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Análise: O confronto como estratégia, por Paulo Celso Pereira

Por Agência O Globo

27/10/2016 2h54 — em
Brasil



BRASÍLIA — O presidente do Senado, Renan Calheiros, acabou ficando afamado em Brasília como um sujeito frio. A partir do agravamento da crise política, ano passado, uma tirada tornou-se frequente e deu lastro a essa impressão. Segundo ela, a diferença entre Eduardo Cunha e Renan era que, enquanto o primeiro só agia “com o fígado”, o segundo não o tinha. Embora a boutade retratasse bem aquele momento, é pouco precisa em relação ao temperamento do senador.

Apesar de Renan frequentemente tentar figurar como fiador da estabilidade republicana, os que entraram em conflito aberto com ele, como o presidente Michel Temer e os senadores que apoiaram sua cassação, anos atrás, bem sabem de sua disposição de atacar — por vezes publicamente e abaixo da linha de cintura — os adversários. A novidade, agora, é o presidente do Senado atuar contra o sistema judicial.

Há quatro meses, quando o MPF pediu sua prisão — que foi negada pelo Supremo — a partir da delação do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, o presidente do Senado fez um duro discurso contra o procurador Rodrigo Janot, acusando-o de ter “perdido os limites constitucionais” e “o limite do ridículo”. Agora, os ataques são contra o Judiciário propriamente dito. É bom lembrar que Cunha percorreu caminho semelhante, e hoje está dormindo em Curitiba.

Embora o temperamento dos dois peemedebistas seja distinto, o motivo que os levou a radicalizar parece ter sido o mesmo: o temor do avanço das investigações contra si. Além de ter sido selada a delação da Odebrecht, que promete atingir mais de cem parlamentares, na próxima semana o STF decidirá se um réu em ação penal pode figurar na linha sucessória da Presidência da República.

A tese foi levada em maio ao STF pela Rede Sustentabilidade, com o objetivo de tirar do cargo o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e já pedia que a corte transformasse a proibição de réus no comando do Legislativo em regra geral — e é isso que será julgado. Como Renan responde a 11 inquéritos, e pelo menos um deles está pronto para ser analisado pelos ministros, isso pode significar o fim de sua era quase absolutista no comando do Senado. Renan venceu quatro das últimas seis disputas bienais para a presidência do Senado. Mas, se virar réu, será relegado ao posto de figurante na disputa.

A briga de Renan com o Judiciário, no entanto, pode levar a um aprimoramento institucional. Ontem, ele prometeu colocar em votação a proposta que acaba com um dos mais vergonhosos benefícios do Poder Judiciário: a “punição” máxima de juízes e membros do Ministério Público que cometem irregularidades com aposentadoria compulsória — em vez do afastamento definitivo sem vencimentos, como ocorre em outros Poderes. Seria um avanço. E o STF pode contribuir com outro no julgamento da próxima semana.


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