Compartilhe este texto

Disputa familiar põe fujimorismo em risco no Peru

Por Agência O Globo

07/01/2018 21h01 — em
Mundo



BUENOS AIRES — Depois de ter sido beneficiado por um indulto humanitário concedido pelo presidente Pedro Pablo Kuczynski na noite de Natal e recebido alta médica semana passada, o ex-presidente do Peru, Alberto Fujimori (1990-2000) iniciou agora uma cruzada por um “Peru sem rancores”. Essas foram as palavras usadas pelo ex-chefe de Estado no último fim de semana, para expressar o que deseja para seu país a partir de agora. Fujimori havia sido condenado a 25 anos de prisão por sua responsabilidade em crimes de lesa-Humanidade e ainda tinha processos judiciais abertos por violações dos direitos humanos cometidas por seu governo. O debate sobre uma eventual reconciliação nacional está instalado, em meio à incerteza sobre o futuro do fujimorismo com o ex-presidente livre e dois de seus filhos, o congressista Kenji Fujimori e a ex-candidata presidencial Keiko Fujimori, mergulhados numa disputa interna de poder.

A saída de Fujimori da prisão levou seu movimento político a entrar num período de “turbulência e confusão”, na opinião do jornalista Gustavo Gorriti, que conhece como poucos a força política mais importante do Peru. O fujimorismo, apesar de todas as polêmicas, domina o país, com presença em todos os estados e controle do Parlamento. A única força que consegue derrotá-lo nas urnas é o antifujimorismo. No entanto, enquanto a oposição está fragmentada, o ex-presidente sempre manteve o partido sob seu controle, dando instruções políticas a seus aliados até quando estava preso.

— Hoje o fujimorismo perdeu iniciativa, porque a ala de Keiko no Congresso não conseguiu aprovar o impeachment de Kuczynski. Aceitaram o indulto a Fujimori, mas a negociação entre Kenji e o presidente gerou um racha. Não existe razão para pensar que os irmãos se aproximarão no curto prazo — analisa Gorriti.

Os peruanos acompanham diariamente a tensão no relacionamento entre os dois irmãos. Enquanto Fujimori pede perdão e fala em reconciliação, Kenji e Keiko disputam parcelas de poder dentro do partido Força Popular, que até pouco tempo atrás tinha uma bancada sólida de 71 congressistas (de um total de 130). Na decisão do impeachment, Kenji e outros nove deputados fujimoristas se abstiveram de votar e assim salvaram Kuczynski. Três dias depois, o presidente anunciou o indulto a Fujimori.

Em nota oficial, o partido, no qual Keiko ainda tem mais poder que seu irmão, expressou sua satisfação pela liberação do ex-presidente, mas deixou claro que não esteve de acordo com “a maneira utilizada para consegui-la” — leia-se, com a negociação entre Kenji e o presidente.

ESCOLHA DE CANDIDATO

Hoje o panorama é, como apontou Gorriti, muito confuso. Não se sabe se Kenji ampliará sua influência dentro do partido e, com a ajuda de seu pai, conseguirá gradualmente reduzir o poder que está nas mãos de Keiko. O fujimorismo é um movimento político muito organizado e já está pensando nas eleições presidenciais que serão realizadas daqui a três anos, explicou Adriana Urrutia, professora e pesquisadora do Instituto de Estudos Peruanos. Seu objetivo, claramente, é recuperar a Presidência. A questão é saber quem será o escolhido para iniciar, em breve, uma campanha nacional: Kenji ou Keiko. A ex-candidata já foi derrotada duas vezes e seu irmão aparece hoje como uma alternativa de renovação.

— Eles pensarão na solução mais efetiva, porque assim pensam os fujimoristas. Se acharem que Kenji tem mais chances, Keiko dançou — assegura Adriana.

O ex-presidente sabe que, com uma oposição sem lideranças novas e que entusiasmem a população, o maior inimigo de seu movimento é o sentimento antifujimorista, hoje presente em mais de 50% da população. Por isso, as declarações de Fujimori sobre reconciliação, feitas por meio de sua conta no Twitter, não são inocentes. O objetivo do ex-chefe de Estado é justamente minimizar o impacto eleitoral. Kuczynski foi eleito, basicamente, por ser o candidato antifujimorista.

“Nas primeiras horas desta nova etapa da minha vida, vários sonhos me invadem constantemente, e gostaria de dividi-los. Desejo um Peru sem rancores, com todos trabalhando por um objetivo superior”, publicou Fujimori na rede social.

A resposta do governo foi dada pela presidente do Conselho de Ministros, Mercedes Araoz:

— Buscar a reconciliação não significa esquecer os crimes cometidos pelo regime autoritário do ex-presidente Alberto Fujimori, já que nossos valores democráticos não são negociáveis.

DENÚNCIA DE CORRUPÇÃO

A novela do fujimorismo inclui, ainda, um capítulo sobre corrupção. Keiko está às voltas com denúncias de recebimento de dinheiro da Odebrecht e, se a acusação se confirmar, o caminho ficaria livre para Kenji, hoje o filho mais próximo do ex-presidente. Juntos ou separados, os Fujimori trabalham dia e noite para recuperar o poder perdido e sabem que para isso precisam ser perdoados, pelo menos por um setor do eleitorado.

Para Alberto Torres, presidente do instituto de pesquisas Ipsos, o clã Fujimori não conseguirá recuperar o controle do país se a oposição se unir.

— Hoje o fujimorismo ganha um primeiro turno presidencial, mas perde no segundo pela união do antifujimorismo — assinala. — A estratégia de Kenji e seu pai é manter uma boa relação com o governo, falar em união nacional e assim ir preparando o terreno para uma nova candidatura presidencial. O tempo dirá se isso vai dar certo.


Siga-nos no
O Portal do Holanda foi fundado em 14 de novembro de 2005. Primeiramente com uma coluna, que levou o nome de seu fundador, o jornalista Raimundo de Holanda. Depois passou para Blog do Holanda e por último Portal do Holanda. Foi um dos primeiros sítios de internet no Estado do Amazonas. É auditado pelo IVC e ComScore.

ASSUNTOS: Mundo

+ Mundo