Compartilhe este texto

Apenas 0,6% dos magistrados do Tribunal de São Paulo se declaram pretos

Por Folha de São Paulo

22/11/2020 1h33 — em
Política



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - No Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), o maior do país, apenas 0,6% dos magistrados se declaram pretos. Em números absolutos, são 15 pessoas em um universo de 2.508 homens e mulheres, ou menos da metade dos que se declaram amarelos, por exemplo --estes somam 36 juízes e desembargadores (1,4%).

Ainda de acordo com dados do TJ-SP obtidos pela reportagem, se fossem somados os magistrados pretos com os 37 que se declaram pardos (1,48%), a fatia chegaria a 2,1% do total da classe, percentual muito inferior à média nacional.

No mais recente levantamento feito pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) --que ouviu 11.348 de um total de 18.168 profissionais, entre juízes e desembargadores, de ambos os sexos--, 80,3% dos magistrados se declararam brancos.

Já a quantidade de magistrados que se declararam negros ficou em 18,1%. Destes, 16,5% se disseram pardos, e os pretos foram 1,6% --mesma porcentagem dos de origem asiática.

Apenas 11 magistrados se declararam indígenas --traço, em termos estatísticos.

A falta de representatividade de negros no Judiciário paulista é ainda pior quando se trata de mulheres que atuam na segunda instância. Não há, entre as 33 desembargadoras em atuação no TJ paulista, nenhuma que se declare negra ou parda.

Entre os desembargadores, a situação não é muito diferente. Dos 325 magistrados que atuam na segunda instância, apenas 1 deles se declara negro, e outros 2, pardos. Isso representa menos de um 1% do total.

Para o advogado e professor da FGV Thiago Amparo, os números são reflexo das barreiras estruturais existentes para os negros nos concursos de magistratura.

"Primeiro, não é que negros não tentem concursos, mas é que lhes falta apoio, inclusive financeiro, para se dedicarem longos anos ao estudo para o concurso, como fazem candidatos brancos. Segundo, é necessário fortalecer as ações afirmativas para negros na magistratura, no ingresso e na promoção da carreira."

Ainda segundo Amparo, uma das maiores referências do país sobre o assunto, é importante a presença de negros no Judiciário para que o sistema de Justiça seja o mais equânime possível.

"O Judiciário, em geral, tem sido relutante em ver racismo mesmo quando este é evidente. Mesmo não sendo um órgão representativo, o Judiciário não pode continuar a ser uma corte tão distante da população que julga, sob pena de cometer injustiças que deveriam enfrentar."

Diante da situação, o CNJ criou um grupo de trabalho para propor políticas de combate ao racismo no Poder Judiciário.

Para a juíza federal Adriana Cruz, uma das integrantes do grupo e coautora do estudo sobre igualdade social no Judiciário, a falta de pessoas negras, em especial mulheres, na magistratura nacional decorre da estrutura racialmente hierarquizada da sociedade brasileira.

"Apenas recentemente, e de forma muito tímida, o Estado brasileiro começou a reconhecer e implementar políticas inclusivas, a despeito de ter se estruturado ao longo de séculos a partir de políticas explicitamente excludentes", afirma ela.

"As pessoas negras que conseguem romper essa barreira o fazem a partir de dinâmicas que não são replicáveis em larga escala e, por isso, os juízes e juízas negros do Brasil têm se empenhado em propor políticas concretas, nos limites do Poder Judiciário, que façam frente a essa realidade."

Algumas desses propostas constam do Relatório de Atividades Igualdade Racial no Judiciário, produzido pelo grupo de trabalho do CNJ. Elas vão desde a revisão das regras de concursos --para que a política de cotas, já adotada, seja eficiente-- até a inclusão de determinadas matérias e medidas de barateamento dos custos de participação.

Ela frisa que a presença negra no Judiciário é essencial, não apenas porque incrementa a "pluralidade de percepções" acerca dos problemas a serem decididos, mas porque "é um pressuposto democrático que todos que são afetados possam ter igual oportunidade de ocupar espaços que decidem suas vidas".

Siga-nos no
O Portal do Holanda foi fundado em 14 de novembro de 2005. Primeiramente com uma coluna, que levou o nome de seu fundador, o jornalista Raimundo de Holanda. Depois passou para Blog do Holanda e por último Portal do Holanda. Foi um dos primeiros sítios de internet no Estado do Amazonas. É auditado pelo IVC e ComScore.

ASSUNTOS: Política

+ Política