Governo propõe usar recursos de precatórios e Fundeb para bancar novo programa social
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Após negociação com líderes partidários, o governo anunciou uma proposta para o novo programa social que substituirá o Bolsa Família, batizado de Renda Cidadã. Para bancar a assistência ampliada, o projeto prevê que serão usados recursos de precatórios e do Fundeb (fundo para a educação). Precatórios são dívidas do governo cobradas após decisão judicial. Grande parte delas são de beneficiários do INSS que conseguiram por via judicial a concessão ou revisão de benefícios como aposentadoria e pensões. A solução para bancar o programa foi encontrada após o presidente Jair Bolsonaro vetar a extinção de outros programas existentes hoje para custear o benefício. A proposta anunciada nesta segunda-feira (28), no entanto, é alvo de críticas de especialistas, parlamentares e do TCU (Tribunal de Contas da União). A informação foi apresentada após reunião no Palácio da Alvorada com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ministros, deputados e senadores. De acordo com o relator do Orçamento de 2021, senador Márcio Bittar (MDB-AC), além do atual orçamento do Bolsa Família, o governo prevê duas outras fontes de recursos para o programa. A primeira é a limitação dos gastos com precatórios a 2% da receita corrente líquida --o que em 2021 equivalerá a aproximadamente R$ 16 bilhões, segundo técnicos do Congresso. No ano que vem, o Orçamento prevê cerca de R$ 55 bilhões de precatórios. Essa diferença, de R$ 39 bilhões, que sobraria com a nova regra, seria destinada ao novo programa social. O orçamento do novo programa não foi anunciado. Em 2020, o Bolsa Família vai custar R$ 32,5 bilhões e, para 2021, foi estimado um orçamento de R$ 34,8 bilhões. A ideia é juntar os recursos. FUNDEB Em outra frente, o plano propõe que parte da ampliação de verba do Fundeb seja deslocada para que beneficiários do programa mantenham seus filhos na escola. Esse ponto não foi detalhado, mas a equipe econômica já havia defendido o uso de verba do Fundeb para bancar vouchers de educação no programa. Especialistas em contas públicas questionam a legalidade dessas fontes. "O uso de precatórios para financiar o Renda Brasil, na minha opinião, se trata de contabilidade criativa. Despesa com sentenças judiciais e precatórios é despesa obrigatória. A União já foi condenada a fazer o pagamento. Postergar esse pagamento para usar o dinheiro para pagar outra despesa é como tomar emprestado dos credores do Erário para aumentar gasto", diz Marcos Mendes, especialistas em contas públicas e colunista da Folha de S.Paulo, que participou da elaboração da regra do teto. O diretor-executivo da IFI (Instituição Fiscal Independente) do Senado, Felipe Salto, criticou as duas ideias apresentadas. "Limitar pagamento de precatórios é eufemismo para dizer que se empurrará com a barriga um pedaço relevante dessas despesas [obrigatórias]. Não se cancelou um centavo de gasto. Quanto a usar 5% do Fundeb, é preocupante, pois pode representar bypass no teto de gastos", disse. CONGRESSO Menos de uma hora depois de anunciada, a proposta também já era alvo de críticas até na cúpula do Congresso. Auxiliares do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), consideram que financiar o Renda Cidadã com recursos destinados ao pagamento de precatórios é inadmissível e classificaram a medida como calote. Além disso, disseram considerar que o uso de recursos do Fundeb para abastecer o programa desrespeita o teto de gastos. Após a reunião desta segunda, Bolsonaro disse que o governo trabalha com zelo fiscal e tem compromisso com o teto de gastos. "O Brasil, segundo a orientação do Paulo Guedes, tem que voltar à normalidade o mais rapidamente possível. Estamos buscando recursos com responsabilidade fiscal e respeitando a lei do teto. Queremos demonstrar à sociedade e ao investidor que o Brasil é um país confiável", disse o presidente, rodeado por líderes de partidos do centrão, grupo que passou a integrar a base de sustentação do governo desde que cargos de segundo e terceiro escalão começaram a ser liberados. O senador Márcio Bittar disse que o novo programa será incorporado à PEC (Proposta de Emenda à Constituição) Emergencial, que traz medidas do pacto federativo e de ajuste fiscal. Ele também é o relator desse texto. A decisão de anunciar o Renda Cidadã vem pouco tempo após o presidente ter afirmado que vetou qualquer discussão sobre o novo programa social e que o governo seguiria com o Bolsa Família até 2022. Primeiro, em agosto, ele barrou que o benefício fosse custeado pela extinção de outros programas sociais, como o abono salarial. Segundo ele, o governo não pode "tirar de pobres para dar a paupérrimos". Depois, há duas semanas, Bolsonaro se irritou com uma proposta da equipe econômica que previa o congelamento de aposentadorias para bancar o novo programa social, que seria batizado de Renda Brasil. Ele chegou a proibir a continuidade dos debates sobre o programa. Até 2022, no meu governo, está proibido falar a palavra Renda Brasil. Vamos continuar com o Bolsa Família. E ponto final, afirmou na ocasião. No dia seguinte, porém, o relator do Orçamento de 2021, senador Márcio Bittar, disse que foi autorizado pelo presidente a criar um novo programa em substituição ao Renda Brasil. REFORMA TRIBUTÁRIA Também esperado para esta segunda-feira (28), o anúncio da proposta de reforma tributária, com novo tributo sobre transações financeiras e corte de encargos trabalhistas, acabou não sendo feito. Não houve acordo entre o governo e parlamentares em diversos pontos, principalmente em relação à nova CPMF. A proposta de Guedes de criar um imposto sobre transações financeiras também já foi alvo de crítica de Bolsonaro. Em setembro do ano passado, o então secretário da Receita Marcos Cintra acabou demitido após defender o imposto. Depois, o presidente chegou a dizer que a discussão sobre o tributo poderia ser retomada, mas ponderou que a CPMF está demonizada. Defensor da proposta, Guedes insistiu na criação do novo tributo e convenceu Bolsonaro de testar a receptividade da medida entre parlamentares. Participantes da reunião desta segunda-feira afirmaram que ainda há divergências em relação à proposta. Segundo relatos, Guedes não insistiu na defesa do tributo aos moldes da extinta CPMF. No encontro, ficou definido que o Congresso seguirá com a tramitação da reforma tributária enquanto o governo discute internamente possíveis soluções para essa fatia da proposta. O Brasil precisa criar empregos em massa, porque tem um problema de desemprego em massa. Do ponto de vista político, continuamos estudando esse capítulo, particularmente, na reforma tributária, afirmou Guedes. O governo quer tentar chegar a uma nova proposta internamente para apresentá-la a Bolsonaro o quanto antes. Com o aval do presidente, o texto será apresentado aos líderes, que dirão se é viável ou não. O presidente afirmou que sua intenção é ter as medidas aprovadas ainda antes das disputas municipais de novembro. Concluímos aqui o que devemos fazer nos próximos dias aproveitando, obviamente, este período antes das eleições que se aproximam para buscar alternativas, de modo que possamos, o mais rápido possível, colocar o Brasil na normalidade". FONTES DE RECURSO PARA O RENDA CIDADÃ Governo quer usar Orçamento do Bolsa Família, verbas de precatórios (dívidas do governo cobradas após decisão judicial) e parte do Fundeb (fundo para a educação) Bolsa Família O Orçamento do governo para 2021 já reservou R$ 34,8 bilhões para o programa. O valor é maior do que o deste ano, de R$ 32,5 bilhões Precatórios O pagamento de precatórios pelo governo seria de, no máximo, 2% da receita corrente líquida --o que em 2021 deve ficar perto de R$ 16 bilhões. Como a previsão atual do Orçamento para essa conta está em R$ 55 bilhões, haveria uma sobra de até R$ 39 bilhões a ser direcionada ao programa social Fundeb Recursos provenientes da ampliação de verbas do fundo poderiam ser deslocados para o Renda Cidadã. Neste ano, a equipe econômica já defendeu que parte da verba do Fundeb, que não contabiliza no teto de gastos, seja usada para o pagamento de vouchers de educação.
O Portal do Holanda foi fundado em 14 de novembro de 2005. Primeiramente com uma coluna, que levou o
nome de seu fundador, o jornalista Raimundo de Holanda. Depois passou para Blog do Holanda e por
último Portal do Holanda. Foi um dos primeiros sítios de internet no Estado do Amazonas. É auditado
pelo IVC e ComScore.
ASSUNTOS: Economia