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MPF pede anulação de contrato que permite exploração da Terra Indígena Vale do Javari

Por Portal Do Holanda

29/09/2025 22h37 — em
Amazonas


Foto: Adam Mol/ Funai

Manaus/AM - O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma Ação Civil Pública buscando a anulação de um contrato de comercialização de Soluções baseadas na Natureza (SbN) firmado em 2022 para a Terra Indígena (TI) Vale do Javari, no Amazonas. O contrato foi assinado pela União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) com as empresas Comtxae (brasileira), Biotapass (espanhola) e Biota (argentina). 

Nele, a Univaja se autodenomina proprietária do território e concede às empresas o direito exclusivo de registrar, certificar e comercializar as SbNs na área. A TI Vale do Javari é a segunda maior do país e abriga o maior número de povos indígenas em isolamento voluntário no Brasil.

As investigações do MPF tiveram início após denúncias de lideranças do povo Mayuruna em dezembro de 2022, que relataram a presença de empresários estrangeiros no local sem o consentimento das lideranças e sem as devidas autorizações da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). A Funai, por sua vez, confirmou ao MPF que as empresas não tinham permissão para ingressar na terra indígena. Após análise técnica do acordo, a fundação identificou fortes indícios de violações aos direitos indígenas e diversas irregularidades e ilegalidades no documento.

Entre as ilegalidades apontadas pela Funai e reiteradas na ação do MPF, destaca-se a violação ao regime jurídico das terras indígenas, uma vez que o contrato trata a Univaja como "proprietária" do Vale do Javari, quando, legalmente, as terras indígenas são bens da União de usufruto exclusivo dos povos. Outras questões incluem a ausência de autorização da Funai para a entrada e negociação das empresas, e a provável violação à Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI), levantando dúvidas se as comunidades foram plenamente esclarecidas sobre os termos técnicos e as implicações do acordo.

O contrato também é questionado por impor limitações indevidas aos usos tradicionais de subsistência, como caça e pesca, enquanto confere às empresas o direito de fazer um levantamento detalhado de toda a área. De particular gravidade é o risco a povos indígenas isolados: a abrangência do contrato sobre a totalidade da TI, que tem a maior concentração de isolados no Brasil, levanta sérias preocupações sobre o risco de contato forçado. O prazo de dez anos de vigência do acordo também contraria as diretrizes e recomendações legais.

O MPF argumenta que o contrato possui cláusulas amplas que concedem poderes irrestritos às empresas para formular e comercializar projetos sem a participação das comunidades. O acordo chega a conferir às empresas a prerrogativa de "acompanhar e supervisionar" a floresta, o que, para o MPF, viola a soberania nacional, usurpa função pública indelegável (competência da União através de órgãos como Funai e Ibama) e restringe o usufruto indígena. O procurador da República Guilherme Diego Rodrigues Leal alerta que a continuidade do contrato pode levar à "exploração predatória dos recursos" e "danos culturais, sociais e ambientais irreversíveis".

Na ação, o MPF requer que a Justiça Federal determine a suspensão imediata de todos os efeitos do contrato e a paralisação de todas as atividades de SbN na TI Vale do Javari. Além disso, a ação pleiteia a declaração de nulidade do contrato e a condenação da Univaja e das empresas ao pagamento de R$ 10 milhões por danos morais coletivos. As Soluções baseadas na Natureza são definidas internacionalmente como ações para proteger e restaurar ecossistemas, abordando desafios sociais (como mudanças climáticas) e proporcionando benefícios para o bem-estar humano e a biodiversidade.


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O Portal do Holanda foi fundado em 14 de novembro de 2005. Primeiramente com uma coluna, que levou o nome de seu fundador, o jornalista Raimundo de Holanda. Depois passou para Blog do Holanda e por último Portal do Holanda. Foi um dos primeiros sítios de internet no Estado do Amazonas. É auditado pelo IVC e ComScore.

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