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Procuradoria abre inquérito civil para investigar suspeita de propina em vacinas na gestão Bolsonaro

Por Folha de São Paulo

23/07/2021 18h36 — em
Política



BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A Procuradoria da República no Distrito Federal abriu inquérito civil sobre o suposto pedido de propina por parte de Roberto Ferreira Dias, ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, caso revelado pelo jornal Folha de S.Paulo.

O inquérito tem como objetivo apurar possíveis atos de improbidade administrativa praticados pelo então diretor e outros agentes públicos e privados, segundo portaria publicada nesta sexta-feira (23).

Procurada pela reportagem, a defesa de Dias afirmou que o procedimento será uma oportunidade para seu cliente e demais pessoas mencionadas esclarecerem os fatos.

Em entrevista à Folha de S.Paulo, o policial militar Luiz Paulo Dominghetti Pereira, representante da empresa Davati Medical Supply, disse que recebeu de Dias pedido de propina de US$ 1 por dose em troca de fechar contrato com o ministério. Dias foi exonerado horas após a publicação da entrevista.

Na CPI da Covid no Senado, Dominghetti repetiu as acusações e disse que esteve no ministério três vezes para tratar da proposta da venda. A Davati buscou a pasta para negociar 400 milhões de doses da vacina da AstraZeneca com uma proposta de US$ 3,50 por cada uma —depois passou a US$ 15,50.

Após a publicação da entrevista com a revelação da suspeita de propina, o líder da minoria na Câmara, Marcelo Freixo (PSB-RJ), o líder da oposição, Alessandro Molon (PSB-RJ), e demais líderes de partidos de oposição ao governo Jair Bolsonaro enviaram uma representação ao Ministério Público Federal.

O caso foi enviado inicialmente à procuradora Melina Montoya Flores, que instaurou o procedimento, mas está a cargo do 28º Ofício da Procuradoria, cujo titular é Cláudio Drewes. A apuração tramita sob sigilo.

Foi aberta uma apuração inicial, conhecida como notícia de fato, que consiste no levantamento de informações iniciais sobre o ocorrido.

“As questões versadas nos autos ainda demandam diligências para a formação do convencimento deste órgão acerca das medidas a serem eventualmente adotadas”, afirmou a Procuradoria.

Em depoimento à CPI, Dias confirmou o jantar no dia 25 de fevereiro com Dominghetti, mas negou ter cobrado propina. Ele disse aos senadores que não tratava da compra dos imunizantes, apesar de reconhecer que conversou por mensagens de celular e por email com representantes da Davati.

O ex-diretor afirmou à CPI que se encontrou por acaso com o policial no restaurante Vasto, em um shopping na região central de Brasília. “Não era um jantar com fornecedor, era um jantar com um amigo."

Dias ainda jogou sobre a Secretaria-Executiva da Saúde, área dominada por militares durante a gestão do ex-ministro Eduardo Pazuello, responsabilidades por definir preços, volumes e as empresas contratadas nas negociações por vacinas.

Em mensagem por áudio veiculada durante a sessão da CPI, obtida do celular de Dominghetti, que foi apreendido, o PM afirmou a um interlocutor que teria uma reunião com Dias no dia 25 de fevereiro, o dia do jantar no restaurante de Brasília.

Em meio a contradições e lacunas no depoimento, Dias foi levado preso pela Polícia do Senado após ordem do presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM). Ele foi liberado no mesmo dia, após o pagamento de fiança no valor de R$ 1.100.

Em nota enviada pela defesa, Dias afirmou que a notícia sobre a abertura de inquérito foi recebida como "uma oportunidade ímpar para esclarecer os fatos, oportunizando a manifestação de todos envolvidos para desmascarar a mentira criada por Luiz Dominghetti”.

Um dia antes de prestar depoimento no Senado, Dias apresentou uma queixa-crime contra Dominghetti na Justiça do Distrito Federal por calúnia e difamação.

Na peça, em que afirma ter sido seu nome "lançado à lama", ele argumentou que funções que desempenhava no ministério não tinham "o poder de iniciar o processo de compra de qualquer vacina, ou —muito menos— de definir seu preço". O caso tramita na 6ª Vara Criminal de Brasília.

A suspeita sobre a compra de vacinas veio à tona em torno da negociação da vacina indiana Covaxin, quando a Folha de S.Paulo revelou em 18 de junho o teor do depoimento sigiloso do servidor da Saúde Luis Ricardo Miranda ao Ministério Público Federal, que relatou pressão "atípica" para liberar a importação do medicamento.

Desde então, o caso virou prioridade da CPI. A comissão suspeita do contrato para a aquisição do imunizante por ter sido fechado em tempo recorde, em um momento em que a vacina ainda não tinha tido todos os dados divulgados, e por prever o maior valor por dose, em torno de R$ 80 (ou US$ 15 a dose).

Meses antes, o ministério já tinha negado propostas de vacinas mais baratas do que a Covaxin e já aprovadas em outros países, como a Pfizer (que custava US$ 10).

A crise chegou ao Palácio do Planalto após o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), irmão do servidor da Saúde, relatar que o presidente havia sido alertado por eles em março sobre as irregularidades.

Bolsonaro teria respondido, segundo o parlamentar, que iria acionar a Polícia Federal para que abrisse uma investigação. A CPI, no entanto, averiguou e constatou que não houve solicitações nesse sentido para a PF. O Ministério da Saúde suspendeu o contrato.

Ainda sobre esse caso, a Polícia Federal instaurou inquérito para investigar suspeita de prevaricação de Bolsonaro na negociação do governo para a compra da Covaxin.

A apuração tem origem nas afirmações do deputado Luis Miranda. A prevaricação é um tipo criminal em que o agente público deixa de agir ou retarda a ação para satisfazer interesses pessoais. No caso do presidente, a apuração vai buscar saber se ele foi de fato informado e se tomou medidas.

A investigação foi solicitada pela PGR (Procuradoria-Geral da República) após a ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) Rosa Weber cobrar manifestação do órgão sobre a notícia-crime apresentada à corte por três senadores.


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