Cientistas encontram anticorpo que "desliga" escudo de câncer de pâncreas e ativa imunidade
Uma descoberta promissora na luta contra o câncer de pâncreas, um dos mais agressivos e de difícil tratamento, acaba de ser anunciada. Pesquisadores da Universidade Northwestern, nos Estados Unidos, desenvolveram um novo anticorpo que se mostrou capaz de reativar o sistema imunológico para atacar e destruir tumores pancreáticos.
O estudo, que combinou análise de dados de pacientes humanos com ensaios laboratoriais em células e testes bem-sucedidos em camundongos, identificou um mecanismo crucial que permite ao câncer "se esconder" das defesas do organismo.
O Mecanismo de evasão desvendado
Os cientistas descobriram que uma proteína, chamada Siglec-10, presente nas células de defesa localizadas dentro dos tumores, se liga a outra proteína, a Integrina $\beta 3\alpha 1$, encontrada na superfície das células cancerígenas.
Essa ligação funciona como um "sinal de não ataque", enganando as células do sistema imunológico e impedindo-as de reconhecer e combater o tumor. Segundo o cientista e imunologista Mohamed Abdel-Mohsen, líder da pesquisa, essa descoberta é relevante por apontar que o mesmo mecanismo que favorece a disseminação do câncer também o ajuda a fugir da vigilância imunológica.
"Ao remover esse sinal de 'não ataque', conseguimos reativar essas células e fortalecer todo o sistema imunológico", explica Abdel-Mohsen.
Quando os pesquisadores utilizaram o novo anticorpo para bloquear essa interação Siglec-10/Integrina $\beta 3\alpha 1$, as células de defesa voltaram a funcionar, reconhecendo e destruindo o câncer de forma eficaz.
O desafio do câncer silencioso
O oncologista Felipe Coimbra, líder do Centro de Referência em Tumores do Aparelho Digestivo Alto do A.C.Camargo Cancer Center, reforça a gravidade da doença, que é conhecida por seu crescimento silencioso. "Em sua fase inicial, [o câncer de pâncreas] apresenta poucos ou nenhum sintoma. Desconforto abdominal leve ou perda de apetite dificilmente levam o paciente a investigar", afirma.
O diagnóstico tardio é a regra. Sinais como icterícia, dor nas costas ou perda de peso inexplicável costumam surgir quando a doença já está avançada.
Coimbra aponta as grandes barreiras no tratamento:
A localização do pâncreas, em uma região profunda do abdome, próxima a vasos e nervos, o que favorece a invasão precoce do tumor.
A alta frequência de mutações (mais de 90% dos casos).
A criação de um "ambiente hostil" pelo tumor, com tecido fibroso e baixa penetração de células de defesa, o que compromete a eficácia dos medicamentos.
O novo estudo de Northwestern também sugere que, embora a mutação Kras seja um alvo conhecido, tratamentos que a bloqueiam isoladamente não são suficientes, endossando a necessidade de abordagens combinadas.
Próximos Passos: Da Bancada ao Paciente
A equipe de Abdel-Mohsen já está empenhada em levar essa nova classe de imunoterapia para a fase clínica. "Nosso plano é concluir testes adicionais em laboratório, garantir a produção do anticorpo em qualidade clínica e avançar para discussões com órgãos reguladores sobre os primeiros estudos em humanos", detalha o pesquisador.
Para o futuro, uma das estratégias mais promissoras é testar o novo anticorpo em combinação com quimioterapias ou imunoterapias já existentes. "Essa estratégia pode gerar uma resposta mais robusta do que qualquer tratamento isolado", conclui Abdel-Mohsen, acendendo uma luz de esperança para pacientes com câncer de pâncreas.
ASSUNTOS: Saúde & Ciência