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Xi Jinping visita Tibete para reafirmar autoridade de Pequim sobre região conflagrada

Por Folha de São Paulo

23/07/2021 18h06 — em
Mundo



GUARULHOS, SP (FOLHAPRESS) - "Agora que a China embarcou em uma nova jornada de construção de um país socialista moderno, o desenvolvimento do Tibete também está em um novo ponto de partida histórico", disse o líder chinês, Xi Jinping, à população da cidade de Lhasa, capital tibetana, nesta sexta-feira (23).

Sem anúncio oficial, Xi desembarcou no Tibete na quarta (21), oficializando a primeira visita de um presidente da República Popular da China à região autônoma, localizada no sudoeste do país, em 31 anos. O também secretário-geral do Partido Comunista havia visitado os tibetanos em julho de 2011, mas ainda como vice do regime.

A data marca 70 anos desde a assinatura do Acordo dos 17 Pontos, documento que endossou a soberania chinesa sob o Tibete após a invasão da região --Pequim a difunde como marco de uma "libertação pacífica", versão rechaçada pelos tibetanos.

Com o regime em busca de aumentar sua autoridade sobre a região, porém, o principal fator para a escolha do calendário está em outro aniversário: o de 100 anos do primeiro congresso do Partido Comunista Chinês, em Xangai.

Xi iniciou sua visita pela cidade de Nyingchi, onde inspecionou obras públicas, sendo uma delas a da primeira ferrovia eletrificada da região, e seguiu de trem para Lhasa. Na capital, uma de suas paradas foi na praça em frente ao Palácio de Potala, residencia tradicional do Dalai Lama, 86, considerado o líder espiritual do budismo tibetano e exilado na Índia desde 1959, quando fugiu da perseguição do regime.

Ao falar com os moradores locais, o líder chinês enfatizou o discurso contra os movimentos separatistas da região, ainda que sem nomeá-los. Pediu o reforço da "unidade nacional" e do "patriotismo" no Tibete.

"[Vamos] escrever um novo capítulo de estabilidade duradoura e desenvolvimento de alta qualidade", disse Xi.

Também instruiu as autoridades locais a trabalhar para que os moradores se identifiquem com "a grande pátria, o povo chinês, o Partido Comunista e o socialismo" e prometeu investimentos em projetos de infraestrutura para impulsionar o crescimento econômico e os empregos na região, de acordo com a agência estatal de notícias Xinhua.

Em meio ao centenário do PC Chinês, a movimentação é mais uma tentativa de colocar panos quentes em conflitos que se estendem por décadas entre Pequim e suas regiões autônomas. No Tibete, de cerca de 3,5 milhões de habitantes, os embates nunca cessaram desde a década de 1960, quando a região, então independente, foi anexada pela China.

O regime tem investido no turismo doméstico da região, incrustrada no coração do Himalaia, e aumentou o cerco desde março de 2008, quando monges budistas organizaram protestos contra a dominação chinesa. A onda de manifestações, com incêndios, tiroteios e ampla repressão, deixou 19 mortos, segundo Pequim. Já de acordo com governo tibetano no exílio, foram ao menos 140 mortos.

A Campanha Internacional pelo Tibete, baseada em Washington (EUA), caracterizou a visita do líder chinês como uma mostra de que o regime comunista sabe de sua falta de capilaridade na região.

Em nota, na qual descreve o Acordo dos 17 Pontos como "a falsamente alegada libertação pacífica", disse: "a maneira como a visita foi organizada e a completa ausência de qualquer cobertura imediata da mídia estatal sobre a visita indicam que o Tibete continua a ser uma questão delicada e que as autoridades chinesas não confiam em sua legitimidade perante o povo tibetano".

Em relatórios periódicos, a campanha tem denunciado a vigilância de Pequim sob a região autônoma. Documento de março alega que câmeras de segurança estão sendo maciçamente implantadas para vigiar os mosteiros dentro e fora das propriedades, com o objetivo de "manter um registro cumulativo e esmagar proativamente qualquer indício de dissidência".

A organização, além de observadores internacionais, denuncia também tentativas do regime chinês de apagar a cultura tibetana, em especial a língua. "A comunidade monástica é impedida de formar e expressar seus pensamentos sobre a história e a cultura do Tibete, e em vez disso é obrigada a seguir a versão oficial do partido sobre a história, a cultura e a religião chinesas", diz um dos relatórios.

Em janeiro deste ano, um empresário da região, Tashi Wangchuk, 35, foi libertado após passar cinco anos preso por "incitar o separatismo" ao fazer campanhas pelo ensino da língua tibetana durante entrevistas a diferentes jornais, entre eles o americano New York Times.

De acordo com levantamento da Fundação Dui Hua, grupo com sede nos EUA que monitora direitos humanos na China, entre 1998 e 2016 os tribunais chineses julgaram cerca de 12 mil pessoas sob acusação de separatismo ou incitação ao separatismo. Apenas 15 foram absolvidas.

O Tibete não é a única região que ameaça a tentativa de unidade pregada pelo PC Chinês. Além de Hong Kong, onde há um movimento pró-democracia pulsante, outro ponto crítico é Xinjiang, região autônoma que faz fronteira com o Paquistão e o Afeganistão e onde vivem os uigures, minoria majoritariamente muçulmana.

Alvos de uma campanha abrangente para transformá-los em seguidores obedientes do Partido Comunista, milhares já foram enviados pelo regime chinês para campos de doutrinação. As cidades e províncias da região são cercadas por grandes postos de controle da polícia, que monitoram quem entra e sai.


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