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Após receber alta, adolescente baleado não quer voltar à escola onde houve tiroteio

Por Portal Do Holanda

23/10/2017 6h22 — em
Brasil


Foto: Reprodução /Agência O Globo

GOIÂNIA — A carne na brasa, a cervejinha de domingo e o clima de tranquilidade e alívio entregam: Hyago Marques Barbosa está de volta a sua casa. O adolescente de 13 anos foi um dos seis jovens baleados dentro da sala de aula, no Colégio Goyases, em Goiânia. Levou um tiro nas costas, foi internado no Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo) e, no começo da manhã deste domingo, teve alta médica. Quando a reportagem do GLOBO esteve na casa dele, o garoto estava na cama, ainda se recuperando do ferimento à bala. Os familiares faziam um pequeno churrasco na cozinha, sem muito barulho e sem um clima necessariamente festivo. Era mais alívio. A bala ficou alojada na vértebra T8 e não será retirada, por não oferecer riscos. O projétil, segundo o pai, Thiago Barbosa Gomes, 33, ficou a meio milímetro do canal da medula espinhal. A radiografia mostra, na verdade, uma distância de meio centímetro. Ainda assim, um renascimento.

Os familiares permitiram que a reportagem falasse rapidamente com Hyago, com o compromisso de conversar apenas sobre o futuro. O jovem quer terminar o oitavo ano do ensino fundamental na mesma escola. Depois, não quer permanecer no colégio onde viu amigos serem baleados por um colega de sala, um adolescente de 14 anos. João Pedro Calembo e João Vitor Gomes, os dois de 13 anos, morreram dentro da sala. Os dois eram amigos de Hyago.

— Eu não quero não (voltar para a escola). Acabando o ano eu vou sair de lá. O cara entrando na sala, depois de ver meus amigos morrendo, todo mundo correndo, eu sangrando... — disse o jovem.

Hyago afirmou sentir um misto de felicidade e tristeza:

— Estou feliz por mim e triste por minhas amigas que continuam lá (no hospital), não têm nem previsão de alta. Mas elas estão evoluindo. Fiquei sabendo notícia da Isadora, que ela está bem, perguntou de mim. Fico muito feliz por mim e por saber que elas estão melhorando.

As duas adolescentes baleadas seguem internadas numa unidade de terapia intensiva (UTI) do Hugo, uma delas em estado grave de saúde. Elas tiveram órgãos perfurados pelos projéteis. Hyago, não. O jovem ficou internado por menos de 48 horas e já está em casa. Nas imagens gravadas pelas câmeras de segurança da loja ao lado da escola, a Doces e Festas, Hyago aparece sem camisa buscando refúgio, com um sangramento nas costas provocado pela perfuração da bala.

— Penso em dar mais valor na vida, nos meus pais, não ficar com aquelas briguinhas bestas. Conversar mais, se abrir mais com eles -- afirmou o adolescente.

O pai do jovem tem o nome do filho tatuado nas costas, em letras garrafais. No fim da manhã de sexta-feira, recebeu uma ligação em que a mulher do outro lado da linha dizia que Hyago tinha sofrido um "acidente gravíssimo".

— Pensei que tinha sido um acidente de trânsito, que meu filho tinha sido atropelado — conta Thiago.

O pai chegou minutos depois do tiroteio. Colocou o filho dentro do carro, uma adolescente ferida, o pai dela e rumaram todos ao Hugo. Policiais militares em motocicletas escoltaram o carro, abrindo caminho, até o hospital. Só quando partiam foi avisado por um policial que os meninos tinham sido baleados. Thiago foi tranquilizado por Hyago, que dizia estar bem.

— Pai, foi o (...). Ele matou o João Pedro — disse Hyago ao pai, dentro do carro, antes de chegarem ao Hugo.

Projétil ficou alojado a meio centímetro da medula do adolescente - Reprodução

A colega, por sua vez, gritava de dor. Ele teve o pulmão esquerdo perfurado e temia morrer. Era abraçada e tranquilizada pelo pai.

O que se passou na sala de aula do Colégio Goyases, minutos antes, foi um tiroteio que acabou atingindo parte das vítimas pelas costas, como foi o caso de Hyago. Depois de ser baleado, ele caiu, perdeu força nas pernas e saiu engatinhando até a sala ao lado, do nono ano, no segundo andar da escola. O jovem permaneceu escondido na sala até acabarem os disparos. Depois, conseguiu se levantar, desceu as escadas, saiu do colégio e se refugiou na Festas e Doces.

—A bala ficou alojada na vértebra T8, a meio milímetro da medula. Está no meio do osso e os médicos disseram que não será retirada, será 'encapsulada', sem risco algum para ele. Foi um milagre de Deus — diz Thiago.

Hyago precisará usar apenas um colete, por 60 dias. No primeiro dia em casa depois da tragédia que vivenciou dentro da sala de aula, foi cercado de atenção de amigos, pai, mãe e familiares.

A direção do Colégio Goyases publicou uma mensagem no site da escola em que diz que ainda vai se reunir para definir uma proposta de calendário para continuidade do ano letivo. "Essa lacuna deixada pelos ausentes será irrecuperável", diz o texto. "O luto das famílias de João Pedro e João Vitor é nosso, assim como de toda a sociedade e de todo o país", afirma. "Deixemos de lado os julgamentos e vamos promover uma profunda reflexão na sociedade, nas escolas e nos lares e sobretudo uma reflexão individual perguntando o que podemos fazer para amenizar a dor desse momento e como deveremos agir para evitar futuros atos assim tristes."

O colégio diz estar dando "total respaldo" às famílias das vítimas e fala em "momento nebuloso" para definir os últimos dias vividos pela escola.


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O Portal do Holanda foi fundado em 14 de novembro de 2005. Primeiramente com uma coluna, que levou o nome de seu fundador, o jornalista Raimundo de Holanda. Depois passou para Blog do Holanda e por último Portal do Holanda. Foi um dos primeiros sítios de internet no Estado do Amazonas. É auditado pelo IVC e ComScore.

ASSUNTOS: adolescente baleado, escola, Goânia, Brasil

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