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Rueda segue receita de bolo para administrar o Santos, mas falta a bola entrar

Por Folha de São Paulo

24/09/2021 22h05 — em
Esportes



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Andrés Rueda havia acabado de se sentar na cadeira de presidente, em janeiro de 2021, quando resolveu consultar a situação do Santos no Profut. Seria algo de rotina, acreditava.

O resultado foi que a inscrição do clube no programa para o refinanciamento de dívidas com o governo estava cancelada.

"A gente estava com cinco mensalidades atrasadas. Aquilo me arrebentou", confessa.

O dirigente diz ter ficado "de joelhos" em duas viagens a Brasília para recolocar a agremiação no programa. Teve de pagar as prestações atrasadas à vista.

A notificação da Receita Federal chegou dias depois. A cobrança era de R$ 60 milhões por apropriação indevida de impostos recolhidos dos vencimentos dos funcionários e não repassados ao governo.

O ambiente do futebol, caótico, passional e movido pelo calor do momento não é o habitat natural para Rueda, 65, formado em matemática e empresário do ramo da tecnologia da informação. Alguém que entrou na presidência do Santos com um pensamento mantido até hoje: administrar um clube em situação de quase insolvência (como o da Vila Belmiro) não tem segredo. Basta seguir uma fórmula.

Como se fosse receita de bolo.

"Não dá para sair dessa receita. Alonga a dívida, passa credibilidade, faz acordos, paga e reduz custos. Como a gente fez ao ir a Brasília. Renegociamos e fomos pagar. O problema é que o Santos [no passado] fazia acordos e não pagava nada", afirma.

Nas finanças, a fórmula pode funcionar a médio e longo prazo. Mas para azar de Rueda, clube de futebol não é uma empresa comum e os resultados dentro de campo não se encaixam em nenhuma receita. Em 14º no Campeonato Brasileiro, o Santos está um ponto acima da zona de rebaixamento.

Eventual queda para a Série B seria desastrosa para as finanças e pior ainda para o orgulho do torcedor que tem tido muito pouco o que comemorar. A equipe não é campeã desde o paulista de 2016.

No próximo 15 de dezembro, chegará a cinco anos sem títulos, o maior jejum entre os grandes de São Paulo e a mais larga seca alvinegra desde o Brasileiro de 2002.

Evitar a queda é a prioridade, embora Rueda fale em classificação para a Libertadores de 2022. Na atual temporada, o Santos evitou o rebaixamento no estadual apenas na última rodada. Foi eliminado na fase de grupos da Libertadores, nas quartas de final da Copa Sul-Americana e da Copa do Brasil.

Os resultados não mexem apenas com o orgulho da torcida. Derrotas significam perda de receitas. Apenas a saída da Copa do Brasil fez com que a agremiação deixasse de arrecadar R$ 7,3 milhões. O Brasileiro paga premiações, que fazem parte do contrato de televisionamento, baseado na classificação final. O campeão da Libertadores fatura, apenas pelo título, R$ 50 milhões.

O Santos precisa de R$ 70 milhões para não fechar no vermelho o ano, avalia Rueda. Mas parte desse valor pode ser alongado mediante renegociações.

"O elenco é de razoável para bom. A bola não está entrando", analisa o presidente.

Nisso, as estatísticas não mentem. Nos últimos jogos, o Santos só fez um gol. Neste domingo (26), a equipe visita o Juventude. Uma derrota, a depender da combinação de resultados, pode fazer o time ficar entre os quatro piores do campeonato.

"O Santos corria o risco de insolvência como instituição. O clube precisava dar uma guinada em todos os sentidos e isso vem sendo feito. Ninguém esqueceu do futebol, mas não temos condições de trazer jogadores fora da nossa realidade. Não adianta esperar que a gente faça contratações que são impossíveis de pagar", completa.

Há atitudes e visões que prevalecem e são difíceis para Rueda entender. Como contratar reforços caros, que o dirigente sabe de antemão não ter como financiar. Algo feito em nome de duvidosas, na visão dele, tentativas de ser campeão.

"Não consigo entender alguns investimentos feitos em atletas. Isso não resolve e não garante títulos. Para colher, tem de plantar. É o vale-tudo para ser campeão e o campeão é um só. O futebol está cada vez mais elitizado na parte de investimentos", lembra.

Rueda aponta uma estrutura caótica ao assumir o Santos. O clube não podia fazer contratações porque estava banido pela Fifa, resultado de acordos não pagos. Na administração, não havia nem levantamento patrimonial. Não se sabia quantas TVs, mesas, cadeiras, computadores tinha o time. A planilha de Excel com esses dados havia sumido.

O assunto pode cansar o santista. Primeiro porque este está acostumado com notícias de "sumiços". Uma das histórias mais famosas no folclore da agremiação é a da mala com os dólares de uma excursão pelo exterior que teria caído do avião.

Todos os presidentes na trajetória recente afirmam terem recebido o clube em situação quase falimentar e apontaram o dedo para os antecessores. Rueda tem como objetivo maior, ao deixar o cargo, em 2023, que seu sucessor encontre a dívida equacionada. Hoje ela está em "mais de R$ 600 milhões", informa o mandatário.

Organizar o Santos pode ser também ir contra costumes estabelecidos no futebol brasileiro. O dirigente tem se recusado a pagar comissões para empresários pela renovação de jogadores. Considera absurdo. Também fez acordo de premiações com o elenco, no início do ano, e disse que esse será seguido até o fim. Sem pedidos de reajustes. Cada um faria a sua parte.

Isso vale também para o elenco. Atraso para entrar em campo na Libertadores resulta em multa de US$ 50 mil, por exemplo. O grupo de atletas tem de arcar com custos desse tipo, afirma Rueda.

"Os envolvidos no futebol, salvo exceções, são movidos por oportunidades de dolo. É uma indústria que gera jogadores ricos, dirigentes ricos, agentes milionários e clubes miseráveis. Não tem cabimento pagar comissão de empresário em renovação de contrato. Nem o clube comprador pagar comissão.

"Por que se aceita isso? Por motivos que podem ser imaginados. Você abre válvula para coisas que não são muito claras. O futebol tem uma cultura de coisas erradas."

Mas mesmo a receita de bolo de Andrés Rueda pode ter mudanças. O cartola emprestar dinheiro para a instituição vai contra tudo o que ele acredita, embora já tenha feito isso duas vezes antes de ser eleito. Já em sua gestão, foi avalista de empréstimo porque o Santos não tinha crédito com bancos.

Se o pior acontecer e a equipe em campo entrar em uma luta para evitar o rebaixamento, o assunto dos bichos, acertados no início da temporada, pode ser revisto.

"Vai ter conversa, claro. Toda regra tem exceção", ele responde, sorrindo no final da frase por saber que o futebol pode ser tudo, menos algo exato.

JUVENTUDE

Marcelo Carné; Michel, Quintero, Vitor Mendes e William Matheus; Guilherme Castilho, Jadson, Wescley e Chico; Capixaba e Ricardo Bueno. T.: Marquinhos Santos

SANTOS

João Paulo, Emiliano Velázquez, Danilo Boza e Wagner Leonardo; Pará, Camacho, Sánchez e Felipe Jonatan; Marinho, Léo Baptistão e Lucas Braga. T.: Fábio Carille

Estádio: Alfredo Jaconi, em Caxias do Sul (RS)

Horário: 16h (de Brasília)

Árbitro: Jefferson Ferreira de Moraes (GO)

VAR: Wagner Reway (PB)


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O Portal do Holanda foi fundado em 14 de novembro de 2005. Primeiramente com uma coluna, que levou o nome de seu fundador, o jornalista Raimundo de Holanda. Depois passou para Blog do Holanda e por último Portal do Holanda. Foi um dos primeiros sítios de internet no Estado do Amazonas. É auditado pelo IVC e ComScore.

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