Moraes, do STF, inclui Bolsonaro como investigado no inquérito das fake news por ataques às urnas
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), decidiu nesta quarta-feira (4) incluir o presidente Jair Bolsonaro como investigado no inquérito das fake news em tramitação na corte.
A decisão ocorre após o presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Luís Roberto Barroso, ter enviado notícia-crime ao Supremo contra o chefe do Executivo para que a conduta dele seja investigada devido à realização de live no dia 29 de julho com profusão de mentiras sobre o sistema eletrônico de votação.
Moraes determinou que a Polícia Federal colha depoimento dos envolvidos na transmissão, entre eles o ministro da Justiça, Anderson Torres.
Bolsonaro, por sua vez, disse que o inquérito de Moraes é uma tentativa de intimidá-lo.
"O que nós brigamos do lado de cá e grande parte da população? Queremos eleições limpas. Não vai ser inquérito, agora na mão do senhor querido Alexandre de Moraes, para tentar intimidar; ou, lamento, o próprio TSE tomar certas medidas para investigar, me acusar de atos antidemocráticos", disse na noite desta quarta, em entrevista à rádio Jovem Pan.
"Eu posso errar, eu tenho o direito a criticar. Mas não estamos errados. Nós não erramos", completou.
Na manhã desta quarta, sem citar Bolsonaro, Barroso disse durante um evento que "uma das vertentes do autoritarismo contemporâneo é o discurso de que se eu perder houve fraude, que é a inaceitação do outro, de que alguém diferente de mim possa ganhar as eleições."
Bolsonaro tem feito duros ataques a Barroso e, na última segunda-feira (2), o presidente do TSE tomou as medidas mais contundentes contra o presidente da República. Por unanimidade, a corte eleitoral decidiu abrir um inquérito para investigar Bolsonaro pelas acusações sem provas de fraude nas urnas e também encaminhou a notícia-crime ao STF.
A representação foi enviada a Moraes porque ele é o responsável pelo inquérito que apura a disseminação de notícias falsas na internet.
Na decisão desta quarta, o ministro afirma que as condutas de Bolsonaro podem configurar 11 crimes, 7 deles previstos no Código Penal, 3 na Lei de Segurança Nacional e 1 no Código Eleitoral. Entre eles, estão calúnia, difamação, injúria, incitação ao crime, apologia ao crime, associação criminosa e denunciação caluniosa.
Ele também cita os delitos de tentar mudar mediante emprego de violência o regime vigente, fazer propaganda de processos violentos para alteração da ordem política e a incitação a subversão da ordem.
Moraes argumenta que Bolsonaro fez afirmações falsas e criou narrativas para deslegitimar as instituições e estimular apoiadores a atacá-las não só em relação às urnas eletrônicas.
Como exemplo, cita as declarações do presidente de que não poderia governar devido a decisões do STF dando autonomia a estados e municípios no enfrentamento da pandemia de Covid-19 e também o fato de ter feito insinuações sobre a decisão que liberou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a disputar as eleições de 2022.
Tudo fundado em ilações reconhecidamente falsas, utilizadas para fomentar ataques aos integrantes das instituições constitucionalmente previstas para o balanceamento do regime democrático, escreveu.
Moraes determinou que a PF transcreva toda a live de 29 de julho do presidente e ouça os envolvidos no pronunciamento. Além do ministro da Justiça, também deverão prestar depoimento Eduardo Silva, assessor da Casa Civil; Jeterson Lordano, youtuber; Alexandre Hashimoto, professor da Faculdade de Tecnologia de São Paulo; e Amílcar Filho, engenheiro especialista em segurança de dados.
Na decisão, o ministro faz duras críticas a Bolsonaro e afirma que é imprescindível a adoção de medidas para elucidar os fatos investigados.
Não há dúvidas de que as condutas do presidente da República insinuaram a prática de atos ilícitos por membros da Suprema Corte, utilizando-se do modus operandi de esquemas de divulgação em massa nas redes sociais, com o intuito de lesar ou expor a perigo de lesão a independência do Poder Judiciário, o Estado de Direito e a democracia, afirmou.
Moraes diz que a investigação é importante e faz um vínculo entre as declarações do presidente e a atuação de grupos criminosos que disseminam fake news e que foram identificados no inquérito das fake news e no inquérito dos atos antidemocráticos.
Apesar de a notícia-crime assinada por Barroso ter se limitado à live de 29 de julho, Moraes vai além e cita declarações posteriores do chefe do Executivo que também tiveram o objetivo de atacar o presidente do TSE.
Observa-se o nítido objetivo de tumultuar, dificultar, frustrar ou impedir o processo eleitoral, com ataques institucionais ao TSE e aos seu ministro presidente, diz.
Moraes afirma que os movimentos contra o tribunal eleitoral na internet ocorreram, costumeiramente, no mesmo dia ou no dia seguinte às declarações de Bolsonaro. Segundo ele, há semelhanças entre a forma de atuação dos grupos criminosos que estão na mira do inquérito das fake news e a conduta de Bolsonaro.
É possível observar movimentação nas redes sociais, como na plataforma Twitter, onde, após as falas do presidente Jair Bolsonaro, tanto na manhã, como na noite do dia 29/7/2021, foram criadas hashtags com notório propósito antidemocrático, tais como: #barroso na cadeia e #votoauditavelja.
Segundo Moraes, o pronunciamento do chefe do Executivo naquela data se revelou como mais uma das ocasiões em que o mandatário se posicionou de forma, em tese, criminosa e atentatória às instituições.
Em outro revés a Bolsonaro, nesta quarta o corregedor-geral Eleitoral, que integra o TSE, ministro Luís Felipe Salomão, pediu para ter acesso aos inquéritos que miram aliados do presidente para que sejam incluídos nas ações que podem levar à cassação do chefe do Executivo e de seu vice, Hamilton Mourão (PRTB).
Em ofício Salomão afirmou que o compartilhamento das informações é necessário para o prosseguimento do caso.
Ele quer avaliar se o material reunido nos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos tem relação com a ação em curso na corte eleitoral que investiga se Bolsonaro participou do esquema de disseminação de notícias falsas para lhe beneficiar nas eleições de 2018.
A ação foi apresentada por partidos ao TSE após o jornal Folha de S.Paulo revelar a existência de um esquema bancado por empresários apoiadores do presidente para o disparo em massa de notícias falsas.
No pedido a Moraes, Salomão lembrou que, em junho do ano passado, o ministro Og Fernandes, seu antecessor na corregedoria, já havia solicitado tal acesso e observado que os fatos sob apuração no âmbito do Supremo Tribunal Federal podem supostamente guardar relação com aqueles investigados nas Aijes. O pedido de 2020 ainda estava pendente de decisão.
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