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Na disputa por mercado, BTG tira da XP escritório que movimenta R$ 8,5 bi

Por Folha de São Paulo

17/05/2021 16h35 — em
Economia



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O BTG Pactual ganhou mais um escritório de agentes autônomos da XP. Nesta segunda-feira (17), a Acqua-Vero notificou a XP sobre o início do prazo de 60 dias de aviso prévio para o encerramento de seu contrato de distribuição de produtos financeiros.

Ao final deste prazo, o escritório irá se juntar ao BTG, segundo apontam fontes do mercado, ao passo que inicia o processo para se tornar uma corretora de valores. Dentro dos planos também está a abertura de capital na Bolsa brasileira em até três anos.

Acqua-Vero tem 16 filiais distribuídas pelo Brasil com 250 profissionais que assessoram uma carteira de R$ 8,5 bilhões, atendendo mais de 20 mil clientes. Agora, a meta é chegar ao final de 2021 com R$ 12 bilhões sob assessoria, 350 profissionais e 100 novas filiais.

Procuradas sobre o caso, BTG e Acqua-Vero preferiram não comentar.

­Em nota, a XP informa que foi avisada do pedido de descredenciamento de um escritório da sua rede.

"Nos poucos casos de descredenciamento ocorridos até hoje, o histórico de transferência para a nova instituição é baixo, sendo menor que 15% em média. Isso ocorre pois a decisão final é dos clientes", diz a empresa.

A XP também informa que possui hoje mais de 9 mil profissionais parceiros, abrindo, em média, cinco novas operações por mês. No último ano, atraiu 3.700 novos agentes autônomos, um crescimento de quase 20% em relação ao ano anterior, e possui mais de R$ 715 bilhões de ativos sob custódia, alta de 96% na comparação com o primeiro trimestre de 2020.

A Acqua-Vero é fruto da fusão de outros dois escritórios vinculados à XP. Em dezembro de 2020, a Acqua Investimentos se juntou à Vero, se tornando a maior assessoria de investimentos de São Paulo e a quinta maior empresa ligada à XP.

Os clientes, porém, ficam na XP ao final dos 60 dias de aviso prévio. Caso queiram continuar atendidos pela Acqua-Vero, devem migrar seus recursos para o BTG.

Segundo dados da XP, no entanto, quando ocorre este tipo de migração, apenas 11% dos clientes de agentes autônomos de investimentos migram com o escritório para o novo parceiro nos três primeiros meses após o fim do contrato.

Apesar de a taxa ser relativamente baixa, a atração de agentes autônomos é uma das estratégias do BTG para competir com a XP. E ela faz tanta diferença nesta disputa que, de início, em 2018, a corretora de Guilherme Benchimol entrou com uma ação contra as aquisições na Justiça, alegando concorrência desleal.

Em março deste ano, BTG e XP entraram em acordo para encerrar processo no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Nele, a XP acusava o BTG de usar informações confidenciais obtidas na primeira tentativa de abertura de capital da corretora para montar o seu próprio negócio.

Ao fim de 2016, a XP decidiu fazer seu IPO (oferta inicial de ações, na sigla em inglês) e contratou o BTG como um dos seus assessores financeiros na operação.

Para assessorar a XP, o BTG, bem como outros bancos que faziam parte do time de IPO, passaram a conhecer detalhes da operação da corretora. Com a desistência do IPO e venda de parte da XP para o Itaú, o BTG voltou ao posto de concorrente da XP e acelerou a sua expansão digital.

A estratégia adotada era semelhante a da XP, crescimento via atração de agentes autônomos de investimentos —o que a empresa de Benchimol viu como uma quebra do acordo de confidencialidade celebrado entre as partes no processo de IPO.

Tal acordo previa que as informações fornecidas pela XP só poderiam ser utilizadas na operação de abertura de capital, sendo sigilosas, por um prazo de dois anos, o que, segundo a XP, o BTG descumpriu.

A XP também acusava o BTG de assediar os agentes autônomos que já estavam vinculados à XP e “incentivá-los financeiramente para que desviassem clientes e informações confidenciais desses clientes e da própria XP”, de modo formar sua própria rede de agentes autônomos de investimentos.

Para entender a disputa, é preciso ter em mente que agentes autônomos funcionam como agências bancárias, ou revendedoras de cosméticos. Eles são pessoas físicas ou jurídicas que distribuem produtos financeiros e gerenciam os investimentos dos clientes.

Para ser um agente, é necessário ser aprovado na prova da Ancord (Associação Nacional de Corretoras e Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários, Câmbio e Mercadorias).

De acordo com a entidade, em abril deste ano o Brasil tinha 14.440 agentes autônomos credenciados, ou seja, aptos a exercer a função. Destes, 11.406 estão vinculados a uma instituição financeira.

Eles se organizam em escritórios e alcançam um público fora das capitais e grandes centros urbanos.

Segundo regra da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) de 2011, eles só podem distribuir produtos de uma única corretora, que os remunera de acordo com o investimento repassado ao cliente. Geralmente, quanto mais arriscado, maior o repasse.

Segundo o processo movido pela XP, o BTG abordaria escritórios de agentes autônomos de investimentos vinculados à XP “com o objetivo de sondar a possibilidade de desvinculação da corretora; em seguida, solicita aos agentes todos os dados dos clientes por eles atendidos, incluindo informações financeiras".

Essa tática, diz ainda a XP, "teria o objetivo de formular uma proposta comercial". Finalmente, ao efetuar a sua proposta, detalha a XP no processo, o Banco BTG ofereceria aos agentes autônomos, até então vinculados a XP, "um polpudo adiantamento" para que não apenas se desvinculasse da XP, mas, também, para que, antes, encaminhasse as informações confidenciais dos clientes da XP e as correspondências (e-mails) trocadas entre eles”.

No processo, a defesa do BTG diz que a alegação é absurda e “um verdadeiro disparate” e que sua abordagem dos agentes autônomos “observa todas as questões regulatórias e contratuais aplicáveis, sendo absolutamente saudável e esperada em uma economia de mercado”.

Também disse que o processo seria “um esforço da líder de mercado para suprimir toda e qualquer competição pelos prestadores de serviço que momentaneamente integram sua rede de distribuição”.

Fato é que ao longo dos últimos anos, escritórios de agentes autônomos deixaram a XP para trabalhar no BTG, seja por vontade própria, segundo eles, para ganhar mais e ter mais autonomia, ou porque foram desligados da XP.

Um dos casos mais emblemáticos é da EQI (sigla para Eu Quero Investir), escritório de agentes com sede em Santa Catarina presente em sete estados, com R$ 7,5 bilhões em ativos sob gestão. Na XP, tinha R$ 10 bilhões.

A EQI saiu da XP não apenas para trabalhar com o BTG, mas para virar uma corretora, da qual o BTG será dono de 49%.

Ao perder um dos seus maiores agentes autônomos, a XP entrou com um processo contra ao EQI, alegando quebra de contrato. A disputa judicial corre em segredo de Justiça.

No momento, o escritório espera o aval do Banco Central para ser corretora e atua como agente autônomo do BTG.

“Estamos entre o BTG digital, que é para o cliente com menor capital, e o BTG atacado”, diz Juliano Custódio, fundador da EQI.

A migração dos clientes de uma corretora para a outra, porém, não é automática. Se você é cliente de um agente autônomo que trabalha com a XP e tem produtos da XP, não vira automaticamente cliente indireto do BTG com produtos do BTG quando o agente troca de parceria.

Para acompanhar o escritório, o cliente tem que solicitar à corretora na qual tem produtos para levá-los a outra corretora.

“Demora, tem que preencher um formulário com a identificação de cada investimento, é uma sopa de letrinhas, e assinar, digitalizar e enviar. Se tem alguma vírgula errado, o contrato volta. Não é muito simples”, diz Ana Alice Lima de Queiroz, 65. A advogada é cliente da EWZ, escritório que foi desligado da XP em dezembro de 2020.

“Ficamos surpresos. Foi apenas um email e não deram nenhuma justificativa para gente e nem para o mercado. Não sabemos até hoje o porquê do desligamento”, diz Henrique Castiglione, sócio e diretor comercial da EWZ Capital.

Segundo ele, não houve aviso prévio da XP de que eles perderiam o acesso aos produtos e às plataformas da corretora.

O escritório, hoje agente autônomo do BTG, perdeu todos os clientes para a XP, incluindo Ana Alice. Aos poucos, eles contatam os clientes antigos e os convidam para migrar para o BTG.

Em três meses de operação com o BTG, o EWZ conquistou 2.200 contas, mais da metade do que tinha quando saiu da XP Investimentos.

"Nossa intenção é chegar a um bilhão de reais em patrimônio investido neste ano, além de estar presente em 10 cidades do Brasil, como foco no Sudeste e Sul do Brasil, afirma Castiglione.

A advogada diz que optou por migrar para o BTG por confiar no trabalho de gestão da EWZ, de quem é cliente desde 2017.

“Em um dia, recebi um email da XP dizendo que não trabalhavam mais com a EWZ e que minha corretora seria outra. Perguntei o que aconteceu e eles não responderam. A XP disse que não podia falar e isso me incomodou mais ainda”, conta ela.

Segundo a XP, os desligamentos seguem a estratégia de negócio da corretora e acontecem sempre dentro do que está previsto nos contratos. A possibilidade de desligamento antecipado, sem aviso prévio, também estaria no acordo e, quando ele acontece, uma rescisão é paga.

A corretora diz ainda que os casos em questão são pontuais e que os escritórios tiveram todos os acordos contratuais respeitados pela XP, bem como seus direitos garantidos.

“Depois do IPO, tiveram a necessidade de mostrar resultados e muitas pessoas super estratégicas para o negócio saíram. A XP agora está focada no lucro e no desempenho das ações, com um discurso de banco, sendo que a desbancarização que trouxe eles até aqui”, diz Castiglione.

Segundo agentes autônomos, a regra de exclusividade com determinada corretora os torna reféns de situações como esta.

A exclusividade foi uma ferramenta encontrada pela CVM para regular o mercado de agentes autônomos. Hoje, grande parte da responsabilidade pelas operações é da corretora parceira.

“A exclusividade faz com que um agente autônomo se torne funcionário da corretora e quando elas ficam muito grandes, como a XP, elas dizem ‘se você não fizer o que eu quiser, eu rescindo seu contrato’”, afirma Custódio, da EQI.

Segundo ele, a corretora usa do poder sobre os agentes para piorar negociações que não estão em contrato, diminuindo remuneração. “Não é nada ilegal, eles podem fazer, mas estão amassando o cara que trabalha para você.”

Para mudar a regra da exclusividade, surgiu a AIs Livres (Associação dos Assessores de Investimentos) em 2019.

Eles também pedem a permissão para que agentes autônomos tenham sócios que não agentes autônomos, como bancos ou outras empresas, e a redução da taxa trimestral de fiscalização da CVM, cobrada de todos os participantes do mercado de capitais. No caso de agentes autônomos, ela totaliza R$ 2.538,52 ao ano na pessoa física.

“O fim da exclusividade, por si só, poderia ser benéfico para a concorrência. Seria uma estratégia para diminuir a barreira para que concorrentes de XP e BTG acessem o mercado”, afirma Luiz Felipe Drumommnd, advogado da área societária do escritório TPC Advogados.

Procurado, o BTG diz apoiar o fim da obrigação de exclusividade dos agentes autônomos.

“Os escritórios de agentes autônomos têm um papel fundamental para o mercado e são parte importante de nosso negócio. Seguiremos buscando crescer nessa área de maneira sustentável, sempre valorizando o desenvolvimento de nossos parceiros e colocando à disposição nossa robustez, infraestrutura tecnológica, portfólio completo de produtos e uma série de programas de capacitação”, diz o BTG em nota. Após audiência pública em 2019, a mudança na regra está em análise na CVM.

Procurada, a XP disse que continuará apoiando os agentes autônomos, bem como qualquer decisão dos reguladores em prol do desenvolvimento da categoria, ”para que continuem levando conhecimento, produtos e serviços de qualidade para os milhões de investidores e investidoras do país”.

“A XP Investimentos foi a primeira – e por muito tempo a única – instituição financeira a acreditar na capacidade e no papel fundamental dos agentes autônomos de investimento para a transformação do mercado financeiro brasileiro.

A empresa nasceu em 2001 como um escritório de agentes autônomos e desde então é entusiasta e parceira da categoria. Por ser considerada a melhor e mais completa plataforma de investimentos do país, e ainda uma das 10 marcas mais valiosas, a XP atrai em média mais de 310 agentes autônomos por mês, sendo que em 2020, 3.700 novos agentes autônomos se conectaram à rede da empresa, número maior do que a base total do segundo competidor em toda a sua história.

A remuneração que esses profissionais recebem da XP é bastante competitiva, o que beneficia o cliente, que tem a assessoria de um profissional mais qualificado.

O Brasil tem um cenário propício para o desenvolvimento e crescimento exponencial da profissão, assim como das plataformas de investimento. Mais de 80% das economias das famílias estão em apenas cinco bancos, num dos mercados mais concentrados do mundo, e com a maioria desses clientes sem a opção de acessarem produtos adequados e uma assessoria de qualidade”, diz a XP em nota.


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