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PT já não acredita na volta de Dilma à Presidência

Por Agência O Globo

31/07/2016 4h00 — em
Brasil



RIO — Com a proximidade da votação final do processo de impeachment, em agosto, cresce o distanciamento entre a presidente afastada, Dilma Rousseff, e o PT. Com o partido descrente, a resistência à destituição da presidente virou mais um discurso para animar a militância, e tentar conter o desgaste causado pela Operação Lava-Jato, do que uma mobilização para tentar virar votos no Senado que salvem Dilma.

A presidente afastada, por sua vez, tem se mostrado mais preocupada em preservar sua biografia do que em voltar ao poder ou trabalhar pela sobrevivência política do PT. Na última quarta-feira, em entrevista à Rádio Educadora, ela jogou para o partido a responsabilidade pelo pagamento do marqueteiro João Santana, que disse ao juiz Sérgio Moro ter recebido recursos relativos à campanha de Dilma em caixa dois, no exterior.

Lideranças do PT tentaram minimizar a declaração de Dilma, afirmando ser natural que ela procure se eximir da culpa por eventuais irregularidades às vésperas da votação do impeachment. O partido afirma que todas as operações foram feitas dentro da legalidade e que as contas da campanha de 2010, às quais o marqueteiro se referiu, foram aprovadas pela Justiça Eleitoral.

 

O ex-presidente Lula tem viajado pelo país, principalmente o Nordeste, na “Caravana Popular em Defesa da Democracia”. Petistas dizem que o principal objetivo de Lula é tentar reconstruir sua própria imagem e defender seu legado, sobretudo as conquistas sociais de seus oito anos de governo, visando às eleições de 2018, independentemente de ser ele o candidato ou outro nome escolhido pelo líder petista. O primeiro teste será este ano, nas eleições municipais. A prioridade do PT é reeleger o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad.

Apesar de dizer que não há crime de responsabilidade que justifique o impeachment, Lula apontou, em atos este mês em Recife e em Carpina, na Zona da Mata pernambucana, supostos erros cometidos por Dilma, como a insistência nas desonerações e o endurecimento de regras para benefícios trabalhistas e previdenciários. O ex-presidente também disse que ela não seguiu seus conselhos para tentar superar a crise econômica:

— A Dilma Rousseff, durante o ano de 2014, não se deu conta de que, ao abrir mão de imposto para favorecer os empresários, começou a faltar dinheiro no cofre para a gente poder fazer a economia continuar acontecendo. Depois das eleições, ela apresentou um programa de ajuste econômico que deixou muitos de nós descontentes, porque mexeu com a aposentadoria, com pescador, com mulheres que casavam com aposentados no Nordeste — disse Lula durante ato em Recife, no último dia 13.

Mesmo assim, no dia anterior, em Carpina, Lula pediu a uma plateia de agricultores que, em vez de irem para a rua gritar “Fora, Temer”, enviassem mensagens de WhatsApp pressionando senadores que votaram pelo afastamento de Dilma.

O Senado abriu o processo de impeachment com o apoio de 55 senadores. Para afastar definitivamente a presidente, são necessários 54 votos. Dilma, que teve na primeira votação, em maio, 22 votos, precisa convencer seis senadores a mudar de posição. Petistas afirmam que ainda não viraram nenhum voto e que correm o risco de perder apoios, como de Otto Alencar (PSD-BA).

— Não tem mobilização. Se ainda tivesse viabilidade, mas não tem — disse um integrante da cúpula do PT.

O partido, no entanto, continua com o discurso do “golpe” e pretende levar esse debate para as eleições municipais.

— Não jogamos a toalha, ainda acreditamos. Tem três ou quatro senadores que estão mudando de voto — disse o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), ao discursar, domingo passado, na convenção do PCdoB que oficializou a candidatura de Jandira Feghali à prefeitura do Rio, com o PT de vice na chapa.

Para um auxiliar de Dilma, a desmobilização se restringe a setores do PT, especialmente deputados interessados, segundo ele, em ter acesso ao governo interino de Michel Temer e a benesses na Câmara. Ainda segundo esse auxiliar, as articulações para tentar barrar o impeachment esfriaram semana passada devido ao recesso parlamentar.

Integrantes do PT e de movimentos sociais reclamam que Dilma se encastelou no Palácio da Alvorada e viajou pouco para defender seu mandato. Desde que foi afastada, transformou seu perfil no Facebook em seu principal canal de comunicação. Também deu entrevistas, principalmente para a imprensa internacional.

FALTA DE TRAQUEJO POLÍTICO

A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), ex-chefe da Casa Civil de Dilma, é apontada como um retrato da deterioração da relação entre a presidente afastada e o PT. Apesar de continuar na linha de frente contra o impeachment, a senadora, nos bastidores, passou a se tornar uma crítica, dizem petistas.

Gleisi ficou magoada, segundo esses petistas, com a bronca que levou de Dilma, junto com outros senadores, em 9 de maio. O grupo foi ao Palácio do Planalto comemorar a anulação, pelo então presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), da tramitação do processo de impeachment. Os senadores foram chamados de “idiotas”, segundo relatos, por acreditarem que aquela manobra se sustentaria.

— Tá certo que a Dilma não é nenhuma mola de Fusquinha, não tem o corpo assim para tratar de política. Às vezes é dura, as pessoas têm medo dela, não conversa, e vai dificultando. Mas isso não é defeito, a gente conserta — disse Lula, no último dia 12, em discurso em Carpina (PE).

A aposta na mudança de atitude de Dilma ocorre oito anos após a então ministra da Casa Civil receber um bambolê de presente do então líder do PMDB, deputado Henrique Alves (RN), para que tivesse “mais jogo de cintura”.

 

2001

Egressa do PDT, Dilma filia-se ao PT em 2001. Um ano depois, participa da equipe de transição entre os governos Fernando Henrique Cardoso e Lula, de quem se torna ministra de Minas e Energia, área em que atuava no Rio Grande do Sul.

2005

Com a queda do ministro José Dirceu (Casa Civil), em 2005, abatido pelo escândalo do mensalão, assim como as principais lideranças petistas, Dilma assume esse ministério e começa a ter pavimentada sua candidatura à Presidência da República. Em 2008, ela é apresentada por Lula, em uma inauguração no Complexo do Alemão, no Rio, como “a mãe do PAC”. O Programa de Aceleração do Crescimento era o carro-chefe do segundo mandato do então presidente Lula.

2010

Eleita em 2010, Dilma promove uma faxina ética em seu primeiro ano de mandato, afastando sete ministros sob suspeita de irregularidades, sendo cinco deles herdados do governo Lula.

Vista como uma estranha no ninho pelo PT, Dilma tem que conviver durante seu primeiro mandato com o movimento “Volta, Lula”.

Criador e criatura têm várias divergências, sendo uma das principais a condução da área econômica. No primeiro mandato de Dilma, Lula queria que ela substituísse o então ministro da Fazenda, Guido Mantega. Um de seus nomes preferidos era o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles. Dilma só substituiu Mantega no segundo mandato e nomeou para seu lugar Joaquim Levy, execrado pelo PT.

O PT e Lula consideram a articulação política e a comunicação os calcanhares de aquiles do governo Dilma. Reclamam que ela não dialoga com o Congresso, com os movimentos sociais nem com os empresários. Queixam-se de que Dilma e seus ministros viajam pouco, fazem poucos discursos e dão poucas entrevistas. A cada crise, a presidente promete ampliar o diálogo e vender melhor o governo.

2015

No início do segundo mandato, Dilma tira todos os ministros ligados a Lula do Palácio do Planalto e se cerca de petistas de sua confiança, que não eram da ala majoritária do partido.

Lula cobra do governo Dilma que condene supostos excessos da Polícia Federal e do juiz Sérgio Moro na Lava-Jato. A presidente afirma que a Polícia Federal tem autonomia para trabalhar e que os culpados seriam punidos, “doa a quem doer”.

Lula e o PT reclamam que o ajuste fiscal não pode ser um fim em si mesmo e cobra boas notícias para a população.

Lula diz a aliados que Dilma não leva em conta suas opiniões.

Em junho de 2015, em reunião fechada com religiosos em seu instituto, o ex-presidente critica duramente Dilma e atribui ao governo dela, sobretudo no segundo mandato, a crise vivida pelos petistas. Para Lula, as taxas de aprovação de Dilma e dele próprio estão no “volume morto”, e a do PT, “abaixo do volume morto”, numa referência à crise hídrica paulista.

Diante da maior crise econômica em 20 anos, Dilma e PT optam por caminhos distintos. Dilma passa a defender medidas como a reforma da Previdência e a redução da participação obrigatória da Petrobras no pré-sal, contrariando bandeiras históricas do partido.

2016

Em um dos momentos de maior tensão entre Dilma e o PT, ela estica uma visita ao Chile e não comparece, em fevereiro, na comemoração dos 36 anos do partido, no Rio.

A ameaça do impeachment de Dilma a reaproxima, num primeiro momento, do seu partido. Porém, após o Senado aprovar o afastamento da presidente, confirmando votação da Câmara dos Deputados, o PT se desmobiliza e, com o discurso do “golpe”, passa a priorizar sua sobrevivência nas eleições de 2018.


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