Trumpistas já questionam eleição e pedem contagem de votos na mão
WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) - Donald Trump e aliados já preparam o terreno para questionar o resultado da eleição presidencial em novembro. A estratégia vai além de acusações sem provas, como as feitas em 2020, e mira os processos de registro de eleitores, contagem e certificação de votos.
Democratas veem com apreensão a estratégia, diante de um placar final que deve ser ainda mais apertado do que o da última eleição, e preparam times de advogados para contra-atacar.
"Nosso foco principal não é levar as pessoas para votar. É garantir que eles [democratas] não trapaceiem, porque nós temos todos os votos de que precisamos", disse Trump durante um comício na Carolina do Norte no mês passado.
Em julho, o republicano já havia afirmado que democratas "vão trapacear nesta eleição". "Mas achamos que conseguimos bloqueá-los", completou. Ele tem repetido que aceitará o resultado das urnas "se a eleição for justa", condicionando a uma avaliação subjetiva.
Um alvo frequente de Trump é o processo de tabulação dos votos. Nos EUA, cerca de 70% do eleitorado vota preenchendo uma cédula de papel à mão -apenas 5% usam o método eletrônico (semelhante ao adotado no Brasil), segundo a organização apartidária Verified Voting. Esse percentual é inferior ao da última eleição presidencial (12%), e o menor desde pelo menos 2006.
O restante dos votos é feito por uma máquina que gera um voto impresso. O dado não é armazenado eletronicamente.
As cédulas de papel -sejam as preenchidas na seção eleitoral à mão ou por máquina e as enviadas por correio- são contabilizadas em geral usando uma máquina de leitura óptica. Em 2020, Trump afirmou que esses equipamentos foram adulterados para favorecer Joe Biden.
Agora, apoiadores do ex-presidente fazem uma campanha para a contagem de votos à mão. Um dos principais defensores da ideia é o empresário Mike Lindell, dono da MyPillow, uma rede fabricante de travesseiros. O método é criticado por especialistas como mais propenso a erros e vulnerável a fraudes.
Ainda assim, 12 estados americanos preveem o uso de contagem à mão em suas eleições, entre eles o Wisconsin, um dos principais campos de batalha neste ano. No Arizona, tentativas de adotar o método foram feitas na eleição de 2022, mas fracassaram.
Resolvida a contagem dos votos, outro alvo é a certificação da contagem -um procedimento visto historicamente como apenas burocrático de validação do resultado. O processo começa com funcionários de condados responsáveis pela supervisão da eleição, a nível local, e sobe para autoridades estaduais e federais.
Newsletter Kamala x Trump De Washington, a correspondente da Folha informa o que importa sobre a eleição dos EUA *** Qualquer problema ou atraso nessa primeira etapa, portanto, pode gerar um efeito em cascata. Estados têm até 11 de dezembro para certificarem o resultado. No limite, um desrespeito ao prazo poderia ser usado como justificativa para colocar toda a eleição em dúvida.
Um relatório identificou 35 pessoas em oito estados, entre eles os cruciais Arizona, Geórgia, Nevada, Carolina do Norte, Pensilvânia e Michigan, que já se negaram a certificar resultados de pleitos anteriores e podem fazer isso novamente neste ano.
Segundo a organização Cidadãos pela Responsabilidade e Ética em Washington (Crew, na sigla em inglês), autora do levantamento, fazem parte do grupo pessoas que rejeitam a vitória de Biden em 2020, apoiadores de Trump que se passaram por delegados do ex-presidente e um condenado por participar da invasão do Capitólio.
"O esforço legal que foi feito para impedir a certificação da eleição em 2020 foi amador comparado ao que veremos este ano," disse Joshua Matz, advogado na Crew, ao jornal The Guardian. "Agora há um esforço muito mais organizado, muito mais sofisticado, com muito mais financiamento e muito mais intencional para impedir a certificação fluida e consistente dos resultados eleitorais exigida pela lei."
Isso já aconteceu neste ano nas primárias -eleições em que cada partido escolhe seus candidatos para disputar um cargo com a agremiação rival -em Nevada, Michigan e na Pensilvânia.
A atenção, no entanto, está na Geórgia, onde o comitê responsável pela supervisão da eleição aprovou uma série de mudanças de regras, entre elas a que diz que os funcionários nos condados podem conduzir "investigações razoáveis" antes de certificar os resultados.
O temor é que essas pessoas argumentem que há irregularidades pontuais para se negarem a validar as contagens, inviabilizando a certificação pelo estado.
A mudança foi introduzida após republicanos conseguirem se tornar maioria no órgão. Em um comício em Atlanta no começo de agosto, Trump chamou os aliados de "pitbulls lutando por honestidade, transparência e vitória".
Na semana passada, democratas reagiram e entraram com uma ação contra a mudança, afirmando que ela vai contra o que entendem ser o dever estabelecido na Constituição estadual de certificar o resultado.
Em 2020, Biden venceu Trump na Geórgia por uma diferença de menos de 12 mil votos. Em uma conversa telefônica com um secretário estadual após o resultado, Trump diz a ele que "apenas quer achar 11.780 votos". O republicano é acusado em um processo criminal de tentar interferir na eleição no estado.
Outro esforço da campanha republicana mira o voto por correio, modalidade em que o eleitor preenche uma cédula de papel e a envia de volta às autoridades eleitorais dentro de um prazo que varia de estado a estado.
Chamada de "operação pela integridade eleitoral", o grupo tem entrado com uma série de ações em torno de regras eleitorais, travando batalhas com democratas que geram incerteza sobre o que está valendo a pouco mais de dois meses do pleito.
Na semana passada, por exemplo, um tribunal na Pensilvânia rejeitou o pedido feito por republicanos para que votos enviados dentro de um envelope sem data, ou com a data errada, sejam desconsiderados. Aliados de Trump já afirmaram que vão recorrer à Suprema Corte do estado.
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