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Com Lula no páreo, mercado teme que Bolsonaro radicalize populismo

Por Folha de São Paulo

08/03/2021 20h05 — em
Economia



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Mais polarização política. Campanha eleitoral para presidente da República sendo antecipada para 2021. Populismo na economia elevando gastos públicos e a dívida do governo. O temor de que haverá a mistura desses riscos no curto prazo repercutiu com força no mercado financeiro nesta segunda-feira (8).

O estopim foi o ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal), determinar a anulação de todas as condenações proferidas contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela 13ª Vara Federal da Justiça Federal de Curitiba, responsável pela Lava Jato. Assim, Lula retoma o direito de se candidatar nas próximas eleições.

Com a volta do petista à disputa pela presidência em 2022, o mercado teme uma guinada ainda maior do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ao populismo e consequente abandono da agenda liberal e do compromisso com a saúde fiscal do país para angariar votos.

Caso Lula dispute a eleição, analistas veem grandes chances de um segundo turno entre o petista e Bolsonaro. Pesquisa do Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria) divulgada nesta segunda pelo jornal O Estado de S. Paulo mostra que apenas Lula supera Bolsonaro na intenção de voto em 2022.

“Isso acaba com a possibilidade de uma terceira via, que era o que o mercado esperava, alguém mais alinhado com as reformas. Como a esquerda não estava organizada, o mercado via espaço para isso", diz Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos.

Com a pandemia, a saúde fiscal do Brasil se deteriorou pelo aumento de gastos e queda na arrecadação. Dado o cenário, participantes do mercado financeiro defendem a aprovação de reformas, como a administrativa e a fiscal, de modo a conter as despesas públicas.

“A polarização é ruim, leva Bolsonaro a abandonar o compromisso com a contas públicas para uma agenda mais populista, que dê mais retorno político”, afirma Cruz.

Com o auxílio emergencial em 2020, Bolsonaro viu sua popularidade crescer. Com a piora no número nos casos de coronavírus e medidas mais restritivas de isolamento, o governo irá promover uma nova rodada de auxílio emergencial neste ano.

O Senado aprovou na semana passada a PEC Emergencial, que estabelece um teto de R$ 44 bilhões para pagamento do benefício. Uma contrapartida para o novo gasto, porém, não foi definida.

Daniel Miraglia, economista-chefe do Grupo Integral, cita o temor do mercado que a agenda de privatizações e de ajuste fiscal se dissipe.

“Dada a situação fiscal do Brasil, o mercado não vê mais espaço para isso”, afirma Miraglia.

A decisão de Fachin pegou o mercado, em um pregão negativo, de surpresa. O Ibovespa chegou a cair 4,28%, mas fechou em queda de 3,98%, a 110.611,58 pontos, menor valor desde 1º de março.

As ações preferenciais (mais negociadas) da Petrobras recuaram 5,76%, a R$ 21,10 cada uma. As ordinárias cederam 4,80%, a R$ 21,00.

O dólar ficou R$ 0,10 mais caro. A moeda fechou em alta de 1,67%, a R$ 5,7770. O dólar turismo está a R$ 5,933.

“O receio do mercado é que o período eleitoral seja mais conturbado com uma possível candidatura de Lula, cuja visão pode ser contrária àquela da agenda de reformas atual, o que pode dificultar a trajetória fiscal, reduzir a confiança para investimentos a longo prazo e, por consequência, comprometer o crescimento econômico do país”, afirma Paloma Brum, economista da Toro Investimentos.

Alguns participantes do mercado também veem que, com a candidatura de Lula, Bolsonaro tem mais chances de se eleger, dada a aversão ao PT que o impulsionou em 2018.

“Estamos entre o fogo e o caldeirão. Dois populistas que prometem um monte de coisa para o povo. Ficamos com pouca ou nenhuma alternativa para o ano que vem. Para o mercado, é o pior cenário possível”, diz André Machado, sócio-fundador da escola de traders Projeto Os 10%.

O risco-país medido pelo CDS de cinco anos operava em alta de 9,55% nesta segunda, próximo ao fechamento do mercado, indo a 215,25 pontos, maior nível desde novembro de 2020.

O CDS funciona como um termômetro informal da confiança dos investidores em relação às economias dos países, especialmente emergentes. Se o indicador sobe, é um sinal de que os investidores temem o futuro financeiro do país; se ele cai, o recado é o inverso.

“Está bastante cedo [para falarmos de eleição], mas o mercado sempre se antecipa. Hoje também houve um certo efeito manada", afirma Murilo Breder, especialista em renda variável da Easynvest.

Segundo ele, não é uma questão de qual candidato é melhor ou pior e sim de perspectiva de mudança no cenário econômico. "O mercado financeiro sempre vai tentar ganhar dinheiro se ajustando ao cenário", diz Breder.

Além da incerteza quanto à agenda liberal do atual governo, o mercado se preocupa com a piora da pandemia no Brasil e a alta nos juros dos títulos do Tesouro americano, o que leva investimentos aos Estados Unidos, em detrimento de países emergentes.

"A queda de hoje é a antecipação da discussão de 2022 em um momento que o mercado está focado na pandemia. São duas discussões complexas juntas, por isso essa realização muito grande", diz Cruz, da RB Investimentos.

Os juros futuros também subiram na sessão, em reflexo de um aumento no risco fiscal e consequente elevação na Selic.

O juro para janeiro de 2025 foi de 6,95% para 7,27%.

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