanto, que dois representantes do ministério já prestaram depoimento. Representantes da Polícia Civil devem falar até quinta-feira (26).

Sobre a estratégia apontada pelo assistente da acusação, a Backer diz que a cervejaria será "intransigente na apuração da verdade". "É natural que questione eventuais inconsistências das perícias realizadas na busca pelo esclarecimento dos fatos", diz a nota.

A estratégia da defesa da Backer foi notada também por outras pessoas que tiveram acesso à sala de audiências na 2ª Vara Criminal do Fórum Lafayette, em Belo Horizonte, ao longo dos últimos três dias. A possível tentativa de anular as provas é indicada pelo grande número de perguntas que os advogados de defesa fizeram sobre como foram feitas as perícias técnicas nos equipamentos e nas garrafas da Belorizontina.

Os primeiros casos de problemas de saúde, que depois foram confirmados como provocados pelo consumo da Belorizontina, começaram a surgir na capital mineira em janeiro de 2020.

No início foram tratados como uma síndrome nefroneural, por terem como características principais distúrbios neurológicos e paralisação no funcionamento dos rins. Depois de troca de informações entre familiares das vítimas e médicos foi identificado como ponto comum entre as pessoas que procuraram hospitais com os sintomas da síndrome o consumo da Belorizontina.

As autoridades foram acionadas e a fábrica da Backer foi interditada. Houve ainda ordem para retirada dos produtos da marca do mercado.

Além dos três donos da Backer, também estão sendo julgados sete funcionários da empresa à época. O total de indiciados era 11, mas um, também empregado da cervejaria, morreu ao longo das investigações.

DEPOIMENTOS

Uma das vítimas que já prestaram depoimento no julgamento dos donos da Backer foi o técnico em segurança da tecnologia Vanderlei de Paula Oliveira, 39. Oliveira bebeu a Belorizontina em 2019. Chegou a ficar três meses internado em CTI (Centro de Terapia Intensiva). Hoje passa por quatro sessões de hemodiálise por semana, além de fazer fonoaudiologia e fisioterapia. Vai ainda iniciar nos próximos dias um tratamento psicológico.

O técnico anda com o auxílio de muletas, apresenta dificuldade de fala e manchas vermelhas na testa. Na saída do interrogatório, no meio da tarde de segunda-feira, no Fórum Lafayette, ele contou que poderia ter feito o interrogatório por vídeoconferência, mas preferiu ir ao tribunal.

"Decidi vir presencialmente, fisicamente, para mostrar todas as cicatrizes que esse veneno causou", disse a repórteres, depois da audiência.

Também já prestou depoimento como testemunha Mirza Quintão, filha de Antonio Marcio Quintão, que morreu em 15 de janeiro de 2020 aos 76 anos. Ele tomou a Belorizontinha nas festas de fim de ano.

"Meu pai estava muito bem de saúde. A morte dele virou a nossa vida de cabeça para baixo. Minha mãe infartou, teve uma infecção na coluna. É algo que você não acredita que pode acontecer", disse Mirza, que tem como advogado Ciro Chagas, assistente da acusação.

O engenheiro metalurgista Luiz Felippe Teles Ribeiro, 39, outra vítima, também foi ouvido. Assim como a família de Mirza, Luiz Felippe tomou a Belorizontina nas festas de fim de ano de 2019.

"Fui internado no dia 26 de dezembro e saí cinco meses depois", contou. Nesse período, passou 82 dias em coma. Hoje tem apenas 50% de funcionamento dos rins, anda com a ajuda de muletas e só consegue ouvir com a ajuda de um implante auditivo.


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