Racha com Bannon desestabiliza direita alternativa de Trump
WASHINGTON - As revelações de “Fire and Fury — Inside the Trump White House” (“Fogo e fúria — por dentro da Casa Branca de Trump”, em tradução livre), livro do jornalista Michael Wolff que teve seu lançamento antecipado para sexta-feira após trechos serem divulgados na quarta-feira, certamente não ajudaram Donald Trump a recuperar a popularidade que vem perdendo desde que assumiu a Presidência americana há cerca de um ano. No entanto, a principal vítima dos relatos de Wolff parece ser o ex-estrategista-chefe da Casa Branca Steve Bannon. Mesmo distante do Gabinete presidencial desde agosto passado, ele se viu na mira não apenas do presidente, mas de diversos apoiadores do Partido Republicano, entre eles a principal doadora e coproprietária do “Breitbart News”, site jornalístico comandado por Bannon, Rebekah Mercer. O rechaço da bilionária não afeta apenas o site — descrito por ele como “a plataforma da direita alternativa” — mas também os planos do ex-estrategista de financiar campanhas de candidatos ultraconservadores nas eleições para o Congresso em novembro, e consequentemente, levar o Partido Republicano cada vez mais para a direita.
“Apoio o presidente Trump e a plataforma sob a qual ele se elegeu”, afirmou Mercer num comunicado na noite de quinta-feira. “Eu e minha família não mantemos qualquer comunicação com Steve Bannon há muitos meses e não oferecemos qualquer apoio financeiro à sua agenda política ou apoiamos suas recentes ações e declarações.”
Mercer e sua família — indicados por Bannon no livro como os doadores mais influentes do Partido Republicano — são sócios minoritários do “Breitbart News”. Sem os milhões doados pela família, cujo afastamento de Bannon pode abrir caminho para que outros façam o mesmo, ele poderá ter dificuldades para levantar fundos e ajudar no financiamento de candidaturas ao Congresso. Após a polêmica que antecipou o lançamento do livro, a Casa Branca sugeriu que o site deveria reconsiderar a manutenção de Bannon como diretor-executivo.
Na sexta-feira, Trump apoiou o comunicado:
“A família Mercer recentemente se livrou do vazador de informações conhecido como Steve ‘Desleixado’ Bannon. Decisão inteligente!”, afirmou o presidente.
De acordo com o relato de Wolff, Bannon comentou que o encontro de nomes do alto escalão da campanha em junho de 2016 com a advogada russa Natalia Veselnitskaya — que supostamente teria informações comprometedoras contra a rival de Trump na disputa presidencial, a democrata Hillary Clinton — fora “ato de traição e antipatriótico”. No encontro estariam, entre outros, Donald Trump Jr. e o genro do presidente, Jared Kushner. Além disso, Bannon teria afirmado que a filha mais velha e principal assessora de Trump, Ivanka, era “burra como uma porta”. Em outra passagem, ele alerta que familiares do presidente, em especial Kushner, poderiam ser alvos de investigações do promotor especial Robert Mueller — que comanda o inquérito sobre o possível conluio entre a campanha de Trump e autoridades russas — por lavagem de dinheiro por negociações suspeitas com o Deutsche Bank.
— Bannon era um intermediário que não tinha tanto controle quanto as pessoas diziam que ele tinha, e cuja imagem foi superdimensionada pela mídia — afirmou Christopher Ruddy, amigo e apoiador de longa data do presidente e executivo-chefe da Newsmax Media. — Seu poder vinha do fato de surfar na onda de Trump.
Em entrevista ao “Today Show” da rede da NBC, Wolff se pronunciou publicamente pela primeira vez desde a revelação de trechos do livro, e rebateu as críticas da Casa Branca e de Trump.
— Minha credibilidade está sendo questionada por um homem que, no momento, tem menos credibilidade que provavelmente qualquer outro que já tenha andado por esse planeta — afirmou Wolff. — É extraordinário que um presidente dos EUA tente impedir a publicação de um livro. Ele não apenas está me ajudando a vender livros, mas também está ajudando a confirmar as teorias do livros. Para onde mando a caixa de chocolates?
De acordo com Wolff, Ivanka e Kushner perderam a fé no presidente, e a sensação de que Trump é mentalmente incapaz de comandar a Presidência é bastante comum dentro da Casa Branca.
— Todos dizem que ele é como uma criança — afirmou Wolff. — Eles dizem que ele é um idiota. Lembrem-se, esse homem não lê e não escuta, ele é como uma máquina de pinball rebatendo tudo para os lados.
Wolff também aproveitou a ocasião para rebater acusações de que nunca teria recebido o sinal verde de Trump para escrever o livro. Na quinta-feira, o presidente publicou uma mensagem no Twitter afirmando que nunca deu acesso à Casa Branca ou conversou com Wolff sobre o livro, que chamou de “repleto de mentiras, distorções e fontes inexistentes”.
— O que estava fazendo lá se ele não me queria ali? Eu certamente falei com o presidente. Não sei se ele percebeu ou não que se tratava de uma entrevista, mas ele certamente não me revelou nada em off.
A reação da Casa Branca fez com que as vendas do livro disparassem. Na quinta-feira, um dia após as revelações das declarações de Bannon, “Fire and Fury” chegou ao primeiro lugar da lista de mais vendidos da livraria virtual Amazon — 250 mil exemplares já foram enviados aos pontos de venda. Na quinta-feira, advogados de Trump ameaçaram medidas legais se a editora não suspendesse a publicação, mas não obtiveram sucesso.
Se por um lado, as revelações do livro podem complicar a relação de Trump com a Justiça, por outro, seu distanciamento de Bannon fortaleceu seus laços com o establishment republicano.
— Bannon se marginalizou com muita eficiência, com inexplicável velocidade — disse um veterano estrategista republicano ao site “The Hill”, acrescentando que o ex-guru de Trump “perdeu a guerra de palavras com o presidente”.
Ainda na sexta-feira, líderes republicanos no Senado pediram ao Departamento de Justiça que investigue possíveis ações criminosas por parte do ex-espião britânico Christopher Steele, autor do dossiê que alega conluio da campanha com a Rússia.
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