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Crescem críticas a 'lei do coronavírus' de premiê da Hungria

Por Folha de São Paulo

02/04/2020 11h50 — em
Mundo



BRUXELAS, BÉLGICA (FOLHAPRESS) - "Estou particularmente preocupada com a situação da Hungria", disse nesta quinta (2) Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia (Poder Executivo da UE), três dias depois de o governo húngaro conquistar poder para legislar por decreto por tempo indeterminado.

A Comissão vem sendo criticada por não agir para barrar medidas do primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, que ameaçam a democracia no país, segundo outros líderes europeus e organizações de direitos civis.

Von der Leyen vinha dizendo que medidas de emergência deveriam ser proporcionais e temporárias, sem citar o governo húngaro, mas subiu o tom em apresentação de programa para evitar o desemprego causado pelo coronavírus. "Algumas medidas podem ter ido longe demais", afirmou, citando em seguida a Hungria.

Poucas horas depois, o presidente do Parlamento Europeu, David Sassoli, divulgou pronunciamento em que cobra da Comissão uma posição sobre se a lei aprovada na Assembleia húngara fere ou não a democracia.

Sassoli é do Partido Democrático (centro-esquerda), corrente oposta à do primeiro-ministro húngaro, mas Orbán foi criticado por líderes de várias tendências políticas, incluindo do bloco de centro-direita de que faz parte seu partido, o ultranacionalista Fidesz.

O polonês Donald Tusk, ex-presidente do Conselho Europeu e líder do PPE (Partido do Povo Europeu), mandou uma carta aos membros da coligação afirmando que "usar a pandemia para manter estado permanente de emergência é politicamente perigoso e moralmente inaceitável".

Também identificado com o PPE, o primeiro-ministro grego, Kyriakos Mitsotakis, acusou a Hungria de oportunismo autoritário, o ex-premiê sueco Carl Bildt escreveu que a lei "faz lembrar períodos negros da história europeia" e o alemão Norbert Rottgen, correligionário de Angela Merkel, disse que a medida "elimina a oposição".

O Fidesz, partido de Orbán, está suspenso desde o ano passado do bloco de centro-direita, por criticar a União Europeia e ameaçar a democracia. Desde o começo deste ano, parlamentares do grupo defendem que ele seja expulso, embora analistas temam que isso leve à formação de um novo bloco, de extrema-direita, no Parlamento Europeu.

Nesta quarta, líderes de 13 países (Alemanha, França, Espanha, Itália, Portugal, Holanda, Bélgica, Dinamarca, Finlândia, Suécia, Irlanda, Grécia e Luxemburgo) assinaram uma declaração que não cita a Hungria, mas condena o uso de medidas de emergência para restringir a liberdade de imprensa e de opinião.

A lei aprovada na Hungria prevê prisão de até cinco anos a quem divulgar informação que "dificulte o combate à pandemia de coronavírus". Para membros da mídia independente do país, o objetivo de Viktor Orbán é amordaçar os veículos que ainda resistem à pressão do governo.

Partidários do premiê húngaro dizem que a lei não afronta a democracia e é necessária para combater a pandemia de coronavírus. "Leiam o texto. Não há base para tantas mentiras e exageros", disse ao site informativo Politico o eurodeputado Tamás Deutsch, um dos fundadores do Fidesz.

Mas, na mesma noite em que a lei de emergência foi aprovada, o governo encaminhou 15 decretos, nenhum relacionado ao coronavírus, segundo o Hungarian Spectrum, site independente fundado pela professora de história da Europa Oriental de Yale Eva Balogh.

Entre as normas baixadas na segunda-feira (30) estão a que proíbe a mudança de sexo e a que determina a construção de museus à custa da cidade de Budapeste (governada pela oposição), segundo o Spectrum.

Na quarta, porém, Orbán teve que rever outro decreto, que estabelecia que qual qualquer proposta de governantes municipais, eleitos em outubro do ano passado, terão que ser aprovadas por comitês liderados por membros do Fidesz.

Até as 11h (horário do Brasil) desta segunda, o país registrava 585 casos confirmados de coronavírus e 21 mortos, um dos mais baixos índices da Europa. Escolas, restaurantes e a maioria das lojas foram fechados e eventos foram proibidos no dia 13. A entrada na Hungria está fechada para estrangeiros desde o dia 17.

O líder húngaro ultranacionalista é visto pelo presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, como aliado ideológico. Antes da disseminação do coronavírus, o brasileiro planejava uma viagem oficial à Hungria neste ano.

Em 2019, o deputado Eduardo Bolsonaro se reuniu com o premiê húngaro na Europa.

A TRAJETÓRIA DE VIKTOR ORBÁN

1987 - Forma-se em direito em Budapeste

1989 - Ganha uma bolsa da fundação do bilionário George Soros para estudar filosofia política na Universidade de Oxford. Atualmente, Orbán critica duramente o trabalho filantrópico de Soros

1990 - Eleito para a Assembleia Nacional pela primeira vez, logo após a saída das tropas soviéticas da Hungria

1993 - Torna-se líder do Fidesz (Federação dos Jovens Democratas), partido que ajudou a fundar

1998 - Conquista o cargo de primeiro-ministro pela primeira vez e cumpre o mandato até 2002

2010 - O Fidesz vence as eleições e Orbán reconquista o cargo de premiê, com ampla maioria no Parlamento

2012 - Consegue aprovar uma nova Constituição, que inclui temas de comportamento, reduz a independência do Judiciário e limita a liberdade de imprensa

2013 - Aumenta impostos sobre bancos e algumas indústrias e força empresas a reduzir tarifas de água, energia e gás para os consumidores, o que aumenta sua popularidade

2014 - Seu partido vence as eleições e, assim, ele conquista o terceiro mandato como premiê. Após a vitória, toma novas medidas para sufocar financeiramente a imprensa e as ONGs

2015 - Nega-se a adotar cotas para receber refugiados, como outros países da UE fizeram, e constrói cercas de arame farpado na fronteira com a Sérvia

2018 - Com uma campanha fortemente anti-imigração, seu partido vence as eleições, e Orbán conquista o quarto mandato

2020 - Por 137 votos a 52, obtém na Assembleia Nacional direito de governar por decreto por tempo indeterminado, sob justificativa de combater a pandemia de coronavírus

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O Portal do Holanda foi fundado em 14 de novembro de 2005. Primeiramente com uma coluna, que levou o nome de seu fundador, o jornalista Raimundo de Holanda. Depois passou para Blog do Holanda e por último Portal do Holanda. Foi um dos primeiros sítios de internet no Estado do Amazonas. É auditado pelo IVC e ComScore.

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